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    quarta-feira, 26 de junho de 2013

    Líder neo-ateu, Sam Harris não sabe brincar








    -

    Luciano Ayan



    Ceticismo e dinâmica social na investigação da religião política


    Líder neo-ateu, Sam Harris não sabe brincar


    com 2 comentários



    Com profunda decepção, ao ler o Twitter de Sam Harris, noto que o criador do neo-ateísmo (o primeiro livro dessa linhagem foi dele, A Morte da Fé, em 2004, dois anos antes de Deus um Delírio, de Richard Dawkins) nos ajudou a configurar um jogo que, se jogado contra ele, deixa-o irritado. Lamentável, lamentável.

    Há várias regras do neo-ateísmo que eu adaptei para meu paradigma neo-iluminista, como a noção de que não devemos ter limites ao criticar um oponente ideológico cujas idéias podem ser consideradas injustificadas e/ou perigosas. Também aprendi que a ridicularização é uma arte que devemos dominar. Outra lição fundamental é aquela nos dizendo que se este oponente pedir um respeito especial, isso significa intolerância à crítica, e, portanto, oposição à liberdade de expressão. Em outras palavras, se criticamos X por uma série de motivos, temos ainda mais justificativas para crítica se representantes de X pedirem um respeito especial. O lema é “Não ouse pedir para que eu não te critique, pois isso me dará motivos adicionais para críticas”. Em todas suas ações, demonstre a imoralidade do oponente, caso queira.

    Essas e mais uma meia dúzia de regras configuram lemas que podem se tornar normas de conduta e devem ser usadas em toda ação discursiva política, a meu ver. E se a luta contra a religião tradicional é uma ação política, a luta contra a religião política também o é. Eu diria que essas são as regras morais do neo-ateísmo, que eu defendo.

    Há regras adicionais no neo-ateísmo que não gosto, como o uso da fraude deliberada na tentativa de se criar um ranço de ódio contra o grupo atacado. Criar um sentimento de raiva contra o oponente é legítimo, mas não através de mentiras torpes. Outro ponto do discurso neo-ateu facilmente condenável é a mania deles impedirem o debate com a prática de mentiras em quantidade tão frenética a ponto de fazer o oponente desistir, não por falta de argumentos, mas por nojo da discussão. Estas seriam as regras imorais do neo-ateísmo. Nestes aspectos, ao invés de copiá-los, eu defendo a neutralização das mentiras que eles contam, explicando de forma didática ao ouvinte e ao leitor a arquitetura destas fraudes.

    Mesmo sendo um artista das palavras que nos disse de maneira sub-comunicada que “essas são as novas regras do debate público”, Harris ficou fulo da vida quando o blog Salon jogou com regras mais ou menos semelhantes às que ele utiliza em seus livros e demais atos discursivos.

    Um artigo de Nathan Lean entitulado “Neo-ateus flertam com a Islamofobia” diz que “os neo-ateus se juntaram a um coro crescente de pessoas que odeiam muçulmanos, misturando sua irritação com a religião em geral com um ataque específico ao Islã”. Lean diz que “os neo-ateus se tornaram os novos islamofóbicos, e suas injúrias contra os muçulmanos lembram os racistas rurais, ao invés de serem avaliações com base no intelecto, racionalidade e razão”.

    Em seu “caso”, Lean cita a seguinte passagem de Sam Harris: “O Islã, mais do que qualquer outra religião que os humanos tenham criado, tem todos os ingredientes de um profundo culto da morte”. Lean nota que Harris, assim como Dawkins, defende a idéia que terroristas suicidas não são aberrações, mas a norma. Segundo os neo-ateus “os terroristas não distorceram sua fé por interpretá-la errada, mas viveram sua fé interpretando-a corretamente”.

    Em outro texto do Salon, entitulado “As mentiras de Christopher Hitchens não ajudam o ateísmo”, Curtis White diz que faltava decência ao falecido (em 2011) autor neo-ateu. Para White, Hitchens “reduz a religião a uma série de anedotas criminais”.

    No mesmo site, em uma entrevista a Charly Wilder, Chris Hedges diz o seguinte sobre Hitchens: “Acho que ele é completamente amoral. Eu acho que ele não tem um núcleo moral. Acho que ele não acredita em nada. Christopher Hitchens mede algo como moral com base se é bom ou não para ele”.

    Essas imagens mostram que Harris não gostou nem um pouco:


    Harris não gostou de ser chamado de racista ou islamofóbico. E gostou muito menos do pouco respeito que o Salon nutriu com o falecido Hitchens, seu amigo.

    Em relação a Hitchens, por que alguém deveria ter um respeito excessivo com alguém só por que essa pessoa morreu? Lembrando que de acordo com as regras de Harris e de qualquer autor neo-ateu, a mera solicitação de respeito injustificado é um motivo adicional para dobrarmos as críticas ao objeto sob nosso escrutínio.

    Em relação à falsa acusação de islamofobia e racismo, Harris faz uma reclamação justa, pois de fato são falsas acusações. Atacar um grupo por suas crenças não significa “fobia” em relação a este grupo, mesmo que as críticas sejam duras e até cruéis. Mas acusar alguém falsamente de islamofobia e racismo, é apenas um truque para inviabilizar o debate, e é isso que Sam Harris faz na maior parte de seu tempo.

    Eu seu livro, ele não se furta a dizer que, pelo fato da Bíblia dizer que os escravos deveriam respeitar seus senhores, então a Bíblia “defende a escravidão”. Suponha que eu afirme “pague seus impostos em dia” e alguém como Harris diga que eu “defendo cobrança de impostos”. Claro que é uma mentira deslavada! Eu sou contra a cobrança excessiva de impostos, mas já que esta é a lei, que se cumpra a lei e depois lutemos para mudá-la. Se entendemos que defender a prática de um ato, em termos civis, não é o mesmo que argumentar sobre a moralidade deste ato, sabemos que todas as acusações de Harris tentando imputar apoio à escravidão aos cristãos são tão difamatórias quanto aquelas dos esquerdistas do Salon tentando imputar islamofobia a ele. Tanto Harris como alguns autores do Salon estão apenas tentando inviabilizar o debate com um rótulo para constranger o oponente, ao invés de debater de fato.

    Outros truques de Harris incluem distorcer as passagens da Bíblia para fingir que a religião, se seguida à risca, leva à violência. Ou mesmo o famoso truque de apontar a religião como causa de guerras. Como se isso não fosse suficiente, ainda temos estratagemas desonestíssimos como fingir ser “dono da razão” e “representante da ciência’. A melhor coisa é ler o material de Harris com um guia de propaganda nas mãos e buscar as propagandas enganosas. Se você não encontrar cerca de 10 fraudes por capítulo, é sinal de que você precisa treinar mais a arte de investigação de fraudes intelectuais.

    Harris sabe disso, e exatamente por isso deveria estar mais preparado para o novo mundo dos debates que ele ajudou a criar.

    Reconheço que os neo-ateus nos ensinaram muito sobre assertividade em um debate, e sobre como podemos atacar um oponente de forma contínua, usando até os pedidos de clemência do oponente como um justificador moral para aumentarmos a força dos ataques. (Não esqueçamos da regra, se o oponente que estiver sendo criticado pedir “por favor, não desrespeite minha crença tanto assim”, esse é um motivo adicional para dobrarmos os ataques, pois além dos motivos para o ataque original, também temos uma solicitação de respeito injustificado, que por si só já deveria ser criticada em um mundo livre no qual o direito de podermos criticar quem quisermos de forma ácida e até ultrajante deveria ser absoluto)

    Por isso, é lamentável, vergonhoso e abjeto ver Sam Harris pedindo água, requisitando até boicote ao Salon (aliás, não dou a mínima para o Salon, publicação ultra-esquerdista). Pior ainda é vê-lo tentando apelar dizendo que estão “dançando sobre o túmulo de Hitchens”, o que parece uma solicitação de respeito injustificado, algo que acostumamos com os neo-ateus a achar por si só moralmente abjeto. Pode-se nutrir tanto respeito por Hitchens quanto Hitchens nutria pela Madre Teresa de Calcutá. Ou seja, nenhum. Em 1998, um ano após a morte dela, Hitchens desceu-lhe a lenha no livro “The Missionary Position: Mother Theresa in Theory and Practice”.

    Em resumo, Sam Harris parece não gostar que os outros usem as regras do jogo definidas por ele. Mas de novo sou obrigado a citar uma frase que vi dias atrás em um vídeo do Rodrigo Constantino: “Se não sabe brincar, não desce pro play”.

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    Escrito por lucianohenrique

    26 de junho de 2013 às 10:18 pm


    Publicado em Outros

    Etiquetado com christopher hitchens, dialética de ataque, guerra cultural, humanismo, neo-ateísmo, salon, sam harris

    « Marco Feliciano fala tudo da “cura gay”
    2 Respostas

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    Então curtiu meu conselho, Ayan?

    Enfim, nada a acrescentar.


    Octávio Henrique

    26 de junho de 2013 em 10:48 pm
    Resposta





    Com certeza, ótima dica.


    lucianohenrique

    26 de junho de 2013 em 10:50 pm
    Resposta



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