“Uma imagem vale mais do que mil palavras”.
As Santas Imagens: §1159 – “A imagem sacra, o ícone litúrgico, representa principalmente Cristo. Ela não pode representar o Deus invisível e incompreensível; é a encarnação do Filho de Deus que inaugurou uma nova “economia” das imagens”.
§1160 – “A iconografia cristã transcreve pela imagem a mensagem evangélica que a Sagrada Escritura transmite pela palavra. Imagem e palavra iluminam-se mutuamente: Para proferir sucintamente nossa profissão de fé, conservamos todas as tradições da Igreja, escritas ou não-escritas, que nos têm sido transmitidas sem alteração. Uma delas é a representação pictórica das imagens, que concorda com a pregação da história evangélica, crendo que, de verdade e não na aparência, o Verbo de Deus se fez homem, o que é também útil e proveitoso, pois as coisas que se iluminam mutuamente têm sem dúvida um significado recíproco”.
§1161 – “Todos os sinais da celebração litúrgica são relativos a Cristo: são-no também as imagens sacras da santa mãe de Deus e dos santos. Significam o Cristo que é glorificado neles. Manifestam “a nuvem de testemunhas” (Hb 12,1) que continuam a participar da salvação do mundo e às quais estamos unidos, sobretudo na celebração sacramental. Por meio de seus ícones, revela-se à nossa fé o homem criado “à imagem de Deus” e transfigurado “à sua semelhança”, assim como os anjos, também recapitulados em Cristo”.
O que é uma imagem?
A imagem não é só uma escultura; é qualquer coisa que permite excitar a nossa vista: uma escultura, um desenho, uma pintura, um objeto, diz o dicionário.
São Basílio, doutor a Igreja, bispo de Cesaréia, que dizia que a veneração prestada à imagem se refere `aquele que é representado na imagem e a partir do qual esta tira a sua forma.
Ressaltava a importância sobretudo do Crucifixo:
“Muitas vezes, sem dúvida, quando não temos a paixão do Senhor no espírito e vemos a imagem da crucificação de Cristo, lembramo-nos dessa mesma paixão e prostramo-nos em adoração, não ao material, mas àquilo de que ele é imagem; da mesma maneira também não prestamos culto ao material do Evangelho nem ao da Cruz, mas ao que por eles é expresso”.
A proibição da fabricação de ídolos
No livro do Êxodo, como no do Deuteronômio (Ex 20,4; Dt 7,5) a proibição de imagens se refere à representação dos falsos deuses, ídolos .
Ex 20,1-5 - “Então Deus pronunciou todas estas palavras:
“Eu sou o Senhor teu Deus, que te fez sair do Egito, da casa da servidão. Não terás outros deuses diante de minha face. Não farás para ti escultura, nem figura alguma do que está em cima, nos céus, ou embaixo, sobre a terra, ou nas águas, debaixo da terra. Não te prostrarás diante delas e não lhes prestarás culto”.
Dt 7,5 – “Mas eis como procedereis a seu respeito: destruireis seus altares, quebrareis suas estelas, cortareis suas asserás de madeira e queimareis suas imagens de escultura”.
Deus mandou fazer imagens
Deus mandou Moisés providenciar a imagem de uma serpente de bronze à qual o próprio Jesus se referiu como símbolo do Filho do Homem levantado na cruz (Jo 3,145 ss).
Mandou Moisés fazer dois querubins para cobrirem o propiciatório (Ex 25,18 ss) e Salomão ordenou fizesse querubins e outras figuras como leões e bois no templo de Jerusalém:
1 Reis 7,29 – “Nos painéis enquadrados de molduras, havia leões, bois e querubins, assim como nas travessas igualmente. Por cima e por baixo dos leões e dos bois pendiam grinaldas em forma de festões”.
Ex 25, 16-18 - “Porás na arca o testemunho que eu te der. Farás também uma tampa de ouro puro, cujo comprimento será de dois côvados e meio, e a largura de um côvado e meio. Farás dois querubins de ouro; e os farás de ouro batido, nas duas extremidades da tampa, um de um lado e outro de outro”.
1Rs, 6,23-29 – “Fez no santuário dois querubins de madeira de oliveira, que tinham dez côvados de altura… O segundo querubim tinha também dez côvados; os dois tinham a mesma forma e as mesmas dimensões. Um e outro tinham dez côvados de altura. Salomão pô-los no fundo do templo, no Santuário. Tinham as asas estendidas, de sorte que uma asa do primeiro tocava uma das paredes e uma asa do segundo tocava a outra parede, enquanto as outras duas asas se encontravam no meio do santuário. Revestiu também de ouro os querubins.” E ainda: as paredes do Templo foram todas revestidas de imagens de querubins… Mandou esculpir em relevo em todas as paredes da casa, ao redor, no santuário como no templo, querubins, palmas e flores abertas”.
Mandamento contra a idolatria
Israel estava cercada de nações pagãs, politeístas e idólatras; cultuava-se o sol, os astros, os crocodilos, os reis, os gatos, etc. O verdadeiro povo de Deus devia se afastar de tudo isso pois era monoteísta!
Diferença entre ídolo e imagem
Chama-se ídolo: uma imagem falsa, um simulacro (ex. Bezerro de ouro – (Ex 32,1-2.4.6) a que se atribui vida própria, conforme explica o profeta:
Habacuc (2, 18) – “De que serve a imagem esculpida para que o escultor a talhe? E o ídolo fundido, que só ensina mentiras, para que o artífice nele ponha a sua confiança, fabricando divindades mudas?”. Eis o que claramente mostra Habacuc, dizendo: “Ai daquele que diz ao pau: Acorda, e a pedra muda: Desperta” (Hab 2, 19).
2Rs 18,4 - mostra que essa serpente foi depois destruída por Ezequias e que esse gesto agradou a Deus; porque o povo a quis adorar como a deusa de nome de Noestã. A imagem da serpente (símbolo da compaixão de Deus Salvador para com seu povo) virara ídolo, substituindo o verdadeiro Deus Javé pela nova deusa “salvadora” Noestã.
Judeus usaram imagens:
Também famosa foi a sinagoga de Dura-Eurôpos, na Babilônia, cujo interior apresentava imagens de Moisés e a sarça ardente, candelabro (Minorá), a saída do Egito, o sacrifício de Abraão e a visão de Ezequiel.
As catacumbas cristãs também apresentam, nas mais diversas formas (esculturas, pinturas e desenhos) imagens bíblicas como a multiplicação dos pães, o Bom Pastor, Noé e o dilúvio, a Virgem Maria, o Peixe (Ichthys), que simbolizava o Cristo, etc.
Os cristãos orientais (ortodoxos) também devotam grande respeito às imagens, as quais chamam de ícones. Os ícones gregos e russos são tidos como os mais belos da iconografia cristã.
Característica do ídolo
1 – Confunde-se com o verdadeiro e único Deus.
2 – São-lhe atribuídos poderes exclusivamente divinos.
3 – São-lhe oferecidos sacrifícios devidos ao verdadeiro Deus.
A imagem é um objeto que lembra algo fora dele; o ídolo é o ser em si mesmo. A quebra de uma imagem não destrói o ser que representa; já a destruição de um ídolo implica da destruição da falsa divindade.
A Bíblia narra no livro de Josué: “Josué prostrou-se com o rosto em terra diante da arca do Senhor, e assim permaneceu até à tarde, imitando-o todos anciãos de Israel” (Jos 7, 6).
Dulia e latria
Latria: significa adoração e é o culto devido exclusivamente ao verdadeiro e único Deus, nosso Criador e Salvador. Na adoração, reconhecemos Deus como Todo-Poderoso e Senhor do universo.
Dulia: significa homenagem, veneração. São dignas de veneração, no campo religioso, os santos e todas as criaturas que, neste mundo, fizeram e fazem a vontade do Pai, por se tornarem nossos modelos de fé e caridade.
A palavra “dulia” vem do grego “doulos” que significa “servidor”. Dulia em português quer dizer reverência, veneração. Latria é adoração; vem do grego “latreia” que significa serviço ou culto prestados a um soberano senhor.
Aristóteles, sábio filósofo grego, já dizia: “Nada está na mente que não tenha passado pelos sentidos”. A visão de uma imagem desperta na alma pensamentos salutares, o anseio de imitar o santo de sua devoção, a se sacrificar por Jesus crucificado.
Entre os orientais as imagens possuem também grande importância. A grade que fecha o santuário tornou-se uma iconostese, ornada de imagens. Os concílios ecumênicos sempre censuram a exclusão sistemática de imagens como contrária á tradição cristã.
Imagens na Patrística
São Gregório de Nissa, em 394, escreveu:
“A figura muda sabe falar nas paredes das igrejas e muito ajuda” (Panegírico de São Tenório).
O papa São Gregório Magno, (†604) escreveu o seguinte ao bispo de Marselha:
“Vós não devíeis quebrar o que foi posto nas igrejas, não para ser adorado, mas simplesmente venerado. Uma coisa é adorar uma imagem e outra coisa é aprender, através dessa imagem, a quem as tuas orações são dirigidas. O que as Escrituras representam para os letrados, a imagem o é para os iletrados: são por essas imagens que aprendem o caminho a seguir. A imagem é o livro dos que não sabem ler” (Epístola XI,13).
São João Damasceno (749) também defendia o uso didático das imagens.
“Antigamente Deus, que não tem nem corpo nem aparência, não podia em absoluto ser representado por uma imagem. Mas agora que se mostrou na carne e viveu com os homens posso fazer uma imagem daquilo que vi de Deus. (…) Com o rosto descoberto, contemplamos a glória do Senhor”.
“Como fazer a imagem do invisível? … Na medida em que Deus é invisível, não o represento por imagens; mas, desde que viste o incorpóreo feito homem, fazes a imagem da forma humana: já que o inviável se tornou visível na carne, pinta a semelhança do invisível” (I 8 PG 94, 1237-1240).
“Outrora Deus, o Incorpóreo e invisível, nunca era representado. Mas agora que Deus se manifestou na carne e habitou entre os homens, eu represento o “visível” de Deus. Não adoro a matéria, mas o Criador da matéria” (Ibid. I 16 PG 94, 1245s).
“A beleza e a cor das imagens estimulam minha oração. É uma festa para os meus olhos, tanto quanto o espetáculo do campo estimula meu coração a dar glória a Deus.” A contemplação dos ícones santos, associada à meditação da Palavra de Deus e ao canto dos hinos litúrgicos, entra na harmonia dos sinais da celebração para que o mistério celebrado se grave na memória do coração e se exprima em seguida na vida nova dos fiéis.
Santa Teresa de Ávila († 1582), ao ensinar as vias da oração às suas Religiosas, dizia :
“Eis um meio que vos poderá ajudar… Cuidai de ter uma imagem ou uma pintura de Nosso Senhor que esteja de acordo com o vosso gosto. Não vos contenteis com trazê-las sobre o vosso coração sem jamais a olhar, mas servi-vos da mesma para vos entreterdes muitas vezes com Ele” (Caminho de Perfeição, cap. 43,1).
Concilio de Nicéia II, em 787
Com a eclosão da iconoclastia (isto é, a destruição das imagens sagradas) nos séculos VIII e IX, o II Concílio de Nicéia, em 787, reafirmou solenemente a validade da veneração das imagens. Assim se definiram os padres conciliares na Sessão de 13 de outubro de 787:
“Na trilha da doutrina divinamente inspirada de nossos santos Padres e da tradição da Igreja católica, que sabemos ser a tradição do Espírito Santo que habita nela, definimos com toda certeza e acerto que as veneráveis e santas imagens, bem como as representações da cruz preciosa e vivificante, sejam elas pintadas, de mosaico ou de qualquer outra matéria apropriada, devem ser colocadas nas santas igrejas de Deus, sobre os utensílios e as vestes sacras, sobre paredes e em quadros, nas casas e nos caminhos, tanto a imagem de Nosso Senhor, Deus e Salvador, Jesus Cristo, como a de Nossa Senhora, a puríssima e santíssima mãe de Deus, dos santos anjos, de todos os santos e dos justos”.
O que disseram os líderes protestantes:
Lutero foi tolerante com as imagens, como se pode ver no texto abaixo, de 1528. Ele rejeitou os iconoclastas e considerava as imagens edificantes:
“Tenho como algo deixado à livre escolha as imagens, os sinos, as vestes litúrgicas… e coisas semelhantes. Quem não os quer, deixe-os de lado, embora as imagens inspiradas pela Escritura e por histórias edificantes me pareçam muito úteis… Nada tenho em comum com os Iconoclastas” (Da Ceia de Cristo).
O teólogo e historiador luterano Martin N. Dreher, em sua obra “A Crise e a Renovação da Igreja no Período da Reforma” sustenta uma posição favorável ao uso das imagens. Seguem alguns trechos dessa sua obra, em especial do capítulo 5, intitulado “Palavra e Imagem”:
“Na primavera de 1522 aconteceu, em Wittenberg, o início de uma das maiores catástrofes na história da humanidade. O conselho da cidade determinara a retirada das imagens das igrejas. Quando se começou a executar a decisão dos conselheiros municipais, a multidão reunida na frente da igreja da cidade invadiu o templo, arrancou as imagens das paredes, quebrou-as e terminou por queimar tudo do lado de fora. Em questão de minutos, uma paixão brutal destruiu o que para gerações de cristãos fora objeto de veneração religiosa”.
No Código de Direito Canônico
O Código de Direito de Direito Canônico da Igreja também dá orientações importantes sobre o uso das imagens:
Cân. 1188 – Mantenha-se a praxe de propor imagens sagradas nas igrejas, para a veneração dos fiéis; entretanto, sejam expostas em número moderado e na devida ordem, a fim de que não se desperte a admiração no povo cristão, nem se dê motivo a uma devoção menos correta.
Cân. 1189 – Imagens preciosas, isto é, que sobressaem por antiguidade, arte ou culto, expostas à veneração dos fiéis, em igrejas e oratórios, se precisarem de reparação, nunca sejam restauradas sem a licença escrita do Ordinário; este, antes de concedê-la, consulte os peritos.
Cân. 1190 – § 1. Não é lícito vender relíquias sagradas.
§ 2. As relíquias insignes, bem como outras de grande veneração do povo, não podem de modo algum ser alienadas nem definitivamente transferidas, sem a licença da Sé Apostólica.
§ 3. A prescrição do § 2 vale também para as imagens que são objeto de grande veneração do povo em alguma igreja.
Cân. 1237 §2. Conserve-se a antiga tradição de colocar debaixo do altar fixo relíquias de mártires ou de outros santos, de acordo com as normas prescritas nos livros litúrgicos.
No Concílio Vaticano II
O Concílio Vaticano II muito valorizou a arte sacra e as imagens, como podemos ver: nas e “Lúmen Gentium”.
O capítulo VII da Constituição “Sacrossantum Concilium”
“Entre as mais nobres atividades do espírito humano contam-se com todo o direito as belas-artes, principalmente a arte religiosa e a sua melhor expressão, a arte sacra. Por sua própria natureza estão relacionados com a infinita beleza de Deus a ser expressa de certa forma pelas obras humanas. Tanto mais podem dedicar-se a Deus, a seu louvor e a exaltação de sua glória, quanto mais distantes estiverem de todo propósito que não seja o de contribuir poderosamente na sincera conversão dos corações humanos a Deus.
Por isso a Santa Mãe Igreja sempre foi amiga das belas artes. Procurou continuamente o seu nobre ministério e instruiu os artífices, principalmente para que os objetos pertencentes ao culto divino fossem dignos, decentes e belos, sinais e símbolos das coisas do alto. Até a Igreja se considerou, com razão, juiz sobre elas, julgando entre as obras de arte quais convinham a fé, a piedade, as leis religiosamente estabelecidas e quais eram consentâneas ao uso sagrado.
Com especial zelo a Igreja cuidou que as sagradas alfaias servissem digna e belamente ao decoro do culto, admitindo aquelas mudanças ou na matéria ou na forma, ou na ornamentação que o progresso da técnica da arte trouxe no decorrer dos tempos.
Por isso acerca destas coisas os Padres acharam por bem estabelecer o seguinte.” (SC, 122)
“Cuidem os Ordinários que, promovendo e incentivando a arte verdadeiramente sacra, visem antes a nobre beleza que a mera suntuosidade. O que se há de entender também das vestes sacras e dos ornamentos.
Tomem providências os Bispos que as obras de arte, que repugnam a fé e aos costumes, a piedade cristã e ofendem o verdadeiro senso religioso quer pela deturpação das formas, quer pela insuficiência, mediocridade e simulação da arte, sejam cuidadosamente retiradas das casas de Deus e dos demais lugares sagrados.
Ao se construírem igrejas, cuide-se, diligentemente, que sejam funcionais, tanto para a celebração ativa dos fiéis.” (n. 124)
“Firme permaneça a costume de propor nas igrejas as sagradas imagens a veneração dos fiéis; contudo, sejam expostas com moderação quanto ao número, com conveniência quanto a ordem, para que não causem admiração ao povo cristão nem favoreçam devoções menos corretas.” (n.125)
“Os Bispos, por si ou por sacerdotes idôneos dotados de competência e amor a arte, interessem-se pelos artistas, para imbuí-los do espírito da Arte Sacra e da Sagrada Liturgia.
Os artistas todos, que, levados por seu gênio, querem servir na Santa Igreja a glória de Deus, sempre se lembrem de que se trata de certa forma da sagrada imitação de Deus Criador, e que suas obras se destinam ao culto católico, a edificação dos fiéis, bem como a piedade e a instrução religiosa deles”. (n. 127)
“Os Clérigos, enquanto estudam Filosofia e Teologia, sejam também instruídos na história da Arte Sacra e de sua evolução, bem como acerca dos sãos princípios por que se devem reger as obras de arte de tal forma que apreciam e conservem os veneráveis monumentos da Igreja e possam orientar os artistas na produção de suas obras”. (n. 129)