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    quarta-feira, 18 de julho de 2012

    Prioridade da vida interior sobre a vida ativa




    Grupo São Domingos de Gusmão

    Prioridade da vida interior sobre a vida ativa

    Em Deus está a vida, toda a vida, Ele é a própria vida. Ora, não é nas obras exteriores, como a Criação, que o Ser infinito manifesta essa vida do modo mais intenso, mas sim no que a teologia chama de operações ad intra: essa atividade inefável cujo termo é a geração perpétua do Filho e a incessante processão do Espírito Santo. Essa é, por excelência, a sua obra essencial, eterna.

    A vida terrena de Nosso Senhor Jesus Cristo foi a realização perfeita do plano divino. Trinta anos de recolhimento, seguidos de quarenta dias de retiro e penitência, prepararam a sua curta carreira evangélica; e, durante as suas jornadas apostólicas, quantas vezes ainda, O vemos retirar-se para as montanhas ou para os desertos, a fim de orar: “Ele retirava-Se para lugares solitários e entregava-Se aí à oração” (Lc 6, 12). Rasgo ainda mais significativo: Marta deseja que o Senhor, condenado a suposta ociosidade de sua irmã, proclame a superioridade da vida ativa; a resposta de Jesus: “Maria escolheu a melhor parte” (Lc 10, 42), consagra a importância da vida interior. Jesus quis, pois, fazer-nos ver, claramente, a preponderância da vida de oração sobre a vida ativa.

    Os apóstolos, fiéis aos exemplos do Mestre, reservaram para si o ofício da oração e o ministério da palavra, deixando as ocupações mais exteriores aos diáconos: “Quanto a nós, entregar-nos-emos, assiduamente, à oração e ao exercício da palavra” (Act 6,4).

    Os Papas, os santos doutores e os teólogos afirmam, por sua vez, que a vida interior é superior à vida ativa.

    Há alguns anos, uma mulher, de grande virtude e caráter – superiora geral de uma das mais importantes congregações de Aveyron – foi convidada pelos superiores eclesiásticos a favorecer a secularização das suas religiosas.

    Deveria sacrificar as obras à vida religiosa, ou abandonar esta para conservar aquelas? Perplexa, querendo conhecer a vontade de Deus, partiu, secretamente, para Roma, obteve uma audiência de Leão XIII, expôs-lhe as suas dúvidas e a pressão que sofrera a favor das obras.

    Após alguns instantes de recolhimento, o Pontífice deu-lhe esta peremptória: “A conservação na vida religiosa das suas filhas, que tiverem o espírito do seu santo estado e o amor à vida de oração, é preferível a qualquer obra. Se não conseguir conservá-las nesse espírito e nessa vida, Deus suscitará em França outras vocações. A sua vida interior, orações e sacrifícios, serão mais úteis à França se continuarem como verdadeiras religiosas, do que se forem privadas dos tesouros da sua congregação a Deus”.

    Numa carta dirigida a um importante instituto exclusivamente dedicado ao ensino, São Pio X manifestou o seu pensamento com as palavras seguintes:

    “Chegou ao Nosso conhecimento que começa a difundir-se uma opinião, segundo a qual vós deveríeis considerar como prioritária a educação das crianças e, apenas em segundo lugar, a vossa profissão religiosa: que assim o exigiriam o espírito e as necessidades dos tempos. De foram alguma queremos que tal opinião encontre o mínimo crédito, seja da vossa parte, seja da parte dos demais institutos religiosos dedicados à educação, como o vosso. Fique, portanto, bem assente, pelo que vos toca, que a vida religiosa é muitíssimo superior à vida comum e que, se estais gravemente obrigados ao dever de ensinar o próximo, muito mais graves são as obrigações que vos vinculam a Deus”.

    Não é, porventura, a aquisição da vida interior o fim principal da vida religiosa?

    “A vida contemplativa – diz o Doutor Angélico – é melhor que a vida ativa, e preferível a ela”.

    S. Boaventura acumula os superlativos, para mostrar a excelência desta vida interior: “Vida mais sublime, mais segura, mais rica, mais suave, mais estável”.

    “Vida mais sublime”. A vida ativa ocupa-se dos homens, a vida contemplativa faz-nos entrar no domínio das mais altas verdades, sem desviar os olhos do próprio princípio da vida. Principium quod Deus est quaeritur. Os seus horizontes são sublimes e o seu campo de ação incomparavelmente amplo: “Marta, num só lugar, entregava-se a vários trabalhos físicos. Maria, pela caridade, trabalha em muitos lugares e em numerosas obras. Contemplando e amando a Deus, tudo vê, tudo compreende e abarca. Pode, pois, dizer-se que, em comparação com Maria, Marta tem poucas inquietações”.[1]

    “Vida mais segura”. Há menos perigos nesta vida. Na vida ativa, a alma agita-se, torna-se febril, dispersa as suas energias e debilita-se. “Marta, Marta, andas inquieta – disse o Senhor - e perturbada com muitas coisas; mas uma só é necessária” (Lc 10, 41-42). Há, pois, aqui um tríplice defeito: “andas inquieta”: são as inquietações do pensamento; “perturbada”: são as perturbações provenientes das afeições; enfim, “com muitas coisas”: são as múltiplas ocupações, que originam a divisão de esforços. Ao invés, uma só causa se impõe para constituir a vida interior: a união com Deus. O resto só pode ser secundário, e só se justifica se fortalecer tal união.

    “Vida mais rica”. Com a contemplação, alcançam-se todos os bens: “Com ela me vieram todos os bens” (Sab 7, 2). É a parte excelente: “Ela escolheu a melhor parte, que lhe não será tirada” (Lc 10,42). Recolhe mais méritos. Por quê? Porque fortifica a vontade e aumenta a graça santificante, levando a alma a operar por um princípio de caridade.

    “Vida mais suave”. A alma verdadeiramente interior abandona-se à vontade de Deus, aceita, com inalterável paciência. Tanto as coisas agradáveis como as penosas, e chega a mostrar-se alegre no meio das aflições, feliz por carregar a sua cruz.

    “Vida mais estável”. Por mais intensa que seja, a vida ativa tem o seu termo neste mundo: pregações, ensinamentos, trabalhos, tudo isso cessa no limiar da eternidade. Mas a vida interior não conhece ocaso. Por meio dela, a passagem por este mundo é uma contínua ascensão para a luz, ascensão que, após a morte, se torna, incomparavelmente, mais rutilante e mais rápida.

    Para resumir as excelências da vida interior, podem-se lhe aplicar estas palavras de S. Bernardo: “Nela, o homem vive com mais pureza, cai mais raramente, levanta-se mais depressa, anda com mais cautela, é consolado pelo Céu com mais frequência, descansa com amis segurança, morre com mais confiança, é purificado mais depressa, e é premiado com mais abundância”.[2]

    [1] Ricardo de S. Victor, in Cant., 8.
    [2] São Bernardo, Hom. Simile est... bom. neg.

    Fonte: A alma de todo o apostolado – J. B. Chautard.

    http://sanctidominici.blogspot.com.br/2012/07/prioridade-da-vida-interior-sobre-vida.html
    Postado por Letícia Silva às 17:14
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    Marcadores: Espiritualidade
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