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    quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

    Deus lo vult! - [OFF] Eu, com câncer (II): retrospectiva e primeiro ciclo de Quimio








    Posted: 31 Dec 2013 07:14 AM PST


    Antes de mais nada, preciso dizer que tenho uma dívida de justiça e de caridade para com todas as pessoas que, nos últimos dias, me enviaram mensagens de ânimo e me asseguraram as suas tão valiosas orações. Foram emails e comentários no blog, mensagens de Facebook e de celular, telefonemas e visitas, tantas coisas, tantas, que estou certíssimo de que, no tocante à generosidade dos que me estimam, eu estou muitíssimo mais bem servido do que mereço. Obrigado, do fundo do coração, a todos e a cada um de vocês. Tenham a certeza de que uma parte dos incômodos dessa etapa da minha vida está e continuará sendo oferecida em retribuição aos que tão generosamente correram em meu favor assim que souberam dos meus infortúnios. Que o Bom Deus, que é rico em misericórdia, possa recompensar-lhes esta (tão grande!) caridade com toda a munificência da qual só Ele é capaz.

    Alguém me pediu para que fizesse uma pequena retrospectiva do que me levou ao diagnóstico da doença. Quando cheguei na emergência do hospital, no último dia 14 de dezembro, eu tinha quatro sintomas mas somente uma queixa: dificuldade respiratória, acúmulo de líquido abdominal (ascite), perda de peso e aumento dos gânglios linfáticos (perceptíveis na região das axilas, virilhas, etc.).

    A minha única queixa era a dificuldade respiratória. Todos os outros “sintomas” me pareciam explicáveis: eu estava já há alguns meses fazendo exercícios diários e intensivos para perda de peso, nunca tive barriga de tanquinho (e sempre ouvira dizer que gordura abdominal (a minha, praticamente congênita) era a mais complicada de se perder mesmo) e os gânglios, inchados mas completamente indolores, até que eram perceptíveis se procurados, mas nunca me passou pela cabeça esquadrinhar meu corpo à caça deles. Quando o médico começa a anamnese você passa a responder “sim, sim, é mesmo”; antes disso, você simplesmente não imagina. Como já disseram com muita propriedade, câncer é doença “dos outros”. E temos a irritante mania de não nos darmos conta de que, para os outros, “os outros” somos nós.

    Uma coisa puxou a outra e o resto da história vocês já sabem: a dispnéia era causada por um derrame pleural bilateral, os derrames concomitantes em diversas partes do corpo (dois lados da pleura, cavidade abdominal, etc.) apontavam para um problema sistêmico, os gânglios hipertrofiados faziam suspeitar de linfoma e a biópsia o confirmou. Depois foi mais uma semana para análise do tipo específico do câncer e, só então, o tratamento pôde ser definido e iniciado. Problemas burocráticos impediram a quimioterapia de iniciar no sábado (como eu disse que seria), então a iniciei no dia seguinte, 29 de dezembro, Domingo, festa da Sagrada Família e meu aniversário de 15 meses de casamento.


    É desagradável, mas suportável. Até eu, “mole como um prato de papa” como já me defini a respeito de procedimentos médicos, munido com as orações dos amigos pelas quais já agradeci acima, pude atravessá-la com relativa tranquilidade. Um pouco febril, assomado por ondas violentas de náuseas, tontura permanente, dor de cabeça constante, uma crise de calafrios: é o que lembro daquelas horas de domingo. Passaram. Se aquele coquetel de drogas fizer pelo menos tanto mal à doença quanto parece fazer ao resto do corpo são, creio que ela está sendo muito bem combatida. E o melhor de tudo é o fantástico efeito do dia seguinte, em tudo análogo àquela anedótica sensação de ter ampliado o espaço doméstico após se livrar da vaca que se passou uma semana criando na sala do apartamento: diante das lembranças das horas da QT, na segunda eu me sentia a pessoa mais bem-disposta do mundo.

    Hoje escrevo já de casa, pela primeira vez em casa desde o dia 14 de dezembro. Faz muito tempo, e é interessante como isso nos ensina a valorizar as coisas simples da vida: respirar ar puro depois de semanas de ar condicionado e sentir um pouco de sol no rosto após quinze dias apenas o vislumbrando pelas persianas das janelas, por exemplo. É tudo clichê, eu sei, mas parece que a gente não consegue introjetar direito enquanto esse tipo de coisa não acontece com a gente.

    Neste último dia de ano, tenho muito a agradecer. Por estranho que talvez pareça a alguns, agradecer inclusive (e talvez até principalmente) por estas cruzes que me foram enviadas, pelas enfermidades e por todos os atropelos dos últimos dias. É nos sofrimentos que nos sentimos mais amados por Deus, quando nos percebemos com uma capacidade de enfrentá-los que nos é estranha e não pode vir de nós: quando ao (perdão, Senhor!) desespero do primeiro contato com o diagnóstico segue-se, sem razão aparente, a serenidade para os necessários duros passos seguintes. É óbvio que ninguém gosta de sofrimentos; mas o que peço a Deus, antes de que simplesmente me livre deles, é que me conceda o valor de enfrentá-los de pé, de fronte erguida, com galhardia, pela glória d’Ele. É esta a oração cristã, é esta a minha oração, é nisto que peço a Deus que tenha a misericórdia de me sustentar daqui em diante.

    As doenças graves têm o salutar efeito de aproximar as pessoas. Falei nos últimos dias com pessoas queridas com as quais há muito tempo não falava; parece que precisamos nos deparar com a consciência da fragilidade da vida para nos libertarmos da síndrome do “Sinal Fechado”. Sou muito grato por isso também.

    Por fim, agradeço por estar onde estou agora: com um diagnóstico que, embora desagradável, está longe de ser o pior possível, e com o tratamento já iniciado – ONLY FIVE MORE TO GO! – ainda no final deste ano. Cuidar mais da própria saúde deixou de ser uma utópica resolução de ano novo para se transformar já em ação concreta antes mesmo do Reveillon. O câncer perdeu a sua oportunidade de livre proliferação e, agora, já está sendo combatido. O pior já passou: agora, o caminho pode até ser árduo, mas é para cima.

    E é para lá que vamos.





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    Jesus, oculto na Hóstia, é tudo para mim




    “Se não fosse a Santa Comunhão, eu estaria caindo continuamente. A única coisa que me sustenta é a Santa Comunhão. Dela tiro forças, nela está o meu vigor. Tenho medo da vida, nos dias em que não recebo a Santa Comunhão. Tenho medo de mim mesma. Jesus, oculto na Hóstia, é tudo para mim. Do Sacrário tiro força, vigor, coragem e luz. Aí busco alívio nos momentos de aflição. Eu não saberia dar glória a Deus, se não tivesse a Eucaristia no meu coração.”



    (Diário de Santa Faustina, n. 1037)

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