- MÊS DE MAIO DE 2014
- MEMÓRIAS DA IRMÃ LÚCIA
(05) RETRATO DE JACINTA Continuação
6 Jacinta, a pequena Pastora.
Entretanto. Ex.mo e Rev.mo Senhor Bispo, cheguei à idade em que minha Mãe mandava os seus filhos guardar o rebanho.
Minha irmã Carolina fez os seus 13 anos e era preciso começar a trabalhar.
Minha Mãe entregou-me, por isso, o cuidado do nosso rebanho.
Dei a notícia aos meus companheiros e disse-lhes que não voltava mais a brincar com eles; mas os pequenitos não se conformavam com a separação..
Foram pedir à Mãe que os deixasse ir comigo, o que lhes foi negado.
Tivemos que nos conformar com a separação.
Vinham, então, quase todos os dias, à noitinha, esperar-me ao caminho e lá íamos, então, para a eira, dar algumas corridas, à espera que Nossa Senhora e os Anjos acendessem as suas candeias e as viessem pôr à janela para nos alumiar, como nós dizíamos.
Quando não havia luar, dizíamos que a candeia de Nossa Senhora não tinha azeite.
Aos dois pequenitos custava a conformar com a ausência da sua antiga companheira.
Por isso, renovavam continuamente as instâncias junto de sua Mãe, para que os deixasse também eles, guardar o seu rebanho.
MinhaTia, talvez para se ver livre de tantos pedidos. apesar de serem demasiado pequenos, entregou-lhes a guarda das suas ovelhinhas.
Radiantes de alegria, foram dar-me a notícia e combinar como juntaríamos todos os dias os nossos rebanhos.
Cada um abriria o seu à hora que lhe mandasse sua Mãe e o primeiro esperava pelo outro no Barreiro (assim chamávamos a uma pequena lagoa que estava ao fundo da serra).
Uma vez juntos, combinávamos qual a pastagem do dia e para lá íamos, tão felizes e contentes como se fôssemos para uma festa !
Aqui temos, Ex.mo e Rev.mo Senhor Bispo, a Jacinta na sua nova vida de pastorinha.
As ovelhinhas ganhá-mo-las à força de distribuir por elas as nossas merendas.
Por isso, quando chegávamos à pastagem, podíamos brincar descansados, que elas não se afastavam de nós.
A Jacinta gostava muito de ouvir o eco da voz no fundo dos vales.
Por isso, um dos nossos entretenimentos era, no cimo dos montes, sentados no penedo maior, pronunciar nomes em alta voz.
O nome que melhor ecoava era o de Maria.
A Jacinta dizia, às vezes, assim, a Ave Maria inteira, repetindo a palavra seguinte só quando a precedente tinha acabado de ecoar.
Gostávamos também de entoar cânticos.
Entre vários profanos, que infelizmente sabíamos bastantes, a Jacinta preferia o Salve Nobre Padroeira, Virgem pura, Anjos cantai comigo.
Éramos, no entanto, bastante afeiçoados ao baile e qualquer instrumento que ouvíssemos tocar aos outros pastores era o bastante para nos pôr a dançar.
A Jacinta, apesar de ser tão pequena, tinha, para isso, uma arte especial.
Tinham-nos recomendado que, depois da merenda, rezássemos o Terço; mas, como todo o tempo nos parecia pouco, para brincar, arranjámos uma boa maneira de acabar breve : passávamos as contas, dizendo somente : Ave Maria, Ave Maria, Ave Maria.
Quando chegávamos ao fim do mistério, dizíamos, com muita pausa, a simples palavra : Padre Nosso !
E assim, em um abrir e fechar de olhos, como se costuma dizer, tínhamos o nosso Terço rezado !
A Jacinta gostava também muito de agarrar os cordeirinhos brancos, sentar-se com eles no colo, abraçá-los, beijá-los e, à noite, trazê-los ao colo para casa, para que não se cansassem.
Um dia, ao volar para casa, meteu-se no meio do rebanho.
- Jacinta perguntei-lhe para que vais aí, no meio das ovelhas ?
- Para fazer como Nosso Senhor, que, naquele santinho que me deram, também está assim, no meio de muitas e com uma ao colo.
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