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    Células-tronco embrionárias, aborto e clonagem humana














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    Ano IX Sex, 24 de Maio de 2013 Número 227

















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    Células-tronco embrionárias, aborto e clonagem humana


    Escrito por Hermes Rodrigues Nery | 23 Maio 2013

    Artigos - Globalismo

    O verdadeiro objetivo da pressão internacional pela legalização da experimentação com as células tronco embrionárias não consiste na esperança, muito remota por sinal, e reconhecida como tal pelos próprios cientistas, de obter-se a cura de algumas doenças hoje temidas. Trata-se do mesmo fenômeno que observamos na luta para legalizar o aborto terapêutico onde tal exceção não existe na legislação vigente, quando se sabe que não existem mais casos em que um médico seja obrigado a escolher entre a vida da gestante ou a prática de um aborto provocado, ou também da pressão pela legalização do aborto em casos de estupro, quando esta exceção não existe, ou pela implantação de serviços para oferecê-lo à população, freqüentemente carente de outras medidas sanitárias básicas. As organizações que lutam por estes marcos legais, e mais principalmente aquelas que pesadamente as financiam, não estão preocupadas com as vítimas de estupro, ou com as mães, inexistentes, que morrem pela inexistência da figura do aborto terapêutico. Analogamente ao que ocorre nestes casos, a legalização da experimentação com células tronco embrionárias está para a clonagem reprodutiva assim como a legalização do aborto em caso de estupro está para a completa legalização do aborto, e isto não somente do ponto de vista formal, mas na própria intenção premeditada dos verdadeiros promotores destas práticas.

    A história toda é muito complexa e tem sua origem nos Estados Unidos em 1902, quando o biólogo Charles Davenport de Harvard, adepto do movimento eugenista inglês, solicitou uma bolsa para um projeto eugenista à então nascente Fundação Carnegie, propondo um plano para o “aperfeiçoamento permanente da raça humana”, aceito entusiasticamente pela fundação. A partir daí o movimento eugenista passou a ser financiado por um número crescente de fundações norte-americanas, muitas das quais, incluindo as organizações Rockefeller, são atualmente as financiadoras da implantação mundial do aborto. Toda a trajetória do movimento eugenista nos Estados Unidos encontra-se amplamente documentada na extensa obra de Edwin Black, “War against the Weeks: Eugenics and America´s Campaign to Create a Máster Race”. Há uma tradução paa o português sob o título “A Guerra contra os Fracos” (Editora Girafa, São Paulo, 2003).

    Até 1920 a elite empresarial americana, com exceção da família de banqueiros Morgan, ainda comungava no geral da primitiva visão dos promotores da independência americana segundo a qual os Estados Unidos não deveriam imiscuir-se na política internacional, mas ater-se unicamente ao desenvolvimento da América. Desta posição, que dentre outros era a defendida por Thomas Jefferson, veio a resultar a Doutrina Monroe. Daí também a resistência dos Estados Unidos a entrar na Primeira Guerra Mundial, a recusa do Senado Americano em permitir aos Estados Unidos participarem da Liga das Nações (a antecedente da ONU), não obstante esta ter sido, pelo menos supostamente, idealizada e criada por um presidente americano (Woodrow Wilson) e, como uma contra-iniciativa, a decisão dos banqueiros Morgan em patrocinar em 1921 a fundação do CFR (Conselho de Relações Exteriores) para trabalhar no sentido de reverter este quadro e formar uma vocação internacionalista para o povo americano.

    A equipe formada por Woodrow Wilson ao ver-se impossibilitada de participar em nome do governo americano da organização arquitetada pelo seu presidente, passou a aproximar-se e a trabalhar junto aos demais magnatas do país. Raymond Fosdick, que deveria ter sido o sub-secretário da Liga das Nações se o Senado americano não tivesse se interposto às idéias de Wilson, acabou-se tornando um dos mais famosos presidentes da Fundação Rockefeller. A ele a literatura atribui em grande parte o mérito de haver contribuído para abrir a mente de John Rockefeller II para que as organizações deste milionário se abrissem a um internacionalismo que incluísse, entre outros objetivos, a preocupação com o crescimento demográfico e a necessidade do controle populacional, problemas que haviam sido recentemente recolocados no meio acadêmico e inteiramente reformulados mediante a nova teoria da transição demográfica do cientista social Warren Thompson da Universidade de Colúmbia.



    Emerson Fosdick, na capa de uma edição da Tima de 1925.


    Como conseqüência destes fatos, entre os anos 1920 e 1930 houve um redirecionamento dos destinos dos financiamentos das grandes fundações americanas. Entre outras coisas ficou claro para estas instituições que os métodos da eugenia, embora não os seus objetivos, baseavam-se em um punhado de princípios sem sólida fundamentação científica. Trinta anos mais tarde, Adolf Hitler, aproveitando alguns meses passados na prisão em que leu toda a literatura americana disponível sobre eugenia, adotou para os alemães, e com maior radicalidade, aquele programa que as fundações americanas já haviam considerado ultrapassado. Mas o objetivo de melhoramento da raça humana não foi abandonado pelos americanos. Em vez disso, as fundações, e principalmente, a Fundação Rockefeller, entendeu ser a meta era muito mais difícil do que inicialmente havia sido imaginado e também temporalmente muito mais distante. Passou, em virtude deste entendimento, a investir pesadamente no desenvolvimento de uma nova Biologia Molecular, cujo último fim seria conduzir, em última análise, ao que hoje chamamos de clonagem reprodutiva. Segundo o livro “The Molecular Vision of Life: Caltech, the Rockefeller Foundation, and the Rise of the New Biology”, publicado recentemente em conjunto pelo MIT e pela Universidade de Oxford,

    A motivação por detrás do enorme investimento na nova agenda foi o desenvolvimento das ciências humanas como uma explicação compreensiva e um modelo aplicado de controle social. Dentro desta agenda, a nova biologia foi erigida para explicar rigorosamente e eventualmente controlar os mecanismos fundamentais que governam o comportamento humano, com uma ênfase particularmente forte sobre a hereditariedade. Nos anos 30 a Fundação Rockefeller havia patrocinado um certo número de projetos eugenicamente direcionados. No momento em que se inaugurava a "nova ciência do homem", entretanto, a eugenia dirigida pelos princípios de Charles B. Davenport havia perdido muito de sua força. A busca de uma reprodução humana racionalizada, entretanto, nunca perdeu seu apelo intuitivo. Para os arquitetos e os campeões de uma utopia tecnológica com base científica, a engenharia humana através da reprodução controlada permaneceu uma visão social obrigatória. Um ataque físico químico coordenado aos gens foi iniciado no exato momento histórico em que havia-se tornado inaceitável advogar o controle social baseado nos princípios crus da eugenia e em teorias raciais ultrapassadas. O programa de biologia molecular, através do estudo de sistemas biológicos simples e da análise da estrutura das proteínas, prometia um caminho mais seguro, embora muito mais lento, em direção ao planejamento social baseado em princípios mais seguros do que a seleção eugênica. O tempo raramente desanimava os visionários da Fundação Rockefeller. Wickliffe Rose, chefe do Comitê de Educação Internacional, costumava lembrar aos seus colegas pragmáticos: "Lembrem-se que não estamos com pressa". E mais ainda, Raymond Fosdick, conselheiro e mais tarde presidente da Fundação Rockefeller, reconheceu nos anos 20, no contexto da busca pelo controle social, que "não existe uma caminho real em direção ao milênio, nenhum atalho para a terra prometida". Os funcionários da Fundação Rockefeller e seus conselheiros científicos buscaram desenvolver uma biologia mecanicista como o elemento central de uma nova ciência do homem cujo objetivo é a engenharia social.

    O primeiro resultado obtido deste longo programa, destinado a durar um número indeterminado de muitas gerações, foi a elucidação, trinta anos após o seu início, da estrutura do DNA.

    Segundo a mesma obra,


    “durante os anos 1932-1959 a fundação aplicou aproximadamente U$ 25 milhões no programa de biologia molecular dos Estados Unidos. O patrocínio da Fundação Rockefeller para a biologia molecular alcançou em média em torno de dois por cento de todo o orçamento do governo federal dos Estados Unidos para pesquisa científica e desenvolvimento. A força do programa de Biologia Molecular da fundação, e especialmente o seu efetivo direcionamento por parte de Warren Weaver, foram amplamente reconhecidos e debatidos. O geneticista do Caltech e prêmio Nobel George Wells Beadle notou que durante os doze anos que se seguiram a 1953, o ano da elucidação da estrutura do DNA, o prêmio Nobel foi concedido a 18 acadêmicos por pesquisas na biologia molecular do gene, e todos exceto um foram total ou parcialmente financiados pela Fundação Rockefeller sob a orientação de Weaver”.


    Warren Weaver



    Além do melhoramento qualitativo da população, as fundações passaram a investir também no controle quantitativo. Na primeira metade do século XX este investimento consistiu principalmente no financiamento de centros de estudos demográficos, entre os quais merece destaque a fundação, em 1936, do Office of Population Research na Universidade de Princeton. Através de muitos congressos e trabalhos científicos, uma nova categoria de cientistas sociais, dedicados aos estudos populacionais, começou a chamar a atenção para o problema do controle populacional, que acabou atraindo poderosamente a John Rockefeller III, não sem coincidência o filho do magnata que mais havia contribuído para o financiamento destes estudos, a ponto deste último ter pedido ao pai a permissão para dedicar todo o seu tempo e fortuna para o controle da população mundial, deixando aos seus quatro outros irmãos a preocupação com a administração da fortuna da família. A permissão foi dada e, em 1952, juntamente com 26 outros peritos em demografia, John Rockefeller III fundou o Conselho Populacional que, alguns anos mais tarde, juntamente com a Fundação Rockefeller e a recém fundada Fundação Ford, iriam desencadear a nível internacional o controle populacional por meio da anticoncepção e do aborto.

    A estas três primeiras organizações, das quais o Conselho Populacional funcionou durante muitos anos como o cérebro pensante, foram se somando, posteriormente uma grande quantidade de novas fundações e organizações internacionais. Um detalhe importante deve aqui ser mencionado, conforme mencionado por outra publicação da Universidade de Oxford, “Intended Consequences: Birth Control, Abortion and the Federal Government in Modern America”, de Donald Critchlow, na reunião de fundação do Conselho Populacional houve pelo menos duas tentativas de inserir entre os objetivos do Conselho não apenas a promoção do controle quantitativo da população, mas também o seu melhoramento qualitativo genético. Naquela reunião um cientista da Universidade de Missouri afirmou observar-se “uma rápida deterioração da qualidade da população mundial devido a mutações genéticas”, apoiado por outro que mencionou que a causa estava na própria “sociedade moderna que tende a reduzir a operação da seleção natural”, enquanto outros insistiam que algo deveria ser feito para o melhoramento da “piscina genética”. O próprio organizador do evento e fundador do Conselho Populacional, John Rockefeller III, havia colocado no rascunho do documento de fundação que o Conselho deveria pesquisar os meios pelos quais as pessoas “acima da média em inteligência e outras qualidades pudessem ter famílias mais numerosas do que a média”. Tudo isto que dizia ao aprimoramento genético da humanidade foi porém no fim abandonado por questões políticas, pois temia-se que o novo Conselho surgisse já tachado de nazista, e pudesse dedicar-se exclusivamente à já nada fácil tarefa de estabelecer mundialmente o controle quantitativo da população (ver Donald Critchlow: Intended Consequences: Birth Control, Abortion and the Federal Government in Modern América”, Oxford University Press, New York, 1999, pgs. 22-23).



    (Este artigo é parte do relatório apresentado ao então Ministro do Supremo Tribunal Federal, Carlos Ayres Brito, antes da votação da ADIN 3510 - http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=89621&caixaBusca=N)



    Hermes Rodrigues Nery é coordenador da Comissão Diocesana em Defesa da Vida e do Movimento Legislação e Vida, da Diocese de Taubaté. Especialista em Bioética, é pós-graduado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. E-mail: hrneryprovida@gmail.com





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