-
Luciano Ayan
Ceticismo e dinâmica social na investigação da religião política
Líder neo-ateu, Sam Harris não sabe brincar
com 2 comentários
Com profunda decepção, ao ler o Twitter de Sam Harris, noto que o criador do neo-ateísmo (o primeiro livro dessa linhagem foi dele, A Morte da Fé, em 2004, dois anos antes de Deus um Delírio, de Richard Dawkins) nos ajudou a configurar um jogo que, se jogado contra ele, deixa-o irritado. Lamentável, lamentável.
Há várias regras do neo-ateísmo que eu adaptei para meu paradigma neo-iluminista, como a noção de que não devemos ter limites ao criticar um oponente ideológico cujas idéias podem ser consideradas injustificadas e/ou perigosas. Também aprendi que a ridicularização é uma arte que devemos dominar. Outra lição fundamental é aquela nos dizendo que se este oponente pedir um respeito especial, isso significa intolerância à crítica, e, portanto, oposição à liberdade de expressão. Em outras palavras, se criticamos X por uma série de motivos, temos ainda mais justificativas para crítica se representantes de X pedirem um respeito especial. O lema é “Não ouse pedir para que eu não te critique, pois isso me dará motivos adicionais para críticas”. Em todas suas ações, demonstre a imoralidade do oponente, caso queira.
Essas e mais uma meia dúzia de regras configuram lemas que podem se tornar normas de conduta e devem ser usadas em toda ação discursiva política, a meu ver. E se a luta contra a religião tradicional é uma ação política, a luta contra a religião política também o é. Eu diria que essas são as regras morais do neo-ateísmo, que eu defendo.
Há regras adicionais no neo-ateísmo que não gosto, como o uso da fraude deliberada na tentativa de se criar um ranço de ódio contra o grupo atacado. Criar um sentimento de raiva contra o oponente é legítimo, mas não através de mentiras torpes. Outro ponto do discurso neo-ateu facilmente condenável é a mania deles impedirem o debate com a prática de mentiras em quantidade tão frenética a ponto de fazer o oponente desistir, não por falta de argumentos, mas por nojo da discussão. Estas seriam as regras imorais do neo-ateísmo. Nestes aspectos, ao invés de copiá-los, eu defendo a neutralização das mentiras que eles contam, explicando de forma didática ao ouvinte e ao leitor a arquitetura destas fraudes.
Mesmo sendo um artista das palavras que nos disse de maneira sub-comunicada que “essas são as novas regras do debate público”, Harris ficou fulo da vida quando o blog Salon jogou com regras mais ou menos semelhantes às que ele utiliza em seus livros e demais atos discursivos.
Um artigo de Nathan Lean entitulado “Neo-ateus flertam com a Islamofobia” diz que “os neo-ateus se juntaram a um coro crescente de pessoas que odeiam muçulmanos, misturando sua irritação com a religião em geral com um ataque específico ao Islã”. Lean diz que “os neo-ateus se tornaram os novos islamofóbicos, e suas injúrias contra os muçulmanos lembram os racistas rurais, ao invés de serem avaliações com base no intelecto, racionalidade e razão”.
Em seu “caso”, Lean cita a seguinte passagem de Sam Harris: “O Islã, mais do que qualquer outra religião que os humanos tenham criado, tem todos os ingredientes de um profundo culto da morte”. Lean nota que Harris, assim como Dawkins, defende a idéia que terroristas suicidas não são aberrações, mas a norma. Segundo os neo-ateus “os terroristas não distorceram sua fé por interpretá-la errada, mas viveram sua fé interpretando-a corretamente”.
Em outro texto do Salon, entitulado “As mentiras de Christopher Hitchens não ajudam o ateísmo”, Curtis White diz que faltava decência ao falecido (em 2011) autor neo-ateu. Para White, Hitchens “reduz a religião a uma série de anedotas criminais”.
No mesmo site, em uma entrevista a Charly Wilder, Chris Hedges diz o seguinte sobre Hitchens: “Acho que ele é completamente amoral. Eu acho que ele não tem um núcleo moral. Acho que ele não acredita em nada. Christopher Hitchens mede algo como moral com base se é bom ou não para ele”.
Essas imagens mostram que Harris não gostou nem um pouco:
Harris não gostou de ser chamado de racista ou islamofóbico. E gostou muito menos do pouco respeito que o Salon nutriu com o falecido Hitchens, seu amigo.
Em relação a Hitchens, por que alguém deveria ter um respeito excessivo com alguém só por que essa pessoa morreu? Lembrando que de acordo com as regras de Harris e de qualquer autor neo-ateu, a mera solicitação de respeito injustificado é um motivo adicional para dobrarmos as críticas ao objeto sob nosso escrutínio.
Em relação à falsa acusação de islamofobia e racismo, Harris faz uma reclamação justa, pois de fato são falsas acusações. Atacar um grupo por suas crenças não significa “fobia” em relação a este grupo, mesmo que as críticas sejam duras e até cruéis. Mas acusar alguém falsamente de islamofobia e racismo, é apenas um truque para inviabilizar o debate, e é isso que Sam Harris faz na maior parte de seu tempo.
Eu seu livro, ele não se furta a dizer que, pelo fato da Bíblia dizer que os escravos deveriam respeitar seus senhores, então a Bíblia “defende a escravidão”. Suponha que eu afirme “pague seus impostos em dia” e alguém como Harris diga que eu “defendo cobrança de impostos”. Claro que é uma mentira deslavada! Eu sou contra a cobrança excessiva de impostos, mas já que esta é a lei, que se cumpra a lei e depois lutemos para mudá-la. Se entendemos que defender a prática de um ato, em termos civis, não é o mesmo que argumentar sobre a moralidade deste ato, sabemos que todas as acusações de Harris tentando imputar apoio à escravidão aos cristãos são tão difamatórias quanto aquelas dos esquerdistas do Salon tentando imputar islamofobia a ele. Tanto Harris como alguns autores do Salon estão apenas tentando inviabilizar o debate com um rótulo para constranger o oponente, ao invés de debater de fato.
Outros truques de Harris incluem distorcer as passagens da Bíblia para fingir que a religião, se seguida à risca, leva à violência. Ou mesmo o famoso truque de apontar a religião como causa de guerras. Como se isso não fosse suficiente, ainda temos estratagemas desonestíssimos como fingir ser “dono da razão” e “representante da ciência’. A melhor coisa é ler o material de Harris com um guia de propaganda nas mãos e buscar as propagandas enganosas. Se você não encontrar cerca de 10 fraudes por capítulo, é sinal de que você precisa treinar mais a arte de investigação de fraudes intelectuais.
Harris sabe disso, e exatamente por isso deveria estar mais preparado para o novo mundo dos debates que ele ajudou a criar.
Reconheço que os neo-ateus nos ensinaram muito sobre assertividade em um debate, e sobre como podemos atacar um oponente de forma contínua, usando até os pedidos de clemência do oponente como um justificador moral para aumentarmos a força dos ataques. (Não esqueçamos da regra, se o oponente que estiver sendo criticado pedir “por favor, não desrespeite minha crença tanto assim”, esse é um motivo adicional para dobrarmos os ataques, pois além dos motivos para o ataque original, também temos uma solicitação de respeito injustificado, que por si só já deveria ser criticada em um mundo livre no qual o direito de podermos criticar quem quisermos de forma ácida e até ultrajante deveria ser absoluto)
Por isso, é lamentável, vergonhoso e abjeto ver Sam Harris pedindo água, requisitando até boicote ao Salon (aliás, não dou a mínima para o Salon, publicação ultra-esquerdista). Pior ainda é vê-lo tentando apelar dizendo que estão “dançando sobre o túmulo de Hitchens”, o que parece uma solicitação de respeito injustificado, algo que acostumamos com os neo-ateus a achar por si só moralmente abjeto. Pode-se nutrir tanto respeito por Hitchens quanto Hitchens nutria pela Madre Teresa de Calcutá. Ou seja, nenhum. Em 1998, um ano após a morte dela, Hitchens desceu-lhe a lenha no livro “The Missionary Position: Mother Theresa in Theory and Practice”.
Em resumo, Sam Harris parece não gostar que os outros usem as regras do jogo definidas por ele. Mas de novo sou obrigado a citar uma frase que vi dias atrás em um vídeo do Rodrigo Constantino: “Se não sabe brincar, não desce pro play”.
Compartilhe:
Compartilhar
Escrito por lucianohenrique
26 de junho de 2013 às 10:18 pm
Publicado em Outros
Etiquetado com christopher hitchens, dialética de ataque, guerra cultural, humanismo, neo-ateísmo, salon, sam harris
« Marco Feliciano fala tudo da “cura gay”
2 Respostas
Assinar os comentários com RSS.
Então curtiu meu conselho, Ayan?
Enfim, nada a acrescentar.
Octávio Henrique
26 de junho de 2013 em 10:48 pm
Resposta
Com certeza, ótima dica.
lucianohenrique
26 de junho de 2013 em 10:50 pm
Resposta
Deixe uma resposta
Páginas
About
Agenda oponente
Falácias
Glossário
Jogo de rótulos
Livros recomendados
Objeções
Propaganda
Rotinas Esquerdistas
Rotinas Neo-Ateístas
Séries
Textos selecionados
Pesquisar por:
Comentários
Cidadão em Por que um “chamado aos milita…
lucianohenrique em Líder neo-ateu, Sam Harris não…
Octávio Henrique em Líder neo-ateu, Sam Harris não…
Marcio em Por que um “chamado aos milita…
Marcio em Marco Feliciano fala tudo da…
RSS do site
RSS - Posts
RSS - Comentários
Blog Luciano Ayan
Posts Recentes
Líder neo-ateu, Sam Harris não sabe brincar
Marco Feliciano fala tudo da “cura gay”
Por que um “chamado aos militares” é o pior erro estratégico que a direita pode cometer neste momento?
Rodrigo Constantino acerta tudo em novo vídeo onde identifica que o PT já tomou a dianteira com as manifestações
“Livres para escolher”, de Milton Friedman
Categorias
Arquivos
junho 2013
maio 2013
abril 2013
março 2013
fevereiro 2013
janeiro 2013
dezembro 2012
novembro 2012
outubro 2012
setembro 2012
agosto 2012
julho 2012
junho 2012
maio 2012
abril 2012
março 2012
fevereiro 2012
janeiro 2012
dezembro 2011
abril 2011
março 2011
fevereiro 2011
janeiro 2011
dezembro 2010
novembro 2010
outubro 2010
setembro 2010
agosto 2010
julho 2010
junho 2010
maio 2010
abril 2010
março 2010
fevereiro 2010
janeiro 2010
dezembro 2009
novembro 2009
outubro 2009
setembro 2009
agosto 2009
Brazilian Blogs
Ad Hominem
Amigos da Guarda Civil
Blog Shalom
Causa Liberal
Cavaleiro do Templo
Crítica Cultural
Demétrius Surdi
Desconstruindo
Deus em Debate
Deus lo Vult!
Diário Conservador Brasileiro
Ecclesia Una
Espectadores
Fides Et Ratio
Filosofia e Apologética
Filosofia e Ceticismo
Guia de Blogs Católicos
Humor Darwinista
Instituto Liberal
Inter-esse
Julio Severo
Laicatólico
Lamentabili
Lúdico Medieval
Liberdade de Expressão
Macartista
Moderado Realismo
Mundo Analista
Nada de novo sob o sol
Neo Ateísmo Português
Norma Braga
Nous
O Cruzado Missionário
O que está acontecendo na América Latina?
Ordem Livre
Pela legítima defesa
Pensando, Lendo e Ouvindo
Perspectivas
Pesadelo Chinês
Pio XII – O Papa Mais Caluniado
Portal Anti-Ateu de Portugal
Ricardo Salles
Sentir com a Igreja
Sou conservador sim, e daí?
Tradição Católica
Verde – A cor nova do comunismo
Brazilian Sites
A Verdade Sufocada
Endeavor Brasil
Escola sem Partido
Fórum da Liberdade
Instituto Millenium
Mídia sem Máscara
Nivaldo Cordeiro
Olavo de Carvalho
Paz no campo
Portal Libertarianismo
Revolução e Contra-Revolução Online
Foreign Blogs
Mass Resistance
Foreign Sites
Accuracy in Media
American Thinker
Ann Coulter
Bernard Goldberg
Christian Legal Centre
CNS News
Conservapedia
Conservative Truth
Drudge Retort
Fox News
Free Republic
Glenn Beck
GOP Thinker
Investigating Atheism
Lew Rockwell
Ludwig von Mises Institute
Media Research Center
News Busters
Power Kills
Reasonable Faith
Renew America
Right Wing News
Rush Limbaugh
Students for Academic Freedom
The John Birch Society
The New American
Townhall
Washington Times
World Net Daily
Meta
Registrar-se
Login
Posts RSS
RSS dos comentários
WordPress.com
Email Subscription
Coloque seu e-mail para receber novidades e notificações do Blog.
Junte-se a 1.244 outros seguidores
Tags
anti-religiãoantiteísmoapologia ao crimeateusateísmoceticismoceticismo políticochristopher hitchenscomunismoconservadorismocristianismodaniel dennettdebatedinâmica socialdireitaditaduraesquerdaesquerdismoestado inchadoestratégia gramscianafaláciagayzismoguerra culturalguerra políticahumanismohumanismo secularinvestigaçãomarxismomarxismo culturalmentalidade revolucionárianazismoneo-ateusneo-ateísmoolavo de carvalhopetralhaspolíticapreconceitopropagandaPTreligiãoreligião políticaRichard Dawkinssam harristolerância ao crimetotalitarismo
Blog no WordPress.com. Tema: Personalizado The Journalist v1.9 por Lucian E. Marin.
Seguir
Seguir “Luciano Ayan”
Obtenha todo post novo entregue na sua caixa de entrada.
Junte-se a 1.244 outros seguidores
Tecnologia WordPress.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário