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Reflexão para o 32º Domingo do Tempo Comum – Evangelho segundo S. Lucas 20,27-38
NA LEITURA deste domingo, Nosso Senhor Jesus Cristo fala sobre o casamento, em seus vários sentidos. O Senhor caminha já para a consumação da sua Missão na Terra. Confronta-se então com o grupo dos saduceus. Diferentes dos fariseus, que acreditavam na ressurreição dos mortos, nos anjos e em outras realidades transcendentes, a fé dos saduceus resumia-se à Torá (os primeiros cinco livros da Bíblia), que não falam da vida eterna nem da ressurreição dos mortos.
Jesus, como excelente orador e debatedor, coloca-se na posição de debater usando somente os argumentos aceitos pelos seus adversários. Assim, para demonstrar que existe a ressurreição, mostra os próprios textos em que os saduceus criam, que falam do “Deus de Abraão, de Isaac e de Jacó”, e arremata dizendo que Deus não é deus de mortos, mas sim o Deus dos vivos. Desta maneira quebra a argumentação dos saduceus em sua própria origem, na raiz, naquilo que eles mesmos defendiam como verdade inquestionável. O que o Senhor desejava é que todos abrissem as portas de suas consciências para a Transcendência do Reino de Deus.
Da mesma maneira, inúmeras vezes procuramos agir nós, sempre que somos interpelados por pessoas que creem somente naquilo que está escrito, literalmente, nos textos sagrados, rejeitando toda a riqueza da Sagrada Tradição cristã e do Magistério da Igreja instituída por Nosso Senhor. Dentro desse contexto, somos todos chamados a compreender o AT não literalmente, mas enquanto estágio inicial da Revelação Divina; não mais procurando interpretá-lo ao pé da letra, e sim dentro do seu devido contexto. Ali encontramos a preparação para a Realização plena do Plano de Deus, - que é Jesus Cristo, - o auge e o sentido de toda a Revelação Divina.
O tema do Evangelho deste domingo envolve a questão do casamento e da ressurreição, e ambos os temas são postos num mesmo contexto. O Papa João Paulo II, em suas célebres catequeses sobre a Teologia do Corpo, tomou este tema e colheu, com grande inteligência espiritual, a mensagem contida por trás deste Evangelho. Ocorre que o casamento aponta para o fim dos tempos, para a escatologia.
Observando as Sagradas Escrituras, vemos que na primeira página da Bíblia encontramos um casamento: a união entre Adão e Eva. Na última página da Bíblia encontramos um outro casamento: a união entre o Cordeiro de Deus e a humanidade (as Núpcias do Cordeiro). João Paulo II apontou que aquele primeiro casamento foi como que uma flecha disparada em direção ao Casamento último. Se nós, cristãos, cremos que o Matrimônio é um Sacramento, isto é, um sinal visível de uma realidade invisível, é porque cremos de fato que todos os seres humanos, sejam casados ou celibatários, foram chamados a uma União definitiva com Deus no fim dos tempos. Esta é a realidade de nossa vocação com Deus.
Assim, de alguma forma, quando vemos um casal que celebra seu Matrimônio, um homem e uma mulher que se unem sacramentalmente diante de um padre, que é celibatário, temos naquela cena uma realidade que ilumina toda a vida cristã: de alguma forma, o casal recorda ao padre que todos somos feitos para o casamento: esta é a vocação definitiva de todos nós. Ao mesmo tempo, o padre, celibatário, recorda ao casal que essa união definitiva, para a qual somos todos chamados, ainda não é aquela, mas sim o Casamento final entre Deus e a humanidade. Por isso, a união entre o homem e a mulher deve ser um sinal visível de uma realidade que virá definitivamente no Céu.
Quando Jesus explica tal realidade aos saduceus, usa as seguintes palavras:
“Os filhos deste mundo casam-se e dão-se em casamento; mas os que forem havidos por dignos de alcançar o mundo vindouro, e a ressurreição dentre os mortos, nem hão de casar, nem de ser dados em casamento; porque já não podem mais morrer; pois são iguais aos anjos, e são filhos de Deus, sendo filhos da ressurreição.” (Lucas 20,34-36)
O Senhor mostra-nos, portanto, que o casamento entre homem e mulher é uma realidade passageira. Nós iremos ressuscitar, e como ressuscitados assumiremos uma outra realidade, e esta sim será definitiva. Viveremos, em corpo e alma, uma União com Deus semelhante à que vivem os anjos.
O Evangelho de hoje nos mostra uma belíssima reflexão sobre estas duas vocações: Matrimônio e celibato. A vocação do Matrimônio é extraordinária porque nos lembra que homem e mulher devem se amar como Cristo ama a Igreja. Devem unir-se, perdoar-se mutuamente, viver tudo em comum, mas sem que um absorva o outro.
As crenças orientais veem o ser humano como uma energia que um dia vai se dissolver em Deus. Seríamos, cada um de nós, como um grão de sal que um dia vai se dissolver no grande Mar, que seria Deus. Tal analogia não nos atrai a nós, cristãos, porque se vamos um dia nos dissolver, isso significa algo diferente do que se pode entender por salvação. Se eu vou me dissolver em algo maior, então vou deixar de existir enquanto indivíduo, sendo totalmente absorvido na Divindade e perdendo a minha individualidade.
Nós, cristãos, pensamos na salvação e na União com Deus em termos de Matrimônio exatamente porque nele homem e mulher se unem mas não perdem a sua individualidade. Tornam-se um só corpo, mas não é uma união que faz dos dois uma espécie de “mistura” onde cada coisa deixa de ser ela mesma. A união sagrada entre homem e mulher, ao contrário, deve possibilitar que cada um seja mais ele mesmo, que se realize enquanto pessoa.
Assim também o próprio Cristo, a perfeita União entre Deus e homem. Como cremos no grande Mistério da Encarnação? O dogma do Concílio de Calcedônia (1451) nos diz com muita clareza que quando Jesus se fez homem, assumiu nossa humanidade, mas a União entre Deus e homem não fez com que Deus e homem se confundissem. "Unidos, mas não confundidos". Ao mesmo tempo, a natureza humana e a Natureza Divina, em Jesus Cristo, são distintas, mas não separadas. Deus se fez homem, mas não deixou de ser Deus, nem o homem que nasceu filho de mulher deixa de ser plenamente homem.
Assim iremos nos unir a Deus no Céu: não perderemos nossa identidade, mas nossa humanidade irá se realizar plenamente. O que é uma união? Numa união, você está unido com algo, mas não confundido com esse algo. Não se trata de uma mistura onde sua identidade é perdida. Entretanto, ao mesmo tempo em que o meu ser permanece distinto do outro, eu não estou separado dele. É isso que nós, católicos, entendemos por Comunhão.
De diversos modos, o diabo quer nos convencer do contrário, incutindo em nossas mentes que, se nos unirmos a Deus, deixaremos de ser nós mesmos, perderemos a nossa identidade, nossa individualidade, e perderemos toda a nossa liberdade. Mas a realidade divina é o exato oposto disso. Quando nos afastamos de Deus, aí é que nos alienamos de nós mesmos. Quando vemos as pessoas que desprezam Deus e a religião, observamos que se acham muito independentes, autônomas, “rebeldes”... Olhando mais de perto, porém, vemos que são todos iguais, escravos das opiniões alheias, dos modismos do mundo.
A Igreja nos recorda de que, quando permanecemos unidos a Deus, aí é que somos mais nós mesmos. Unido a Fonte da vida e de todo ser, o ser humano desenvolve suas potencialidades. O eu humano, que é como uma flor em botão, desabrocha e floresce. Quando entregamos nossas vidas, aí é que a recebemos de volta, em plenitude.
A vocação ao matrimônio revela uma realidade semelhante. A união entre homem e mulher não deve levar uma identidade a sujeitar e prevalecer sobre a outra, mas sim que se complementem, se realizem, se apoiem, sustentem e auxiliem. Que cresçam juntas.
Na vocação para o celibato, homens e mulheres são chamados a guardarem-se e entregarem-se plenamente a Deus, por entenderem que a união com outro ser humano não será capaz de saciar os anseios mais profundos do seu coração.
Em ambas as vocações, encontramos a vocação eucarística que é de toda a Igreja, que a leva dia a dia ao seu destino último, pleno, maravilhoso, eterno. Assim como S. João, que na última Ceia reclinou a cabeça no peito de Cristo, a Igreja procura seu lugar, em peregrinação angustiante neste mundo, onde possa descansar e reclinar a cabeça.
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** Baseado na homilia do 32º Domingo do Tempo Comum de Pe. Paulo Ricardo de Azevedo Jr., disponível em audio em
http://padrepauloricardo.org/episodios/o-casamento-entre-deus-e-a-humanidade
Acesso 9/11/013
vozdaigreja.blogspot.com
Temas: doutrina, espiritualidade cristã, mística cristã, reflexão, ser na prática, teologia, testemunho dos santos, tira-dúvidas
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Postcommunio Súmpsimus. Dómine, sacridona mystérii, humíliter deprécantes, ut, quae in tui commemoratiónem nos fácere praecepísti, in nostrae profíciant infirmitátis auxílium: Qui vivis.
"RECUAR DIANTE DO INIMIGO, OU CALAR-SE QUANDO DE TODA PARTE SE ERGUE TANTO ALARIDO CONTRA A VERDADE, É PRÓPRIO DE HOMEM COVARDE OU DE QUEM VACILA NO FUNDAMENTO DE SUA CRENÇA. QUALQUER DESTAS COISAS É VERGONHOSA EM SI; É INJURIOSA A DEUS; É INCOMPATÍVEL COM A SALVAÇÃO TANTO DOS INDIVÍDUOS, COMO DA SOCIEDADE, E SÓ É VANTAJOSA AOS INIMIGOS DA FÉ, PORQUE NADA ESTIMULA TANTO A AUDÁCIA DOS MAUS, COMO A PUSILANIMIDADE DOS BONS" –
[PAPA LEÃO XIII , ENCÍCLICA SAPIENTIAE CHRISTIANAE , DE 10 DE JANEIRO DE 1890]