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    sábado, 6 de julho de 2013

    [*Exsurge Domini*] Resumo 3208

    Mensagens neste resumo (3 Mensagens)

    Mensagens

    1.

    CARTA ENCÍCLICA LUMEN FIDEI - NA ÍNTEGRA

    Enviado por: "Jordan Perdigao" jordanperdigao@yahoo.com.br   jordanperdigao

    Sex, 5 de Jul de 2013 11:09 am










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    CARTA
    ENCÍCLICA

    LUMEN
    FIDEI


    DO SUMO
    PONTÍFICE

    FRANCISCO

    AOS BISPOS

    AOS
    PRESBÍTEROS E AOS DIÁCONOS

    ÀS PESSOAS
    CONSAGRADAS

    E A TODOS
    OS FIÉIS LEIGOS

    SOBRE A FÉ
      
    1. A luz da fé é a
    expressão com que a
    tradição da Igreja
    designou o grande dom
    trazido por Jesus. Eis
    como Ele Se nos
    apresenta, no Evangelho
    de João: « Eu vim ao
    mundo como luz, para que
    todo o que crê em Mim
    não fique nas trevas » (Jo
    12, 46). E São Paulo
    exprime-se nestes
    termos: « Porque o Deus
    que disse: "das trevas
    brilhe a luz", foi quem
    brilhou nos nossos
    corações » (2 Cor
    4, 6). No mundo pagão,
    com fome de luz,
    tinha-se desenvolvido o
    culto do deus Sol,
    Sol invictus,
    invocado na sua aurora.
    Embora o sol renascesse
    cada dia, facilmente se
    percebia que era incapaz
    de irradiar a sua luz
    sobre toda a existência
    do homem. De facto, o
    sol não ilumina toda a
    realidade, sendo os seus
    raios incapazes de
    chegar até às sombras da
    morte, onde a vista
    humana se fecha para a
    sua luz. Aliás « nunca
    se viu ninguém â€" afirma
    o mártir São Justino â€"
    pronto a morrer pela sua
    fé no sol ».[1]
    Conscientes do amplo
    horizonte que a fé lhes
    abria, os cristãos
    chamaram a Cristo o
    verdadeiro Sol, « cujos
    raios dão a vida ».[2] A
    Marta, em lágrimas pela
    morte do irmão Lázaro,
    Jesus diz-lhe: « Eu não
    te disse que, se
    acreditares, verás a
    glória de Deus? » (Jo
    11, 40). Quem
    acredita, vê;
    vê com uma luz que
    ilumina todo o percurso da
    estrada, porque nos vem de
    Cristo ressuscitado, estrela
    da manhã que não tem ocaso.



    Uma luz
    ilusória?

    2.
    E contudo podemos
    ouvir a objecção que se
    levanta de muitos dos
    nossos contemporâneos,
    quando se lhes fala
    desta luz da fé. Nos
    tempos modernos,
    pensou-se que tal luz
    poderia ter sido
    suficiente para as
    sociedades antigas, mas
    não servia para os novos
    tempos, para o homem
    tornado adulto,
    orgulhoso da sua razão,
    desejoso de explorar de
    forma nova o futuro.
    Nesta perspectiva, a fé
    aparecia como uma luz
    ilusória, que impedia o
    homem de cultivar a
    ousadia do saber. O
    jovem Nietzsche
    convidava a irmã
    Elisabeth a arriscar,
    percorrendo vias novas
    (…), na incerteza de
    proceder de forma
    autónoma ». E
    acrescentava: « Neste
    ponto, separam-se os
    caminhos da humanidade:
    se queres alcançar a paz
    da alma e a felicidade,
    contenta-te com a fé;
    mas, se queres ser uma
    discípula da verdade,
    então investiga ».[3] O
    crer opor-se-ia ao
    indagar. Partindo daqui,
    Nietzsche desenvolverá a
    sua crítica ao
    cristianismo por ter
    diminuído o alcance da
    existência humana,
    espoliando a vida de
    novidade e aventura.
    Neste caso, a fé seria
    uma espécie de ilusão de
    luz, que impede o nosso
    caminho de homens livres
    rumo ao amanhã.
    3.
    Por este caminho, a
    fé acabou por ser
    associada com a
    escuridão. E, a fim de
    conviver com a luz da
    razão, pensou-se na
    possibilidade de a
    conservar, de lhe
    encontrar um espaço: o
    espaço para a fé
    abria-se onde a razão
    não podia iluminar, onde
    o homem já não podia ter
    certezas. Deste modo, a
    fé foi entendida como um
    salto no vazio, que
    fazemos por falta de luz
    e impelidos por um
    sentimento cego, ou como
    uma luz subjectiva,
    talvez capaz de aquecer
    o coração e consolar
    pessoalmente, mas
    impossível de ser
    proposta aos outros como
    luz objectiva e comum
    para iluminar o caminho.
    Entretanto, pouco a
    pouco, foi-se vendo que
    a luz da razão autónoma
    não consegue iluminar
    suficientemente o
    futuro; este, no fim de
    contas, permanece na sua
    obscuridade e deixa o
    homem no temor do
    desconhecido. E, assim,
    o homem renunciou à
    busca de uma luz grande,
    de uma verdade grande,
    para se contentar com
    pequenas luzes que
    iluminam por breves
    instantes, mas são
    incapazes de desvendar a
    estrada. Quando falta a
    luz, tudo se torna
    confuso: é impossível
    distinguir o bem do mal,
    diferenciar a estrada
    que conduz à meta
    daquela que nos faz
    girar repetidamente em
    círculo, sem direcção.




    Uma luz a
    redescobrir

    4.
    Por isso, urge
    recuperar o carácter de
    luz que é próprio da fé,
    pois, quando a sua chama
    se apaga, todas as
    outras luzes acabam
    também por perder o seu
    vigor. De facto, a luz
    da fé possui um carácter singular,
    sendo capaz de iluminar toda
    a existência do homem. Ora,
    para que uma luz seja tão
    poderosa, não pode dimanar
    de nós mesmos; tem de vir de
    uma fonte mais originária,
    deve porvir em última
    análise de Deus. A fé nasce
    no encontro com o Deus vivo,
    que nos chama e revela o seu
    amor: um amor que nos
    precede e sobre o qual
    podemos apoiar-nos para
    construir solidamente a
    vida. Transformados por este
    amor, recebemos olhos novos
    e experimentamos que há nele
    uma grande promessa de
    plenitude e se nos abre a
    visão do futuro. A fé, que
    recebemos de Deus como dom
    sobrenatural, aparece-nos
    como luz para a estrada
    orientando os nossos passos
    no tempo. Por um lado,
    provém do passado: é a luz
    duma memória basilar â€" a da
    vida de Jesus â€", onde o seu
    amor se manifestou
    plenamente fiável, capaz de
    vencer a morte. Mas, por
    outro lado e ao mesmo tempo,
    dado que Cristo ressuscitou
    e nos atrai de além da
    morte, a fé é luz que vem do
    futuro, que descerra diante
    de nós horizontes grandes e
    nos leva a ultrapassar o
    nosso « eu » isolado
    abrindo-o à amplitude da
    comunhão. Deste modo,
    compreendemos que a fé não
    mora na escuridão, mas é uma
    luz para as nossas trevas.
    Dante, na Divina Comédia,
    depois de ter confessado
    diante de São Pedro a sua
    fé, descreve-a como uma «
    centelha / que se expande
    depois em viva chama / e,
    como estrela no céu, em mim
    cintila ». [4] É
    precisamente desta luz da fé que quero
    falar, desejando que cresça
    a fim de iluminar o presente
    até se tornar estrela
    que mostra os horizontes do
    nosso caminho, num tempo em
    que o homem vive
    particularmente carecido de
    luz.

    5.
    Antes da sua paixão,
    o Senhor assegurava a
    Pedro: « Eu roguei por
    ti, para que a tua fé
    não desfaleça » (Lc
    22, 32). Depois
    pediu-lhe para «
    confirmar os irmãos » na
    mesma fé. Consciente da
    tarefa confiada ao
    Sucessor de Pedro,
    Bento XVI quis
    proclamar este

    Ano da Fé, um
    tempo de graça que nos
    tem ajudado a sentir a
    grande alegria de crer,
    a reavivar a percepção
    da amplitude de
    horizontes que a fé
    descerra, para a
    confessar na sua unidade
    e integridade, fiéis à
    memória do Senhor,
    sustentados pela sua
    presença e pela acção do
    Espírito Santo. A
    convicção duma fé que
    faz grande e plena a
    vida, centrada em Cristo
    e na força da sua graça,
    animava a missão dos
    primeiros cristãos. Nas
    Actas dos Mártires,
    lemos este diálogo entre
    o prefeito romano
    Rústico e o cristão
    Hierax: « Onde estão os
    teus pais? » â€"
    perguntava o juiz ao
    mártir; este respondeu:
    « O nosso verdadeiro pai
    é Cristo, e nossa mãe a
    fé n’Ele ».[5] Para
    aqueles cristãos, a fé,
    enquanto encontro com o
    Deus vivo que Se
    manifestou em Cristo,
    era uma « mãe », porque
    os fazia vir à luz,
    gerava neles a vida
    divina, uma nova
    experiência, uma visão luminosa da existência,
    pela qual estavam prontos a
    dar testemunho público até
    ao fim.
    6.
    O

    Ano da Fé teve início no
    cinquentenário da
    abertura do Concílio
    Vaticano II. Esta
    coincidência permite-nos
    ver que o mesmo foi um
    Concílio sobre a fé,[6]
    por nos ter convidado a
    repor, no centro da
    nossa vida eclesial e
    pessoal, o primado de
    Deus em Cristo. Na
    verdade, a Igreja nunca
    dá por descontada a fé,
    pois sabe que este dom
    de Deus deve ser nutrido
    e revigorado sem cessar
    para continuar a
    orientar o caminho dela.
    O Concílio Vaticano II
    fez brilhar a fé no
    âmbito da experiência
    humana, percorrendo
    assim os caminhos do
    homem contemporâneo.
    Desta forma, se viu como
    a fé enriquece a
    existência humana em
    todas as suas dimensões.

    7. Estas considerações
    sobre a fé â€" em
    continuidade com tudo o
    que o magistério da
    Igreja pronunciou acerca
    desta virtude teologal [7]
    â€" pretendem juntar-se a
    tudo aquilo que
    Bento XVI escreveu nas cartas
    encíclicas sobre a
    caridade
    e a
    esperança. Ele já tinha
    quase concluído um primeiro
    esboço desta carta encíclica
    sobre a fé. Estou-lhe
    profundamente agradecido e,
    na fraternidade de Cristo,
    assumo o seu precioso
    trabalho, limitando-me a
    acrescentar ao texto
    qualquer nova contribuição.
    De facto, o Sucessor de
    Pedro, ontem, hoje e amanhã,
    sempre está chamado a «
    confirmar os irmãos » no
    tesouro incomensurável da fé
    que Deus dá a cada homem
    como luz para o seu caminho.


    Na fé, dom de Deus e
    virtude sobrenatural por Ele
    infundida, reconhecemos que
    um grande Amor nos foi
    oferecido, que uma Palavra
    estupenda nos foi dirigida:
    acolhendo esta Palavra que é
    Jesus Cristo â€" Palavra
    encarnada â€", o Espírito
    Santo transforma-nos,
    ilumina o caminho do futuro
    e faz crescer em nós as asas
    da esperança para o
    percorrermos com alegria.
    Fé, esperança e caridade
    constituem, numa
    interligação admirável, o
    dinamismo da vida cristã
    rumo à plena comunhão com
    Deus. Mas, como é este
    caminho que a fé desvenda
    diante de nós? Donde provém
    a sua luz, tão poderosa que
    permite iluminar o caminho
    duma vida bem sucedida e
    fecunda, cheia de fruto?
     

    CAPÍTULO
    I


    ACREDITÁMOS NO AMOR

    (cf.
    1 Jo 4, 16)


    Abraão,
    nosso pai na fé



    8.
    A fé desvenda-nos o
    caminho e acompanha os
    nossos passos na
    história. Por isso, se
    quisermos compreender o
    que é a fé, temos de
    explanar o seu percurso,
    o caminho dos homens
    crentes, com os
    primeiros testemunhos já
    no Antigo Testamento. Um
    posto singular ocupa
    Abraão, nosso pai na fé.
    Na sua vida, acontece um
    facto impressionante:
    Deus dirige-lhe a
    Palavra, revela-Se
    como um Deus que fala e
    o chama por nome. A fé
    está ligada à escuta.
    Abraão não vê Deus, mas
    ouve a sua voz. Deste
    modo, a fé assume um
    carácter pessoal: o
    Senhor não é o Deus de
    um lugar, nem mesmo o
    Deus vinculado a um
    tempo sagrado
    específico, mas o Deus
    de uma pessoa,
    concretamente o Deus de
    Abraão, Isaac e Jacob,
    capaz de entrar em
    contacto com o homem e
    estabelecer com ele uma
    aliança. A fé é a
    resposta a uma Palavra
    que interpela
    pessoalmente, a um Tu
    que nos chama por nome.


    9. Esta Palavra
    comunica a Abraão uma
    chamada e uma promessa.
    Contém, antes de tudo, uma chamada a sair da
    própria terra, convite a
    abrir-se a uma vida nova,
    início de um êxodo que o
    encaminha para um futuro
    inesperado. A perspectiva,
    que a fé vai proporcionar a
    Abraão, estará sempre ligada
    com este passo em frente que
    ele deve realizar: a fé « vê
    » na medida em que caminha,
    em que entra no espaço
    aberto pela Palavra de Deus.
    Mas tal Palavra contém ainda
    uma promessa: a tua
    descendência será numerosa,
    serás pai de um grande povo
    (cf. Gn 13, 16; 15,
    5; 22, 17). É verdade que a
    fé de Abraão, enquanto
    resposta a uma Palavra que a
    precede, será sempre um acto
    de memória; contudo esta
    memória não o fixa no
    passado, porque, sendo
    memória de uma promessa, se
    torna capaz de abrir ao
    futuro, de iluminar os
    passos ao longo do caminho.
    Assim se vê como a fé,
    enquanto memória do futuro,
    está intimamente ligada com
    a esperança.
    10. A Abraão pede-se para
    se confiar a esta Palavra. A
    fé compreende que a palavra
    â€" uma realidade
    aparentemente efémera e
    passageira â€", quando é
    pronunciada pelo Deus fiel,
    torna-se no que de mais
    seguro e inabalável possa
    haver, possibilitando a
    continuidade do nosso
    caminho no tempo. A fé
    acolhe esta Palavra como
    rocha segura, sobre a qual
    se pode construir com
    alicerces firmes. Por isso,
    na Bíblia hebraica, a fé é
    indicada pela palavra
    ‘emûnah, que deriva do
    verbo ‘amàn, cuja
    raiz significa « sustentar
    ». O termo ‘emûnah
    tanto pode significar a
    fidelidade de Deus como a fé
    do homem. O homem fiel recebe a sua força do
    confiar-se nas mãos do Deus
    fiel. Jogando com dois
    significados da palavra â€"
    presentes tanto no
    termo grego pistós
    como no correspondente
    latino fidelis â€", São
    Cirilo de Jerusalém exaltará
    a dignidade do cristão, que
    recebe o mesmo nome de Deus:
    ambos são chamados « fiéis
    ».[8] E Santo Agostinho
    explica-o assim: « O homem
    fiel é aquele que crê no
    Deus que promete; o Deus
    fiel é aquele que concede o
    que prometeu ao homem ».[9]

    11. Há ainda um aspecto
    da história de Abraão que é
    importante para se
    compreender a sua fé. A
    Palavra de Deus, embora
    traga consigo novidade e
    surpresa, não é de forma
    alguma alheia à experiência
    do Patriarca. Na voz que se
    lhe dirige, Abraão reconhece
    um apelo profundo, desde
    sempre inscrito no mais
    íntimo do seu ser. Deus
    associa a sua promessa com
    aquele « ponto » onde
    desde sempre a existência do
    homem se mostra promissora,
    ou seja, a paternidade, a
    geração duma nova vida: «
    Sara, tua mulher, dar-te-á
    um filho, a quem hás-de
    chamar Isaac » (Gn
    17, 19). O mesmo Deus que
    pede a Abraão para se
    confiar totalmente a Ele,
    revela-Se como a fonte donde
    provém toda a vida. Desta
    forma, a fé une-se com a
    Paternidade de Deus, da qual
    brota a criação: o Deus que
    chama Abraão é o Deus
    criador, aquele que « chama
    à existência o que não
    existe » (Rm 4, 17),
    aquele que, « antes da fundação do mundo, (...) nos
    predestinou para sermos
    adoptados como seus filhos »
    (Ef 1, 4-5).
    No caso de Abraão, a fé em
    Deus ilumina as raízes mais
    profundas do seu ser:
    permite-lhe reconhecer a
    fonte de bondade que está na
    origem de todas as coisas, e
    confirmar que a sua vida não
    deriva do nada nem do acaso,
    mas de uma chamada e um amor
    pessoais. O Deus misterioso
    que o chamou não é um Deus
    estranho, mas a origem de
    tudo e que tudo sustenta. A
    grande prova da fé de
    Abraão, o sacrifício do
    filho Isaac, manifestará até
    que ponto este amor
    originador é capaz de
    garantir a vida mesmo para
    além da morte. A Palavra que
    foi capaz de suscitar um
    filho no seu corpo « já sem
    vida (…), como sem vida
    estava o seio » de Sara
    estéril (Rm 4, 19),
    também será capaz de
    garantir a promessa de um
    futuro para além de qualquer
    ameaça ou perigo (cf. Heb
    11, 19; Rm 4,
    21).


    A fé de
    Israel

    12.
    A história do povo
    de Israel, no livro do
    Êxodo, continua na
    esteira da fé de Abraão.
    De novo, a fé nasce de
    um dom originador:
    Israel abre-se à acção
    de Deus, que quer
    libertá-lo da sua
    miséria. A fé é chamada
    a um longo caminho, para
    poder adorar o Senhor no
    Sinai e herdar uma terra
    prometida. O amor divino
    possui os traços de um
    pai que conduz seu filho
    pelo caminho (cf. Dt
    1, 31). A confissão
    de fé de Israel
    desenrola-se como uma
    narração dos benefícios
    de Deus, da sua acção
    para libertar e conduzir
    o povo (cf.
    Dt 26, 5-11);
    narração esta, que o povo
    transmite de geração em
    geração. A luz de Deus
    brilha para Israel, através
    da comemoração dos factos
    realizados pelo Senhor,
    recordados e confessados no
    culto, transmitidos pelos
    pais aos filhos. Deste modo
    aprendemos que a luz trazida
    pela fé está ligada com a
    narração concreta da vida,
    com a grata lembrança dos
    benefícios de Deus e com o
    progressivo cumprimento das
    suas promessas. A
    arquitectura gótica
    exprimiu-o muito bem: nas
    grandes catedrais, a luz
    chega do céu através dos
    vitrais onde está
    representada a história
    sagrada. A luz de Deus
    vem-nos através da narração
    da sua revelação e, assim, é
    capaz de iluminar o nosso
    caminho no tempo, recordando
    os benefícios divinos e
    mostrando como se cumprem as
    suas promessas.

    13. A história de Israel
    mostra-nos ainda a tentação
    da incredulidade, em que o
    povo caiu várias vezes.
    Aparece aqui o contrário da
    fé: a idolatria. Enquanto
    Moisés fala com Deus no
    Sinai, o povo não suporta o
    mistério do rosto divino
    escondido, não suporta o
    tempo de espera. Por sua
    natureza, a fé pede para se
    renunciar à posse imediata
    que a visão parece oferecer;
    é um convite para se abrir à
    fonte da luz, respeitando o
    mistério próprio de um Rosto
    que pretende revelar-se de
    forma pessoal e no momento
    oportuno. Martin Buber
    citava esta definição da
    idolatria, dada pelo rabino
    de Kock: há idolatria, «
    quando um rosto se dirige
    reverente a um rosto que não
    é rosto ».[10] Em vez
    da fé em Deus, prefere-se
    adorar o ídolo, cujo rosto
    se pode fixar e cuja origem
    é conhecida, porque foi
    feito por nós. Diante do
    ídolo, não se corre o risco
    de uma possível chamada que
    nos faça sair das próprias
    seguranças, porque os ídolos
    « têm boca, mas não falam »
    (Sal 115, 5).
    Compreende-se assim que o
    ídolo é um pretexto para se
    colocar a si mesmo no centro
    da realidade, na adoração da
    obra das próprias mãos.
    Perdida a orientação
    fundamental que dá unidade à
    sua existência, o homem
    dispersa-se na
    multiplicidade dos seus
    desejos; negando-se a
    esperar o tempo da promessa,
    desintegra-se nos mil
    instantes da sua história.
    Por isso, a idolatria é
    sempre politeísmo, movimento
    sem meta de um senhor para
    outro. A idolatria não
    oferece um caminho, mas uma
    multiplicidade de veredas
    que não conduzem a uma meta
    certa, antes se configuram
    como um labirinto. Quem não
    quer confiar-se a Deus, deve
    ouvir as vozes dos muitos
    ídolos que lhe gritam: «
    Confia-te a mim! » A fé,
    enquanto ligada à conversão,
    é o contrário da idolatria:
    é separação dos ídolos para
    voltar ao Deus vivo, através
    de um encontro pessoal.
    Acreditar significa
    confiar-se a um amor
    misericordioso que sempre
    acolhe e perdoa, que
    sustenta e guia a
    existência, que se mostra
    poderoso na sua capacidade
    de endireitar os desvios da
    nossa história. A fé
    consiste na disponibilidade
    a deixar-se incessantemente transformar
    pela chamada de Deus.
    Paradoxalmente, neste
    voltar-se continuamente para
    o Senhor, o homem encontra
    uma estrada segura que o
    liberta do movimento
    dispersivo a que o sujeitam
    os ídolos. 14.
    Na fé de Israel,
    sobressai também a
    figura de Moisés, o
    mediador. O povo não
    pode ver o rosto de
    Deus; é Moisés que fala
    com Jahvé na montanha e
    comunica a todos a
    vontade do Senhor. Com
    esta presença do
    mediador, Israel
    aprendeu a caminhar
    unido. O acto de fé do
    indivíduo insere-se numa
    comunidade, no « nós »
    comum do povo, que, na
    fé, é como um só homem:
    « o meu filho
    primogénito », assim
    Deus designará todo o
    Israel (cf. Ex 4,
    22). Aqui a mediação não
    se torna um obstáculo,
    mas uma abertura: no
    encontro com os outros,
    o olhar abre-se para uma
    verdade maior que nós
    mesmos. Jean Jacques
    Rousseau lamentava-se
    por não poder ver Deus
    pessoalmente: « Quantos
    homens entre mim e Deus!
    » [11] « Será assim tão
    simples e natural que
    Deus tenha ido ter com
    Moisés para falar a Jean
    Jacques Rousseau? »[12] A
    partir de uma concepção
    individualista e
    limitada do conhecimento
    é impossível compreender
    o sentido da mediação:
    esta capacidade de
    participar na visão do
    outro, saber
    compartilhado que é o
    conhecimento próprio do
    amor. A fé é um dom
    gratuito de Deus, que
    exige a humildade e a
    coragem de fiar-se e entregar-se
    para ver o caminho luminoso
    do encontro entre Deus e os
    homens, a história da
    salvação.


    A
    plenitude da fé cristã

    15.
    « Abraão (...)
    exultou pensando em ver
    o meu dia; viu-o e ficou
    feliz » (Jo 8,
    56). De acordo com estas
    palavras de Jesus, a fé
    de Abraão estava
    orientada para Ele, de
    certo modo era visão
    antecipada do seu
    mistério. Assim o
    entende Santo Agostinho,
    quando afirma que os
    Patriarcas se salvaram
    pela fé; não fé em
    Cristo já chegado, mas
    fé em Cristo que havia
    de vir, fé proclive para
    o evento futuro de
    Jesus.[13] A fé cristã
    está centrada em Cristo;
    é confissão de que Jesus
    é o Senhor e que Deus O
    ressuscitou de entre os
    mortos (cf. Rm
    10, 9). Todas as linhas
    do Antigo Testamento se
    concentram em Cristo:
    Ele torna-Se o « sim »
    definitivo a todas as
    promessas, fundamento
    último do nosso « Amen »
    a Deus (cf. 2 Cor
    1, 20). A história de
    Jesus é a manifestação
    plena da fiabilidade de
    Deus. Se Israel
    recordava os grandes
    actos de amor de Deus,
    que formavam o centro da
    sua confissão e abriam o
    horizonte da sua fé,
    agora a vida de Jesus
    aparece como o lugar da
    intervenção definitiva
    de Deus, a suprema
    manifestação do seu amor
    por nós. A palavra que
    Deus nos dirige em Jesus
    já não é uma entre
    muitas outras, mas a sua
    Palavra eterna (cf.
    Heb 1,
    1-2). Não há nenhuma
    garantia maior que Deus
    possa dar para nos
    certificar do seu amor, como
    nos lembra São Paulo (cf.
    Rm 8, 31-39). Portanto,
    a fé cristã é fé no Amor
    pleno, no seu poder eficaz,
    na sua capacidade de
    transformar o mundo e
    iluminar o tempo. « Nós
    conhecemos o amor que Deus
    nos tem, pois cremos nele »
    (1 Jo 4, 16). A fé
    identifica, no amor de Deus
    manifestado em Jesus, o
    fundamento sobre o qual
    assenta a realidade e o seu
    destino último.
    16.
    A maior prova da
    fiabilidade do amor de
    Cristo encontra-se na
    sua morte pelo homem. Se
    dar a vida pelos amigos
    é a maior prova de amor
    (cf. Jo 15, 13),
    Jesus ofereceu a sua
    vida por todos, mesmo
    por aqueles que eram
    inimigos, para
    transformar o coração. É
    por isso que os
    evangelistas situam, na
    hora da Cruz, o momento
    culminante do olhar de
    fé: naquela hora
    resplandece o amor
    divino em toda a sua
    sublimidade e amplitude.
    São João colocará aqui o
    seu testemunho solene,
    quando, juntamente com a
    Mãe de Jesus, contemplou
    Aquele que trespassaram
    (cf. Jo 19, 37):
    « Aquele que viu estas
    coisas é que dá
    testemunho delas e o seu
    testemunho é verdadeiro.
    E ele bem sabe que diz a
    verdade, para vós
    crerdes também » (Jo
    19, 35). Na sua obra
    O Idiota, Fiódor
    Mikhailovich Dostoiévski
    faz o protagonista â€" o
    príncipe Myskin â€" dizer,
    à vista do quadro de
    Cristo morto no
    sepulcro, pintado por
    Hans Holbein o Jovem: «
    Aquele quadro poderia mesmo fazer perder a fé a
    alguém »;[14] de facto,
    o quadro representa, de
    forma muito crua, os efeitos
    destruidores da morte no
    corpo de Cristo. E todavia é
    precisamente na contemplação
    da morte de Jesus que a fé
    se reforça e recebe uma luz
    fulgurante, é quando ela se
    revela como fé no seu amor
    inabalável por nós, que é
    capaz de penetrar na morte
    para nos salvar. Neste amor
    que não se subtraiu à morte
    para manifestar quanto me
    ama, é possível crer; a sua
    totalidade vence toda e
    qualquer suspeita e permite
    confiar-nos plenamente a
    Cristo.

    17. Ora, a morte de
    Cristo desvenda a total
    fiabilidade do amor de Deus
    à luz da sua ressurreição.
    Enquanto ressuscitado,
    Cristo é testemunha fiável,
    digna de fé (cf. Ap
    1, 5; Heb 2, 17),
    apoio firme para a nossa fé.
    « Se Cristo não ressuscitou,
    é vã a vossa fé », afirma
    São Paulo (1 Cor 15,
    17). Se o amor do Pai não
    tivesse feito Jesus
    ressurgir dos mortos, se não
    tivesse podido restituir a
    vida ao seu corpo, não seria
    um amor plenamente fiável,
    capaz de iluminar também as
    trevas da morte. Quando São
    Paulo fala da sua nova vida
    em Cristo, refere que a vive
    « na fé do Filho de Deus que
    me amou e a Si mesmo Se
    entregou por mim » (Gl
    2, 20). Esta « fé do
    Filho de Deus » é certamente
    a fé do Apóstolo dos gentios
    em Jesus, mas supõe também a
    fiabilidade de Jesus, que se
    funda, sem dúvida, no seu
    amor até à morte, mas também no facto de Ele
    ser Filho de Deus.
    Precisamente porque é o
    Filho, porque está radicado
    de modo absoluto no Pai,
    Jesus pôde vencer a morte e
    fazer resplandecer em
    plenitude a vida. A nossa
    cultura perdeu a noção desta
    presença concreta de Deus,
    da sua acção no mundo;
    pensamos que Deus Se
    encontra só no além, noutro
    nível de realidade, separado
    das nossas relações
    concretas. Mas, se fosse
    assim, isto é, se Deus fosse
    incapaz de agir no mundo, o
    seu amor não seria
    verdadeiramente poderoso,
    verdadeiramente real e, por
    conseguinte, não seria
    sequer verdadeiro amor,
    capaz de cumprir a
    felicidade que promete. E,
    então, seria completamente
    indiferente crer ou não crer
    n’Ele. Ao contrário, os
    cristãos confessam o amor
    concreto e poderoso de Deus,
    que actua verdadeiramente na
    história e determina o seu
    destino final; um amor que
    se fez passível de encontro,
    que se revelou em plenitude
    na paixão, morte e
    ressurreição de Cristo.
    18.
    A plenitude a que
    Jesus leva a fé possui
    outro aspecto decisivo:
    na fé, Cristo não é
    apenas Aquele em quem
    acreditamos, a maior
    manifestação do amor de
    Deus, mas é também
    Aquele a quem nos unimos
    para poder acreditar. A
    fé não só olha para
    Jesus, mas olha também a
    partir da perspectiva de
    Jesus e com os seus
    olhos: é uma
    participação no seu modo
    de ver. Em muitos
    âmbitos da vida,
    fiamo-nos de outras
    pessoas que conhecem as
    coisas melhor do que
    nós: temos confiança no
    arquitecto que constrói
    a nossa

    casa, no farmacêutico que
    nos fornece o remédio para a
    cura, no advogado que nos
    defende no tribunal.
    Precisamos também de alguém
    que seja fiável e perito nas
    coisas de Deus: Jesus, seu
    Filho, apresenta-Se
    como Aquele que nos explica
    Deus (cf. Jo 1, 18).
    A vida de Cristo, a sua
    maneira de conhecer o Pai,
    de viver totalmente em
    relação com Ele abre um
    espaço novo à experiência
    humana, e nós podemos entrar
    nele. São João exprimiu a
    importância que a relação
    pessoal com Jesus tem para a
    nossa fé, através de vários
    usos do verbo crer.
    Juntamente com o « crer que
    » é verdade o que Jesus nos
    diz (cf. Jo 14, 10;
    20, 31), João usa mais duas
    expressões: « crer a
    (sinónimo de dar crédito a)
    » Jesus e « crer em » Jesus.
    « Cremos a » Jesus, quando
    aceitamos a sua palavra, o
    seu testemunho, porque Ele é
    verdadeiro (cf. Jo 6,
    30). « Cremos em » Jesus,
    quando O acolhemos
    pessoalmente na nossa vida e
    nos confiamos a Ele,
    aderindo a Ele no amor e
    seguindo-O ao longo do
    caminho (cf. Jo 2,
    11; 6, 47; 12, 44).

    Para nos
    permitir conhecê-Lo,
    acolhê-Lo e segui-Lo, o
    Filho de Deus assumiu a
    nossa carne; e, assim, a sua
    visão do Pai deu-se também
    de forma humana, através de
    um caminho e um percurso no
    tempo. A fé cristã é fé na
    encarnação do Verbo e na sua
    ressurreição na carne; é fé
    num Deus que Se fez tão
    próximo que entrou na nossa
    história. A fé no Filho de
    Deus feito homem em Jesus de
    Nazaré não nos separa da
    realidade; antes permite-nos
    individuar o seu significado
    mais profundo, descobrir
    quanto Deus ama este mundo e o
    orienta sem cessar para Si;
    e isto leva o cristão a
    comprometer-se, a viver de
    modo ainda mais intenso o
    seu caminho sobre a terra.



    A
    salvação pela fé

    19.
    A partir desta
    participação no modo de
    ver de Jesus, o apóstolo
    Paulo deixou-nos, nos
    seus escritos, uma
    descrição da existência
    crente. Aquele que
    acredita, ao aceitar o
    dom da fé, é
    transformado numa nova
    criatura, recebe um novo
    ser, um ser filial,
    torna-se filho no Filho:
    « Abbá, Pai » é a
    palavra mais
    característica da
    experiência de Jesus,
    que se torna centro da
    experiência cristã (cf.
    Rm 8, 15). A vida
    na fé, enquanto
    existência filial, é
    reconhecer o dom
    originário e radical que
    está na base da
    existência do homem,
    podendo resumir-se nesta
    frase de São Paulo aos
    Coríntios: « Que tens tu
    que não tenhas recebido?
    » (1 Cor 4, 7). É
    precisamente aqui que se
    situa o cerne da
    polémica do Apóstolo com
    os fariseus: a discussão
    sobre a salvação pela fé
    ou pelas obras da lei.
    Aquilo que São Paulo
    rejeita é a atitude de
    quem se quer justificar
    a si mesmo diante de
    Deus através das
    próprias obras; esta
    pessoa, mesmo quando
    obedece aos mandamentos,
    mesmo quando realiza
    obras boas, coloca-se
    a si própria no centro e
    não reconhece que a
    origem do bem é Deus.
    Quem actua assim, quem
    quer ser fonte da sua
    própria justiça,
    depressa a vê exaurir-se
    e descobre que não pode
    sequer aguentar-se na
    fidelidade à lei;
    fecha-se, isolando-se
    do Senhor e dos outros,
    e, por isso, a sua vida torna-se vã, as suas
    obras estéreis, como árvore
    longe da água. Assim se
    exprime Santo Agostinho com
    a sua linguagem concisa e
    eficaz: « Não te afastes
    d’Aquele que te fez, nem
    mesmo para te encontrares a
    ti ».[15] Quando o
    homem pensa que,
    afastando-se de Deus,
    encontrar-se-á a si mesmo, a
    sua existência fracassa (cf.
    Lc 15, 11-24). O
    início da salvação é a
    abertura a algo que nos
    antecede, a um dom
    originário que sustenta a
    vida e a guarda na
    existência. Só abrindo-nos a
    esta origem e reconhecendo-a
    é que podemos ser
    transformados, deixando que
    a salvação actue em nós e
    torne a vida fecunda, cheia
    de frutos bons. A salvação
    pela fé consiste em
    reconhecer o primado do dom
    de Deus, como resume São
    Paulo: « Porque é pela graça
    que estais salvos, por meio
    da fé. E isto não vem de
    vós, é dom de Deus » (Ef
    2, 8).

    20. A nova lógica da fé
    centra-se em Cristo. A fé em
    Cristo salva-nos, porque é
    n’Ele que a vida se abre
    radicalmente a um Amor que
    nos precede e transforma a
    partir de dentro, que age em
    nós e connosco. Vê-se isto
    claramente na exegese que o
    Apóstolo dos gentios faz de
    um texto do Deuteronómio;
    uma exegese que se insere na
    dinâmica mais profunda do
    Antigo Testamento. Moisés
    diz ao povo que o mandamento
    de Deus não está demasiado
    alto nem demasiado longe do
    homem; não se deve dizer: «
    Quem subirá por nós até ao céu e no-la
    irá buscar? » ou « Quem
    atravessará o mar e no-la
    irá buscar? » (cf.
    Dt 30, 11-14). Esta
    proximidade da palavra de
    Deus é concretizada por São
    Paulo na presença de Jesus
    no cristão. « Não digas no
    teu coração: Quem subirá ao
    céu? Seria para fazer com
    que Cristo descesse. Nem
    digas: Quem descerá ao
    abismo? Seria para fazer com
    que Cristo subisse de entre
    os mortos » (Rm 10,
    6-7). Cristo desceu à terra
    e ressuscitou dos mortos:
    com a sua encarnação e
    ressurreição, o Filho de
    Deus abraçou o percurso
    inteiro do homem e habita
    nos nossos corações por meio
    do Espírito Santo. A fé sabe
    que Deus Se tornou muito
    próximo de nós, que Cristo
    nos foi oferecido como
    grande dom que nos
    transforma interiormente,
    que habita em nós, e assim
    nos dá a luz que ilumina a
    origem e o fim da vida, o
    arco inteiro do percurso
    humano. 21.
    Podemos assim
    compreender a novidade,
    a que a fé nos conduz. O
    crente é transformado
    pelo Amor, ao qual se
    abriu na fé; e, na sua
    abertura a este Amor que
    lhe é oferecido, a sua
    existência dilata-se
    para além dele próprio.
    São Paulo pode afirmar:
    « Já não sou eu que
    vivo, mas é Cristo que
    vive em mim » (Gl
    2, 20), e exortar: « Que
    Cristo, pela fé, habite
    nos vossos corações » (Ef
    3, 17). Na fé, o «
    eu » do crente dilata-se
    para ser habitado por um
    Outro, para viver num
    Outro, e assim a sua
    vida amplia-se no Amor.
    É aqui que se situa a
    acção própria do
    Espírito Santo: o
    cristão pode ter os
    olhos de Jesus, os seus

    sentimentos, a sua
    predisposição filial, porque
    é feito participante
    do seu Amor, que é o
    Espírito; é neste Amor que
    se recebe, de algum modo, a
    visão própria de Jesus. Fora
    desta conformação no Amor,
    fora da presença do Espírito
    que o infunde nos nossos
    corações (cf. Rm 5,
    5), é impossível confessar
    Jesus como Senhor (cf. 1
    Cor 12, 3).


    A forma
    eclesial da fé

    22.
    Deste modo, a vida
    do fiel torna-se
    existência eclesial.
    Quando São Paulo fala
    aos cristãos de Roma do
    único corpo que todos os
    crentes formam em
    Cristo, exorta-os a não
    se vangloriarem, mas a
    avaliarem-se « de acordo
    com a medida de fé que
    Deus distribuiu a cada
    um » (Rm 12, 3).
    O crente aprende a
    ver-se a si mesmo a
    partir da fé que
    professa. A figura de
    Cristo é o espelho em
    que descobre realizada a
    sua própria imagem. E
    dado que Cristo abraça
    em Si mesmo todos os
    crentes que formam o seu
    corpo, o cristão
    compreende-se a si mesmo
    neste corpo, em relação
    primordial com Cristo e
    os irmãos na fé. A
    imagem do corpo não
    pretende reduzir o
    crente a simples parte
    de um todo anónimo, a
    mero elemento de uma
    grande engrenagem;
    antes, sublinha a união
    vital de Cristo com os
    crentes e de todos os
    crentes entre si (cf.
    Rm 12, 4-5). Os
    cristãos sejam « todos
    um só » (cf. Gl
    3, 28), sem perder a sua
    individualidade, e, no
    serviço aos outros, cada
    um ganha profundamente o
    próprio ser.
    Compreende-se assim por
    que motivo, fora deste
    corpo, desta unidade da
    Igreja em Cristo

    â€" desta Igreja que,
    segundo as palavras de
    Romano Guardini, « é a
    portadora histórica do olhar
    global de Cristo sobre o
    mundo »,[16] â€", a fé
    perca a sua « medida », já
    não encontre o seu
    equilíbrio, nem o espaço
    necessário para se manter de
    pé. A fé tem uma forma
    necessariamente eclesial, é
    professada partindo do corpo
    de Cristo, como comunhão
    concreta dos crentes. A
    partir deste lugar eclesial,
    ela abre o indivíduo cristão
    a todos os homens. Uma vez
    escutada, a palavra de
    Cristo, pelo seu próprio
    dinamismo, transforma-se em
    resposta no cristão,
    tornando-se ela mesma
    palavra pronunciada,
    confissão de fé. São Paulo
    afirma: « Realmente com o
    coração se crê (…) e com a
    boca se faz a profissão de
    fé » (Rm 10, 10). A
    fé não é um facto privado,
    uma concepção
    individualista, uma opinião
    subjectiva, mas nasce de uma
    escuta e destina-se a ser
    pronunciada e a tornar-se
    anúncio. Com efeito, « como
    hão-de acreditar n’Aquele de
    quem não ouviram falar? E
    como hão-de ouvir falar, sem
    alguém que O anuncie? (Rm
    10, 14). Concluindo, a
    fé torna-se operativa no
    cristão a partir do dom
    recebido, a partir do Amor
    que o atrai para Cristo (cf.
    Gl 5, 6) e torna
    participante do caminho da
    Igreja, peregrina na
    história rumo à perfeição.
    Para quem foi assim
    transformado, abre-se um
    novo modo de ver, a fé
    torna-se luz para os seus
    olhos.

     
    CAPÍTULO II


    SE NÃO ACREDITARDES,


    NÃO COMPREENDEREIS

     (cf.
    Is 7, 9)


    Fé e
    verdade

    23.
    Se não acreditardes,
    não compreendereis (cf.
    Is 7, 9): foi
    assim que a versão grega
    da Bíblia hebraica â€" a
    tradução dos Setenta,
    feita em Alexandria do
    Egipto â€" traduziu as
    palavras do profeta
    Isaías ao rei Acaz,
    fazendo aparecer como
    central, na fé, a
    questão do conhecimento
    da verdade. Entretanto,
    no texto hebraico, há
    uma leitura diferente;
    aqui o profeta diz ao
    rei: « Se não o
    acreditardes, não
    subsistireis ». Existe
    aqui um jogo de palavras
    com duas formas do verbo
    ‘amàn: «
    acreditardes » (ta’aminu)
    e « subsistireis » (te’amenu).
    Apavorado com a força
    dos seus inimigos, o rei
    busca a segurança que
    lhe pode vir de uma
    aliança com o grande
    império da Assíria; mas
    o profeta convida-o a
    confiar apenas na
    verdadeira rocha que não
    vacila: o Deus de
    Israel. Uma vez que Deus
    é fiável, é razoável ter
    fé n’Ele, construir a
    própria segurança sobre
    a sua Palavra. Este é o
    Deus que Isaías chamará
    mais adiante, por duas
    vezes, o Deus-Amen, o «
    Deus fiel » (cf. Is
    65, 16), fundamento
    inabalável de fidelidade
    à aliança. Poder-se-ia
    pensar que a versão
    grega da Bíblia,
    traduzindo « subsistir »
    por « compreender »,
    tivesse realizado uma
    mudança profunda do
    texto, passando da noção
    bíblica de

    entrega a Deus à noção
    grega de compreensão. E no
    entanto esta tradução, que
    aceitava certamente o
    diálogo com a cultura
    helenista, não é alheia à
    dinâmica profunda do texto
    hebraico; a firmeza que
    Isaías promete ao rei passa,
    realmente, pela compreensão
    do agir de Deus e da unidade
    que Ele dá à vida do homem e
    à história do povo. O
    profeta exorta a compreender
    os caminhos do Senhor,
    encontrando na fidelidade de
    Deus o plano de sabedoria
    que governa os séculos. Esta
    síntese entre o «
    compreender » e o «
    subsistir » é expressa por
    Santo Agostinho, nas suas
    Confissões, quando fala
    da verdade em que se pode
    confiar para conseguirmos
    ficar de pé: « Estarei firme
    e consolidar-me-ei em Ti,
    (…) na tua verdade ».
    [17]
    Vendo o contexto, sabemos
    que este Padre da Igreja
    quer mostrar que esta
    verdade fidedigna de Deus é,
    como resulta da Bíblia, a
    sua presença fiel ao longo
    da história, a sua
    capacidade de manter unidos
    os tempos, recolhendo a
    dispersão dos dias do
    homem.[18]

    24. Lido a esta luz, o
    texto de Isaías faz-nos
    concluir: o homem precisa de
    conhecimento, precisa de
    verdade, porque sem ela não
    se mantém de pé, não
    caminha. Sem verdade, a fé
    não salva, não torna seguros
    os nossos passos. Seria uma
    linda fábula, a projecção
    dos nossos desejos de
    felicidade, algo que nos
    satisfaz só na medida em que
    nos quisermos iludir; ou
    então reduzir-se-ia a um sentimento
    bom que consola e afaga, mas
    permanece sujeito às nossas
    mudanças de ânimo, à
    variação dos tempos, incapaz
    de sustentar um caminho
    constante na vida. Se a fé
    fosse isso, então o rei Acaz
    teria razão para não jogar a
    sua vida e a segurança do
    seu reino sobre uma emoção.
    Mas não é! Precisamente pela
    sua ligação intrínseca com a
    verdade, a fé é capaz de
    oferecer uma luz nova,
    superior aos cálculos do
    rei, porque vê mais longe,
    compreende o agir de Deus,
    que é fiel à sua aliança e
    às suas promessas. 25.
    Lembrar esta ligação
    da fé com a verdade é
    hoje mais necessário do
    que nunca, precisamente
    por causa da crise de
    verdade em que vivemos.
    Na cultura
    contemporânea, tende-se
    frequentemente a aceitar
    como verdade apenas a da
    tecnologia: é verdadeiro
    aquilo que o homem
    consegue construir e
    medir com a sua ciência;
    é verdadeiro porque
    funciona, e assim torna
    a vida mais cómoda e
    aprazível. Esta verdade
    parece ser, hoje, a
    única certa, a única
    partilhável com os
    outros, a única sobre a
    qual se pode
    conjuntamente discutir e
    comprometer-se; depois
    haveria as verdades do
    indivíduo, como ser
    autêntico face àquilo
    que cada um sente no seu
    íntimo, válidas apenas
    para o sujeito mas que
    não podem ser propostas
    aos outros com a
    pretensão de servir o
    bem comum. A verdade
    grande, aquela que
    explica o conjunto da
    vida pessoal e social, é
    vista com suspeita.
    Porventura não foi esta
    â€" perguntam-se â€" a
    verdade pretendida pelos
    grandes totalitarismos

    do século passado, uma
    verdade que impunha a
    própria concepção global
    para esmagar a história
    concreta do indivíduo? No
    fim, resta apenas um
    relativismo, no qual a
    questão sobre a verdade de
    tudo â€" que, no fundo, é
    também a questão de Deus â€"
    já não interessa. Nesta
    perspectiva, é lógico que se
    pretenda eliminar a ligação
    da religião com a verdade,
    porque esta associação
    estaria na raiz do
    fanatismo, que quer emudecer
    quem não partilha da crença
    própria. A este respeito,
    pode-se falar de uma
    grande obnubilação da
    memória no nosso mundo
    contemporâneo; de facto, a
    busca da verdade é uma
    questão de memória, de
    memória profunda, porque
    visa algo que nos precede e,
    desta forma, pode conseguir
    unir-nos para além do nosso
    « eu » pequeno e limitado; é
    uma questão relativa à
    origem de tudo, a cuja luz
    se pode ver a meta e também
    o sentido da estrada comum.



    Conhecimento da verdade e
    amor

    26.
    Nesta situação,
    poderá a fé cristã
    prestar um serviço ao
    bem comum relativamente
    à maneira correcta de
    entender a verdade? Para
    termos uma resposta, é
    necessário reflectir
    sobre o tipo de
    conhecimento próprio da
    fé. Pode ajudar-nos esta
    frase de Paulo: «
    Acredita-se com o
    coração » (Rm 10,
    10). Este, na Bíblia, é
    o centro do homem, onde
    se entrecruzam todas as
    suas dimensões: o corpo
    e o espírito, a
    interioridade da pessoa
    e a sua abertura ao
    mundo e aos outros, a
    inteligência, a vontade,
    a afectividade. O
    coração pode

    manter unidas estas
    dimensões, porque é o lugar
    onde nos abrimos à verdade e
    ao amor, deixando que nos
    toquem e transformem
    profundamente. A fé
    transforma a pessoa inteira,
    precisamente na medida em
    que ela se abre ao amor; é
    neste entrelaçamento da fé
    com o amor que se compreende
    a forma de conhecimento
    própria da fé, a sua força
    de convicção, a sua
    capacidade de iluminar os
    nossos passos. A fé conhece
    na medida em que está ligada
    ao amor, já que o próprio
    amor traz uma luz. A
    compreensão da fé é aquela
    que nasce quando recebemos o
    grande amor de Deus, que nos
    transforma interiormente e
    nos dá olhos novos para ver
    a realidade.

    27. É conhecido o modo
    como o filósofo Ludwig
    Wittgenstein explicou a
    ligação entre a fé e a
    certeza. Segundo ele,
    acreditar seria comparável à
    experiência do enamoramento,
    concebida como algo de
    subjectivo, impossível de
    propor como verdade válida
    para todos.[19] De
    facto, aos olhos do homem
    moderno, parece que a
    questão do amor não teria
    nada a ver com a verdade; o
    amor surge, hoje, como uma
    experiência ligada, não à
    verdade, mas ao mundo
    inconstante dos sentimentos.


    Mas, será
    esta verdadeiramente uma
    descrição adequada do amor?
    Na realidade, o amor não se
    pode reduzir a um sentimento
    que vai e vem. É verdade que
    o amor tem a ver com a nossa
    afectividade, mas para a
    abrir à pessoa amada, e
    assim iniciar um caminho que
    faz sair da reclusão no
    próprio eu e dirigir-se para
    a outra pessoa, a fim de
    construir uma relação
    duradoura; o amor visa a
    união com a pessoa amada. E
    aqui se manifesta em que
    sentido o amor tem
    necessidade da verdade:
    apenas na medida em que o
    amor estiver fundado na
    verdade é que pode perdurar
    no tempo, superar o instante
    efémero e permanecer firme
    para sustentar um caminho
    comum. Se o amor não tivesse
    relação com a verdade,
    estaria sujeito à alteração
    dos sentimentos e não
    superaria a prova do tempo.
    Diversamente, o amor
    verdadeiro unifica todos os
    elementos da nossa
    personalidade e torna-se uma
    luz nova que aponta para uma
    vida grande e plena. Sem a
    verdade, o amor não pode
    oferecer um vínculo sólido,
    não consegue arrancar o « eu
    » para fora do seu
    isolamento, nem libertá-lo
    do instante fugidio para
    edificar a vida e produzir
    fruto.

    Se o amor
    tem necessidade da verdade,
    também a verdade precisa do
    amor; amor e verdade não se
    podem separar. Sem o amor, a
    verdade torna-se fria,
    impessoal, gravosa para a
    vida concreta da pessoa. A
    verdade que buscamos, a
    verdade que dá significado
    aos nossos passos,
    ilumina-nos quando somos
    tocados pelo amor. Quem ama,
    compreende que o amor é
    experiência da verdade,
    compreende que é
    precisamente ele que abre os
    nossos olhos para verem a
    realidade inteira, de
    maneira nova, em união com a
    pessoa amada. Neste sentido,
    escreveu São Gregório Magno que
    o próprio amor é um
    conhecimento, [20] traz
    consigo uma lógica nova.
    Trata-se de um modo
    relacional de olhar o mundo,
    que se torna conhecimento
    partilhado, visão na visão
    do outro e visão comum sobre
    todas as coisas. Na Idade
    Média, Guilherme de Saint
    Thierry adopta esta
    tradição, ao comentar um
    versículo do Cântico dos
    Cânticos no qual o amado diz
    à amada: « Como são lindos
    os teus olhos de pomba! » (Ct
    1, 15). [21] Estes dois
    olhos â€" explica Saint
    Thierry â€" são a razão crente
    e o amor, que se tornam um
    único olhar para chegar à
    contemplação de Deus, quando
    a inteligência se faz «
    entendimento de um amor
    iluminado ». [22] 28.
    Esta descoberta do
    amor como fonte de
    conhecimento, que
    pertence à experiência
    primordial de cada
    homem, encontra uma
    expressão categorizada
    na concepção bíblica da
    fé. Israel, saboreando o
    amor com que Deus o
    escolheu e gerou como
    povo, chega a
    compreender a unidade do
    desígnio divino, desde a
    origem à sua realização.
    O conhecimento da fé,
    pelo facto de nascer do
    amor de Deus que
    estabelece a Aliança, é
    conhecimento que ilumina
    um caminho na história.
    É por isso também que,
    na Bíblia, verdade e
    fidelidade caminham
    juntas: o Deus verdadeiro é o Deus fiel,
    Aquele que mantém as suas
    promessas e permite,
    com o decorrer do tempo,
    compreender o seu desígnio.
    Através da experiência dos
    profetas, no sofrimento do
    exílio e na esperança de um
    regresso definitivo à Cidade
    Santa, Israel intuiu que
    esta verdade de Deus se
    estendia mais além da
    própria história, abraçando
    a história inteira do mundo
    a começar da criação. O
    conhecimento da fé ilumina
    não só o caminho particular
    de um povo, mas também o
    percurso inteiro do mundo
    criado, desde a origem até à
    sua consumação.


    A fé como
    escuta e visão

    29.
    Justamente porque o
    conhecimento da fé está
    ligado à aliança de um
    Deus fiel, que
    estabelece uma relação
    de amor com o homem e
    lhe dirige a Palavra, é
    apresentado pela Bíblia
    como escuta, aparece
    associado com o ouvido.
    São Paulo usará uma
    fórmula que se tornou
    clássica: « fides ex
    auditu â€" a fé vem da
    escuta » (Rm 10,
    17). O conhecimento
    associado à palavra é
    sempre conhecimento
    pessoal, que reconhece a
    voz, se lhe abre
    livremente e a segue
    obedientemente. Por
    isso, São Paulo falou da
    « obediência da fé »
    (cf. Rm 1, 5; 16,
    26).[23] Além disso, a fé
    é conhecimento ligado ao transcorrer
    do tempo que a palavra
    necessita para ser
    explicitada: é conhecimento
    que só se aprende num
    percurso de seguimento. A
    escuta ajuda a identificar
    bem o nexo entre
    conhecimento e amor.
    A
    propósito do conhecimento da
    verdade, pretendeu-se por
    vezes contrapor a escuta à
    visão, a qual seria peculiar
    da cultura grega. Se a luz,
    por um lado, oferece a
    contemplação da totalidade a
    que o homem sempre aspirou,
    por outro, parece não deixar
    espaço à liberdade, pois
    desce do céu e chega
    directamente à vista, sem
    lhe pedir que responda. Além
    disso, parece convidar a uma
    contemplação estática,
    separada do tempo concreto
    em que o homem goza e sofre.
    Segundo esta concepção,
    haveria oposição entre a
    abordagem bíblica do
    conhecimento e a grega, a
    qual, na sua busca duma
    compreensão completa da
    realidade, teria associado o
    conhecimento com a visão.

    Mas tal
    suposta oposição não é
    corroborada de forma alguma
    pelos dados bíblicos: o
    Antigo Testamento combinou
    os dois tipos de
    conhecimento, unindo a
    escuta da Palavra de Deus
    com o desejo de ver o seu
    rosto. Isto tornou possível
    entabular diálogo com a
    cultura helenista, um diálogo
    que pertence ao coração da
    Escritura. O ouvido atesta não só a
    chamada pessoal e a
    obediência, mas também que a
    verdade se revela no tempo;
    a vista, por sua vez,
    oferece a visão plena de
    todo o percurso, permitindo
    situar-nos no grande
    projecto de Deus; sem tal
    visão, disporíamos apenas
    de fragmentos isolados de um
    todo desconhecido. 30.
    A conexão entre o
    ver e o ouvir, como
    órgãos do conhecimento
    da fé, aparece com a
    máxima clareza no
    Evangelho de João, onde
    acreditar é
    simultaneamente ouvir e
    ver. A escuta da fé
    verifica-se segundo a
    forma de conhecimento
    própria do amor: é uma
    escuta pessoal, que
    distingue e reconhece a
    voz do Bom Pastor (cf.
    Jo 10, 3-5); uma
    escuta que requer o
    seguimento, como
    acontece com os
    primeiros discípulos
    que, « ouvindo [João
    Baptista] falar desta
    maneira, seguiram Jesus
    » (Jo 1, 37). Por
    outro lado, a fé está
    ligada também com a
    visão: umas vezes, a
    visão dos sinais de
    Jesus precede a fé, como
    sucede com os judeus
    que, depois da
    ressurreição de Lázaro,
    « ao verem o que Jesus
    fez, creram n’Ele » (Jo
    11, 45); outras
    vezes, é a fé que leva a
    uma visão mais profunda:
    « Se acreditares, verás
    a glória de Deus » (Jo
    11, 40). Por fim,
    acreditar e ver
    cruzam-se: « Quem crê em
    Mim (...) crê n’Aquele
    que Me enviou; e quem Me
    vê a Mim, vê Aquele que
    me enviou » (Jo
    12, 44-45). O ver,
    graças à sua união com o
    ouvir, torna-se
    seguimento de Cristo; e
    a fé aparece como um
    caminho do olhar em

    que os olhos se habituam
    a ver em profundidade. E
    assim, na manhã de Páscoa,
    de João â€" que, ainda na
    escuridão perante o túmulo
    vazio, « viu e começou a
    crer » (Jo 20, 8) â€"
    passa-se a Maria Madalena â€"
    que já vê Jesus (cf. Jo
    20, 14) e quer retê-Lo,
    mas é convidada a
    contemplá-Lo no seu caminho
    para o Pai â€" até à plena
    confissão da própria
    Madalena diante dos
    discípulos: « Vi o Senhor! »
    (Jo 20, 18).

    Como se
    chega a esta síntese entre o
    ouvir e o ver? A partir da
    pessoa concreta de Jesus,
    que Se vê e escuta. Ele é a
    Palavra que Se fez carne e
    cuja glória contemplámos
    (cf. Jo 1, 14). A luz
    da fé é a luz de um Rosto,
    no qual se vê o Pai. De
    facto, no quarto Evangelho,
    a verdade que a fé apreende
    é a manifestação do Pai no
    Filho, na sua carne e nas
    suas obras terrenas; verdade
    essa, que se pode definir
    como a « vida luminosa » de
    Jesus.[24] Isto
    significa que o conhecimento
    da fé não nos convida a
    olhar uma verdade puramente
    interior; a verdade que a fé
    nos descerra é uma verdade
    centrada no encontro com
    Cristo, na contemplação da
    sua vida, na percepção da
    sua presença. Neste sentido
    e a propósito da visão
    corpórea do Ressuscitado,
    São Tomás de Aquino fala de
    oculata fides (uma fé
    que vê) dos Apóstolos:[25]
    viram Jesus ressuscitado com
    os seus olhos e acreditaram, isto é,
    puderam penetrar na
    profundidade daquilo que
    viam para confessar o Filho
    de Deus, sentado à direita
    do Pai. 31.
    Só assim, através da
    encarnação, através da
    partilha da nossa
    humanidade, podia chegar
    à plenitude o
    conhecimento próprio do
    amor. De facto, a luz do
    amor nasce quando somos
    tocados no coração,
    recebendo assim, em nós,
    a presença interior do
    amado, que nos permite
    reconhecer o seu
    mistério. Compreendemos
    agora por que motivo,
    para João, a fé seja,
    juntamente com o escutar
    e o ver, um tocar, como
    nos diz na sua Primeira
    Carta: « O que ouvimos,
    o que vimos (…) e as
    nossas mãos tocaram
    relativamente ao Verbo
    da Vida… » (1 Jo
    1, 1). Por meio da sua
    encarnação, com a sua
    vinda entre nós, Jesus
    tocou-nos e, através dos
    sacramentos, ainda hoje
    nos toca; desta forma,
    transformando o nosso
    coração, permitiu-nos â€"
    e permite-nos â€"
    reconhecê-Lo e
    confessá-Lo como Filho
    de Deus. Pela fé,
    podemos tocá-Lo e
    receber a força da sua
    graça. Santo Agostinho,
    comentando a passagem da
    hemorroíssa que toca
    Jesus para ser curada
    (cf. Lc 8,
    45-46), afirma: « Tocar
    com o coração, isto é
    crer ».[26] A multidão
    comprime-se ao redor de
    Jesus, mas não O alcança
    com aquele toque pessoal
    da fé que reconhece o
    seu mistério, o seu ser
    Filho que manifesta o
    Pai. Só quando somos configurados com
    Jesus é que recebemos
    o olhar adequado para O ver.


    O diálogo
    entre fé e razão

    32.
    A fé cristã,
    enquanto anuncia a
    verdade do amor total de
    Deus e abre para a força
    deste amor, chega ao
    centro mais profundo da
    experiência de cada
    homem, que vem à luz
    graças ao amor e é
    chamado ao amor para
    permanecer na luz.
    Movidos pelo desejo de
    iluminar a realidade
    inteira a partir do amor
    de Deus manifestado em
    Jesus e procurando amar
    com este mesmo amor, os
    primeiros cristãos
    encontraram no mundo
    grego, na sua fome de
    verdade, um parceiro
    idóneo para o diálogo. O
    encontro da mensagem
    evangélica com o
    pensamento filosófico do
    mundo antigo constituiu
    uma passagem decisiva
    para o Evangelho chegar
    a todos os povos e
    favoreceu uma fecunda
    sinergia entre fé e
    razão, que se foi
    desenvolvendo no decurso
    dos séculos até aos
    nossos dias. O Beato
    João Paulo II, na sua
    carta encíclica
    Fides
    et ratio, mostrou
    como fé e razão se
    reforçam mutuamente. [27]
    Depois de ter encontrado
    a luz plena do amor de
    Jesus, descobrimos que
    havia, em todo o nosso
    amor, um lampejo daquela
    luz e compreendemos qual
    era a sua meta
    derradeira; e,
    simultaneamente, o facto
    de o nosso amor trazer
    em si uma luz ajuda-nos
    a ver o caminho do amor
    rumo à plenitude da doação total do Filho de
    Deus por nós. Neste
    movimento circular, a luz da
    fé ilumina todas as nossas
    relações humanas, que podem
    ser vividas em união com o
    amor e a ternura de Cristo.
    33.
    Na vida de Santo
    Agostinho, encontramos
    um exemplo significativo
    deste caminho: a busca
    da razão, com o seu
    desejo de verdade e
    clareza, aparece
    integrada no horizonte
    da fé, do qual recebeu
    uma nova compreensão.
    Por um lado, acolhe a
    filosofia grega da luz
    com a sua insistência na
    visão: o seu encontro
    com o neoplatonismo
    fez-lhe conhecer o
    paradigma da luz, que
    desce do alto para
    iluminar as coisas,
    tornando-se assim um
    símbolo de Deus. Desta
    maneira, Santo Agostinho
    compreendeu a
    transcendência divina e
    descobriu que todas as
    coisas possuem em si uma
    transparência, isto é,
    que podiam reflectir a
    bondade de Deus, o Bem;
    assim se libertou do
    maniqueísmo, em que
    antes vivia, que o
    inclinava a pensar que o
    bem e o mal lutassem
    continuamente entre si,
    confundindo-se e
    misturando-se, sem
    contornos claros. O
    facto de ter
    compreendido que Deus é
    luz deu à sua existência
    uma nova orientação, a
    capacidade de reconhecer
    o mal de que era culpado
    e voltar-se para o bem.


    Mas, por
    outro lado, na experiência
    concreta de Agostinho, que
    ele próprio narra nas suas
    Confissões, o momento
    decisivo no seu caminho de
    fé não foi uma visão de Deus
    para além deste mundo, mas a
    escuta, quando no jardim
    ouviu uma voz que lhe dizia:
    « Toma e lê »; ele pegou no tomo
    com as Cartas de São Paulo,
    detendo-se no capítulo
    décimo terceiro da Carta aos
    Romanos.[28] Temos aqui
    o Deus pessoal da Bíblia,
    capaz de falar ao homem,
    descer para viver com ele e
    acompanhar o seu caminho na
    história, manifestando-Se no
    tempo da escuta e da
    resposta.


    Mas, este
    encontro com o Deus da
    Palavra não levou Santo
    Agostinho a rejeitar a luz e
    a visão, mas integrou ambas
    as perspectivas, guiado
    sempre pela revelação do
    amor de Deus em Jesus. Deste
    modo, elaborou uma filosofia
    da luz que reúne em
    si a reciprocidade própria
    da palavra e abre um espaço
    à liberdade própria do olhar
    para a luz: tal como à
    palavra corresponde uma
    resposta livre, assim também
    a luz encontra como resposta
    uma imagem que a reflecte.
    Deste modo, associando
    escuta e visão, Santo
    Agostinho pôde referir-se à
    « palavra que resplandece no
    interior do homem ».[29] A luz
    torna-se, por assim dizer, a
    luz de uma palavra, porque é
    a luz de um Rosto pessoal,
    uma luz que, ao
    iluminar-nos, nos chama e
    quer reflectir-se no nosso
    rosto para resplandecer a
    partir do nosso íntimo. Por
    outro lado, o desejo da
    visão do todo, e não apenas
    dos fragmentos da história,
    continua presente e
    cumprir-se-á no fim, quando
    o homem â€" como diz o Santo
    de Hipona â€" poderá ver e
    amar;[30] e isto, não por ser
    capaz de possuir a luz toda,
    já que esta será sempre
    inexaurível, mas por entrar,
    todo inteiro, na luz.
    34.
    A luz do amor,
    própria da fé, pode
    iluminar as perguntas do
    nosso tempo acerca da
    verdade. Muitas vezes,
    hoje, a verdade é
    reduzida a autenticidade
    subjectiva do indivíduo,
    válida apenas para a
    vida individual. Uma
    verdade comum mete-nos
    medo, porque a
    identificamos â€" como
    dissemos atrás â€" com a
    imposição intransigente
    dos totalitarismos; mas,
    se ela é a verdade do
    amor, se é a verdade que
    se mostra no encontro
    pessoal com o Outro e
    com os outros, então
    fica livre da reclusão
    no indivíduo e pode
    fazer parte do bem
    comum. Sendo a verdade
    de um amor, não é
    verdade que se impõe
    pela violência, não é
    verdade que esmaga o
    indivíduo; nascendo do
    amor pode chegar ao
    coração, ao centro
    pessoal de cada homem;
    daqui resulta claramente
    que a fé não é
    intransigente, mas
    cresce na convivência
    que respeita o outro. O
    crente não é arrogante;
    pelo contrário, a
    verdade torna-o humilde,
    sabendo que, mais do que
    possuirmo-la nós, é ela
    que nos abraça e possui.
    Longe de nos endurecer,
    a segurança da fé
    põe-nos a caminho e
    torna possível o
    testemunho e o diálogo
    com todos.

    Por outro lado, enquanto
    unida à verdade do amor, a
    luz da fé não é alheia ao
    mundo material, porque o
    amor vive-se sempre com
    corpo e alma; a luz da fé é
    luz encarnada, que dimana da
    vida luminosa de Jesus. A fé
    ilumina também a matéria,
    confia na sua ordem, sabe
    que nela se abre um
    caminho cada vez mais amplo
    de harmonia e compreensão.
    Deste modo, o olhar da
    ciência tira benefício da
    fé: esta convida o cientista
    a permanecer aberto à
    realidade, em toda a sua
    riqueza inesgotável. A fé
    desperta o sentido crítico,
    enquanto impede a pesquisa
    de se deter, satisfeita, nas
    suas fórmulas e ajuda-a a
    compreender que a natureza
    sempre as ultrapassa.
    Convidando a maravilhar-se
    diante do mistério da
    criação, a fé alarga os
    horizontes da razão para
    iluminar melhor o mundo que
    se abre aos estudos da
    ciência.

    A fé e a
    busca de Deus

    35.
    A luz da fé em Jesus
    ilumina também o caminho
    de todos aqueles que
    procuram a Deus e
    oferece a contribuição
    própria do cristianismo
    para o diálogo com os
    seguidores das
    diferentes religiões. A
    Carta aos Hebreus
    fala-nos do testemunho
    dos justos que, antes da
    Aliança com Abraão, já
    procuravam a Deus com
    fé; lá se diz, a
    propósito de Henoc, que
    « tinha agradado a Deus
    », sendo isso impossível
    sem a fé, porque « quem
    se aproxima de Deus tem
    de acreditar que Ele
    existe e recompensa
    aqueles que O procuram »
    (Heb 11, 5.6).
    Deste modo, é possível
    compreender que o
    caminho do homem
    religioso passa pela
    confissão de um Deus que
    cuida dele e que Se pode
    encontrar. Que outra
    recompensa poderia Deus
    oferecer àqueles que O
    buscam, senão deixar-Se
    encontrar a Si mesmo?
    Ainda antes de Henoc,
    encontramos a figura de
    Abel, de quem se louva
    igualmente a fé, em
    virtude da qual foram agradáveis a
    Deus os seus dons, a
    oferenda dos primogénitos
    dos seus rebanhos (cf.
    Heb 11, 4). O homem
    religioso procura reconhecer
    os sinais de Deus nas
    experiências diárias da sua
    vida, no ciclo das estações,
    na fecundidade da terra e em
    todo o movimento do
    universo. Deus é luminoso,
    podendo ser encontrado
    também por aqueles que O
    buscam de coração sincero.

    Imagem
    desta busca são os Magos,
    guiados pela estrela até
    Belém (cf. Mt 2,
    1-12). A luz de Deus
    mostrou-se-lhes como
    caminho, como estrela que os
    guia ao longo duma estrada a
    descobrir. Deste modo, a
    estrela fala da paciência de
    Deus com os nossos olhos,
    que devem habituar-se ao
    seu fulgor. Encontrando-se a
    caminho, o homem religioso
    deve estar pronto a
    deixar-se guiar, a sair de
    si mesmo para encontrar o
    Deus que não cessa de nos
    surpreender. Este respeito
    de Deus pelos olhos do homem
    mostra-nos que, quando o
    homem se aproxima d’Ele, a
    luz humana não se dissolve
    na imensidão luminosa de
    Deus, como se fosse um
    estrela absorvida pela
    aurora, mas torna-se tanto
    mais brilhante quanto mais
    perto fica do fogo gerador,
    como um espelho que reflecte
    o resplendor. A confissão de
    Jesus, único Salvador,
    afirma que toda a luz de
    Deus se concentrou n’Ele, na
    sua « vida luminosa », em
    que se revela a origem e a
    consumação da história.[31]
    Não há nenhuma experiência humana, nenhum itinerário
    do homem para Deus que não
    possa ser acolhido,
    iluminado e purificado por
    esta luz. Quanto mais o
    cristão penetrar no círculo
    aberto pela luz de Cristo,
    tanto mais será capaz de
    compreender e acompanhar o
    caminho de cada homem para
    Deus.


    Configurando-se como
    caminho, a fé tem a
    ver também com a vida dos
    homens que, apesar de não
    acreditar, desejam-no fazer
    e não cessam de procurar. Na
    medida em que se abrem, de
    coração sincero, ao amor e
    se põem a caminho com a luz
    que conseguem captar, já
    vivem â€" sem o saber â€" no
    caminho para a fé: procuram
    agir como se Deus existisse,
    seja porque reconhecem a sua
    importância para encontrar
    directrizes firmes na vida
    comum, seja porque sentem o
    desejo de luz no meio da
    escuridão, seja ainda
    porque, notando como é
    grande e bela a vida, intuem
    que a presença de Deus ainda
    a tornaria maior. Santo
    Ireneu de Lião refere que
    Abraão, antes de ouvir a voz
    de Deus, já O procurava «
    com o desejo ardente do seu
    coração » e « percorria todo
    o mundo, perguntando-se onde
    pudesse estar Deus », até
    que « Deus teve piedade
    daquele que, sozinho, O
    procurava no silêncio ».[32]
    Quem se põe a caminho para
    praticar o bem, já se
    aproxima de Deus, já está
    sustentado pela sua ajuda,
    porque é próprio da dinâmica
    da luz divina iluminar os
    nossos olhos, quando
    caminhamos para a plenitude
    do amor.


    Fé e
    teologia

    36.
    Como luz que é, a fé
    convida-nos a penetrar
    nela, a explorar sempre
    mais o horizonte que
    ilumina, para conhecer
    melhor o que amamos.
    Deste desejo nasce a
    teologia cristã; assim,
    é claro que a teologia é
    impossível sem a fé e
    pertence ao próprio
    movimento da fé, que
    procura a compreensão
    mais profunda da
    auto-revelação de Deus,
    culminada no Mistério de
    Cristo. A primeira
    consequência é que, na
    teologia, não se
    verifica apenas um
    esforço da razão para
    perscrutar e conhecer,
    como nas ciências
    experimentais. Deus não
    pode ser reduzido a
    objecto; Ele é Sujeito
    que Se dá a conhecer e
    manifesta na relação
    pessoa a pessoa. A fé
    recta orienta a razão
    para se abrir à luz que
    vem de Deus, a fim de
    que ela, guiada pelo
    amor à verdade, possa
    conhecer Deus de forma
    mais profunda. Os
    grandes doutores e
    teólogos medievais
    declararam que a
    teologia, enquanto
    ciência da fé, é uma
    participação no
    conhecimento que Deus
    tem de Si mesmo. Por
    isso, a teologia não é
    apenas palavra sobre
    Deus, mas, antes de
    tudo, acolhimento e
    busca de uma compreensão
    mais profunda da palavra
    que Deus nos dirige:
    palavra que Deus
    pronuncia sobre Si
    mesmo, porque é um
    diálogo eterno de
    comunhão, no âmbito do
    qual é admitido o
    homem.[33] Assim, é
    própria da teologia a humildade, que se deixa «
    tocar » por Deus, reconhece
    os seus limites face
    ao Mistério e se encoraja a
    explorar, com a disciplina
    própria da razão, as
    riquezas insondáveis deste
    Mistério.

    Além
    disso, a teologia partilha a
    forma eclesial da fé; a sua
    luz é a luz do sujeito
    crente que é a Igreja. Isto
    implica, por um lado, que a
    teologia esteja ao serviço
    da fé dos cristãos, vise
    humildemente preservar e
    aprofundar o crer de todos,
    sobretudo dos mais simples;
    e por outro, dado que vive
    da fé, a teologia não
    considera o magistério do
    Papa e dos Bispos em
    comunhão com ele como algo
    de extrínseco, um limite à
    sua liberdade, mas, pelo
    contrário, como um dos seus
    momentos internos
    constitutivos, enquanto o
    magistério assegura o
    contacto com a fonte
    originária, oferecendo assim
    a certeza de beber na
    Palavra de Cristo em toda a
    sua integridade.
     
    CAPÍTULO III


    TRANSMITO-VOS
    AQUILO QUE RECEBI

    (cf.
    1 Cor 15, 3)

     


    A Igreja,
    mãe da nossa fé

    37.
    Quem se abriu ao
    amor de Deus, acolheu a
    sua voz e recebeu a sua
    luz, não pode guardar
    este dom para si mesmo.
    Uma vez que é escuta e
    visão, a fé transmite-se
    também como palavra e
    como luz; dirigindo-se
    aos Coríntios, o
    apóstolo Paulo utiliza
    precisamente estas duas
    imagens. Por um lado,
    diz: « Animados do mesmo
    espírito de fé, conforme
    o que está escrito:
    Acreditei e por isso
    falei, também nós
    acreditamos e por isso
    falamos » (2 Cor
    4, 13); a palavra
    recebida faz-se
    resposta, confissão, e
    assim ecoa para os
    outros, convidando-os a
    crer. Por outro, São
    Paulo refere-se também à
    luz: « E nós todos que,
    com o rosto descoberto,
    reflectimos a glória do
    Senhor, somos
    transfigurados na sua
    própria imagem » (2
    Cor 3, 18); é uma
    luz que se reflecte de
    rosto em rosto, como
    sucedeu com Moisés cujo
    rosto reflectia a glória
    de Deus depois de ter
    falado com Ele: « [Deus]
    brilhou nos nossos
    corações, para irradiar
    o conhecimento da glória
    de Deus, que resplandece
    na face de Cristo » (2
    Cor 4, 6). A luz de
    Jesus brilha no rosto
    dos cristãos como num
    espelho, e assim se
    difunde chegando até
    nós, para que também nós
    possamos participar
    desta visão e reflectir
    para outros a sua luz,
    da mesma

    forma que a luz do círio,
    na liturgia de Páscoa,
    acende muitas outras velas.
    A fé transmite-se por assim
    dizer sob a forma de
    contacto, de pessoa a
    pessoa, como uma chama se
    acende noutra chama. Os
    cristãos, na sua pobreza,
    lançam uma semente tão
    fecunda que se torna uma
    grande árvore, capaz de
    encher o mundo de frutos.

    38. A transmissão da fé,
    que brilha para as pessoas
    de todos os lugares, passa
    também através do eixo do
    tempo, de geração em
    geração. Dado que a fé nasce
    de um encontro que acontece
    na história e ilumina o
    nosso caminho no tempo, a
    mesma deve ser transmitida
    ao longo dos séculos. É
    através de uma cadeia
    ininterrupta de testemunhos
    que nos chega o rosto de
    Jesus. Como é possível isto?
    Como se pode estar seguro de
    beber no « verdadeiro Jesus
    » através dos séculos?
    Se o homem fosse um
    indivíduo isolado, se
    quiséssemos partir apenas do
    « eu » individual, que
    pretende encontrar em si
    mesmo a firmeza do seu
    conhecimento, tal certeza
    seria impossível; não posso,
    por mim mesmo, ver aquilo
    que aconteceu numa época tão
    distante de mim. Mas, esta
    não é a única maneira de o
    homem conhecer; a pessoa
    vive sempre em relação:
    provém de outros, pertence a
    outros, a sua vida torna-se
    maior no encontro com os
    outros; o próprio
    conhecimento e consciência
    de nós mesmos são de tipo
    relacional e estão ligados a
    outros que nos precederam, a
    começar pelos nossos pais
    que nos deram a vida e o
    nome. A própria linguagem,
    as palavras com que
    interpretamos a nossa vida e
    a realidade inteira
    chegam-nos através dos
    outros, conservadas na
    memória viva de outros; o
    conhecimento de nós mesmos
    só é possível quando
    participamos duma memória
    mais ampla. O mesmo acontece
    com a fé, que leva à
    plenitude o modo humano de
    entender: o passado da fé,
    aquele acto de amor de Jesus
    que gerou no mundo uma vida
    nova, chega até nós na
    memória de outros, das
    testemunhas, guardado vivo
    naquele sujeito único de
    memória que é a Igreja; esta
    é uma Mãe que nos ensina a
    falar a linguagem da fé. São
    João insistiu sobre este
    aspecto no seu Evangelho,
    unindo conjuntamente fé e
    memória e associando as duas
    à acção do Espírito Santo
    que, como diz Jesus, « há-de
    recordar-vos tudo » (Jo
    14, 26). O Amor, que é o
    Espírito e que habita na
    Igreja, mantém unidos entre
    si todos os tempos e faz-nos
    contemporâneos de Jesus,
    tornando-Se assim o guia do
    nosso caminho na fé.
    39. É impossível crer
    sozinhos. A fé não é só uma
    opção individual que se
    realiza na interioridade do
    crente, não é uma relação
    isolada entre o « eu » do
    fiel e o « Tu » divino,
    entre o sujeito autónomo e
    Deus; mas, por sua natureza,
    abre-se ao « nós »,
    verifica-se sempre dentro da
    comunhão da Igreja. Assim
    no-lo recorda a forma
    dialogada do Credo, que se
    usa na liturgia baptismal. O
    crer exprime-se como
    resposta a um convite, a uma
    palavra que não provém de
    mim, mas deve ser escutada;
    por isso, insere-se no
    interior de um diálogo, não pode ser
    uma mera confissão
    que nasce do indivíduo: só é
    possível responder « creio »
    em primeira pessoa, porque
    se pertence a uma comunhão
    grande, dizendo também «
    cremos ». Esta abertura ao «
    nós » eclesial realiza-se de
    acordo com a abertura
    própria do amor de Deus, que
    não é apenas relação entre o
    Pai e o Filho, entre « eu »
    e « tu », mas, no Espírito,
    é também um « nós », uma
    comunhão de pessoas. Por
    isso mesmo, quem crê nunca
    está sozinho; e, pela mesma
    razão, a fé tende a
    difundir-se, a convidar
    outros para a sua alegria.
    Quem recebe a fé, descobre
    que os espaços do próprio «
    eu » se alargam, gerando-se
    nele novas relações que
    enriquecem a vida. Assim o
    exprimiu vigorosamente
    Tertuliano ao dizer do
    catecúmeno que, tendo sido
    recebido numa nova família «
    depois do banho do novo
    nascimento », é acolhido na
    casa da Mãe para erguer as
    mãos e rezar, juntamente com
    os irmãos, o Pai Nosso.[34]


    Os
    sacramentos e a transmissão
    da fé

    40.
    Como sucede em cada
    família, a Igreja
    transmite aos seus
    filhos o conteúdo da sua
    memória. Como se deve
    fazer esta transmissão
    de modo que nada se
    perca, mas antes que
    tudo se aprofunde cada
    vez mais na herança da
    fé? É através da
    Tradição Apostólica,
    conservada na Igreja com
    a assistência do
    Espírito Santo, que
    temos contacto vivo com a
    memória fundadora. E aquilo
    que foi transmitido pelos
    Apóstolos, como afirma o
    Concílio Ecuménico Vaticano
    II, « abrange tudo quanto
    contribui para a vida santa
    do Povo de Deus e para o
    aumento da sua fé; e assim a
    Igreja, na sua doutrina,
    vida e culto, perpetua e
    transmite a todas as
    gerações tudo aquilo que ela
    é e tudo quanto acredita ».[35]

    De facto,
    a fé tem necessidade de um
    âmbito onde se possa
    testemunhar e comunicar, e
    que o mesmo seja adequado e
    proporcionado ao que se
    comunica. Para transmitir um
    conteúdo meramente
    doutrinal, uma ideia, talvez
    bastasse um livro ou a
    repetição de uma mensagem
    oral; mas aquilo que se
    comunica na Igreja, o que se
    transmite na sua Tradição
    viva é a luz nova que nasce
    do encontro com o Deus vivo,
    uma luz que toca a pessoa no
    seu íntimo, no coração,
    envolvendo a sua mente,
    vontade e afectividade,
    abrindo-a a relações vivas
    na comunhão com Deus e com
    os outros. Para se
    transmitir tal plenitude,
    existe um meio especial que
    põe em jogo a pessoa
    inteira: corpo e espírito,
    interioridade e relações.
    Este meio são os sacramentos
    celebrados na liturgia da
    Igreja: neles, comunica-se
    uma memória encarnada,
    ligada aos lugares e épocas
    da vida, associada com todos
    os sentidos; neles, a pessoa
    é envolvida, como membro de
    um sujeito vivo, num tecido
    de relações comunitárias.
    Por isso, se é verdade que
    os sacramentos são os sacramentos da fé,[36] há
    que afirmar também que a fé
    tem uma estrutura
    sacramental; o despertar da
    fé passa pelo despertar de
    um novo sentido sacramental
    na vida do homem e na
    existência cristã, mostrando
    como o visível e o material
    se abrem para o mistério do
    eterno. 41.
    A transmissão da fé
    verifica-se, em primeiro
    lugar, através do
    Baptismo. Poderia
    parecer que este
    sacramento fosse apenas
    um modo para simbolizar
    a confissão de fé, um
    acto pedagógico para
    quem precise de imagens
    e gestos, e do qual
    seria possível
    fundamentalmente
    prescindir. Mas não é
    assim, como no-lo
    recorda uma palavra de
    São Paulo: « Pelo
    Baptismo fomos
    sepultados com Cristo na
    morte, para que, tal
    como Cristo foi
    ressuscitado de entre os
    mortos pela glória do
    Pai, também nós
    caminhemos numa vida
    nova » (Rm 6, 4);
    nele, tornamo-nos nova
    criatura e filhos
    adoptivos de Deus. E
    mais adiante o Apóstolo
    diz que o cristão foi
    confiado a uma « forma
    de ensino » (typos
    didachés), a que
    obedece de coração (cf.
    Rm 6, 17): no
    Baptismo, o homem recebe
    também uma doutrina que
    deve professar e uma
    forma concreta de vida
    que requer o
    envolvimento de toda a
    sua pessoa,
    encaminhando-a para o
    bem; é transferido para
    um novo âmbito, confiado
    a um novo ambiente, a
    uma nova maneira comum
    de agir, na Igreja.
    Deste modo, o Baptismo
    recorda-nos que a fé não
    é obra do indivíduo isolado, não é um
    acto que o homem possa
    realizar contando apenas com
    as próprias forças, mas tem
    de ser recebida, entrando na
    comunhão eclesial que
    transmite o dom de Deus:
    ninguém se baptiza a si
    mesmo, tal como ninguém vem
    sozinho à existência. Fomos
    baptizados.
    42.
    Quais são os
    elementos baptismais que
    nos introduzem nesta
    nova « forma de ensino
    »? Sobre o catecúmeno é
    invocado, em primeiro
    lugar, o nome da
    Trindade: Pai, Filho e
    Espírito Santo. E deste
    modo se oferece, logo
    desde o princípio, uma
    síntese do caminho da
    fé: o Deus que chamou
    Abraão e quis chamar-Se
    seu Deus, o Deus que
    revelou o seu nome a
    Moisés, o Deus que, ao
    entregar-nos o seu
    Filho, nos revelou
    plenamente o mistério do
    seu Nome, dá à pessoa
    baptizada uma nova
    identidade filial. Desta
    forma, se evidencia o
    sentido da imersão na
    água que se realiza no
    Baptismo: a água é,
    simultaneamente, símbolo
    de morte, que nos
    convida a passar pela
    conversão do « eu »
    tendo em vista a sua
    abertura a um « Eu »
    maior, e símbolo de
    vida, do ventre onde
    renascemos para seguir
    Cristo na sua nova
    existência. Deste modo,
    através da imersão na
    água, o Baptismo
    fala-nos da estrutura
    encarnada da fé. A acção
    de Cristo toca-nos na
    nossa realidade pessoal,
    transformando-nos
    radicalmente,
    tornando-nos filhos
    adoptivos de Deus,
    participantes da
    natureza divina; e assim
    modifica todas as nossas
    relações, a nossa
    situação concreta na
    terra e no universo,
    abrindo-as à própria
    vida de comunhão d’Ele. Este
    dinamismo de transformação
    próprio do Baptismo
    ajuda-nos a perceber a
    importância do catecumenato,
    que hoje â€" mesmo em
    sociedades de antigas raízes
    cristãs, onde um número
    crescente de adultos se
    aproxima do sacramento
    baptismal â€" se reveste de
    singular relevância para a
    nova evangelização. É o
    itinerário de preparação
    para o Baptismo, para a
    transformação da vida
    inteira em Cristo.
    Para
    compreender a ligação entre
    o Baptismo e a fé, pode
    ajudar-nos a recordação de
    um texto do profeta Isaías,
    que já aparece associado com
    o Baptismo na literatura
    cristã antiga: « Terá o seu
    refúgio em rochas elevadas,
    terá (…) água em abundância
    » (Is 33, 16).[37]
    Resgatado da morte pela
    água, o baptizado pode
    manter-se de pé sobre «
    rochas elevadas », porque
    encontrou a solidez à qual
    confiar-se; e, assim, a água
    de morte transformou-se em
    água de vida. O texto grego
    descrevia-a como água
    pistòs, água « fiel »: a
    água do Baptismo é fiel,
    podendo confiar-nos a ela
    porque a sua corrente entra
    na dinâmica de amor de
    Jesus, fonte de segurança
    para o nosso caminho na
    vida.
    43.
    A estrutura do
    Baptismo, a sua
    configuração como
    renascimento no qual
    recebemos um nome novo e
    uma vida nova, ajuda-nos
    a compreender o sentido
    e a importância do
    Baptismo das crianças.
    Uma criança não é capaz
    de um acto
    livre que acolha a fé:
    ainda não a pode confessar
    sozinha e, por isso mesmo, é
    confessada pelos seus pais e
    pelos padrinhos em nome
    dela. A fé é vivida no
    âmbito da comunidade da
    Igreja, insere-se num « nós
    » comum. Assim, a criança
    pode ser sustentada por
    outros, pelos seus pais e
    padrinhos, e pode ser
    acolhida na fé deles que é a
    fé da Igreja, simbolizada
    pela luz que o pai toma do
    círio na liturgia baptismal.
    Esta estrutura do Baptismo
    põe em evidência a
    importância da sinergia
    entre a Igreja e a família
    na transmissão da fé. Os
    pais são chamados â€" como diz
    Santo Agostinho â€" não só a
    gerar os filhos para a vida,
    mas a levá-los a Deus, para
    que sejam, através do
    Baptismo, regenerados como
    filhos de Deus, recebam o
    dom da fé.[38] Assim,
    juntamente com a vida,
    é-lhes dada a orientação
    fundamental da existência e
    a segurança de um bom
    futuro; orientação esta, que
    será ulteriormente
    corroborada no sacramento da
    Confirmação com o selo
    indelével do Espírito Santo.
    44.
    A natureza
    sacramental da fé
    encontra a sua máxima
    expressão na Eucaristia.
    Esta é alimento precioso
    da fé, encontro com
    Cristo presente de
    maneira real no seu acto
    supremo de amor: o dom
    de Si mesmo que gera
    vida. Na Eucaristia,
    temos o cruzamento dos
    dois eixos sobre os
    quais a fé percorre o
    seu caminho. Por um
    lado,
    o eixo da história: a
    Eucaristia é acto de
    memória, actualização do
    mistério, em que o passado,
    como um evento de morte e
    ressurreição, mostra a sua
    capacidade de se abrir ao
    futuro, de antecipar a
    plenitude final; no-lo
    recorda a liturgia com o seu
    hodie, o « hoje » dos
    mistérios da salvação. Por
    outro lado, encontra-se aqui
    também o eixo que conduz do
    mundo visível ao invisível:
    na Eucaristia, aprendemos a
    ver a profundidade do real.
    O pão e o vinho
    transformam-se no Corpo e
    Sangue de Cristo, que Se faz
    presente no seu caminho
    pascal para o Pai: este
    movimento introduz-nos,
    corpo e alma, no movimento
    de toda a criação para a sua
    plenitude em Deus.
    45.
    Na celebração dos
    sacramentos, a Igreja
    transmite a sua memória,
    particularmente com a
    profissão de fé. Nesta,
    não se trata tanto de
    prestar assentimento a
    um conjunto de verdades
    abstractas, como
    sobretudo fazer a vida
    toda entrar na comunhão
    plena com o Deus Vivo.
    Podemos dizer que, no
    Credo, o fiel é
    convidado a entrar no
    mistério que professa e
    a deixar-se transformar
    por aquilo que confessa.
    Para compreender o
    sentido desta afirmação,
    pensemos em primeiro
    lugar no conteúdo do
    Credo. Este tem uma
    estrutura trinitária: o
    Pai e o Filho unem-Se no
    Espírito de amor. Deste
    modo o crente afirma que
    o centro do ser, o
    segredo mais profundo de
    todas as coisas é a
    comunhão divina. Além
    disso, o Credo
    contém uma confissão
    cristológica: repassam-se os mistérios da vida
    de Jesus até à sua
    morte, ressurreição e ascensão
    ao Céu, na esperança da sua
    vinda final na glória. E,
    consequentemente, afirma-se
    que este Deus-comunhão,
    permuta de amor entre o Pai
    e o Filho no Espírito, é
    capaz de abraçar a história
    do homem, de introduzi-lo no
    seu dinamismo de comunhão,
    que tem, no Pai, a sua
    origem e meta final. Aquele
    que confessa a fé sente-se
    implicado na verdade que
    confessa; não pode
    pronunciar, com verdade, as
    palavras do Credo,
    sem ser por isso mesmo
    transformado, sem mergulhar
    na história de amor que o
    abraça, que dilata o seu ser
    tornando-o parte de uma
    grande comunhão, do sujeito
    último que pronuncia o
    Credo: a Igreja. Todas
    as verdades, em que cremos,
    afirmam o mistério da vida
    nova da fé como caminho de
    comunhão com o Deus Vivo.


    Fé,
    oração e Decálogo

    46.
    Há mais dois
    elementos que são
    essenciais na
    transmissão fiel da
    memória da Igreja. O
    primeiro é a Oração do
    Senhor, o Pai Nosso;
    nela, o cristão aprende
    a partilhar a própria
    experiência espiritual
    de Cristo e começa a ver
    com os olhos d’Ele. A
    partir d’Aquele que é
    Luz da Luz, do Filho
    Unigénito do Pai, também
    nós conhecemos a Deus e
    podemos inflamar outros
    no desejo de se
    aproximarem d’Ele.


    Igualmente importante é
    ainda a ligação entre a fé e
    o Decálogo. Dissemos já que
    a fé se apresenta como um
    caminho, uma estrada a
    percorrer, aberta pelo
    encontro com o Deus vivo;
    por isso, à luz da fé, da
    entrega total ao Deus que
    salva, o Decálogo adquire a
    sua verdade mais profunda,
    contida nas palavras que
    introduzem os Dez
    Mandamentos: « Eu sou o
    Senhor, teu Deus, que te fiz
    sair da terra do Egipto » (Ex
    20, 2). O Decálogo não é
    um conjunto de preceitos
    negativos, mas de indicações
    concretas para sair do
    deserto do « eu »
    auto-referencial, fechado em
    si mesmo, e entrar em
    diálogo com Deus,
    deixando-se abraçar pela sua
    misericórdia a fim de a
    irradiar. Deste modo, a fé
    confessa o amor de Deus,
    origem e sustentáculo de
    tudo, deixa-se mover por
    este amor para caminhar rumo
    à plenitude da comunhão com
    Deus. O Decálogo aparece
    como o caminho da gratidão,
    da resposta de amor, que é
    possível porque, na fé, nos
    abrimos à experiência do
    amor de Deus que nos
    transforma. E este caminho
    recebe uma luz nova de tudo
    aquilo que Jesus ensina no
    Sermão da Montanha (cf.
    Mt 5 - 7).
    Toquei
    assim os quatro elementos
    que resumem o tesouro de
    memória que a Igreja
    transmite: a confissão de
    fé, a celebração dos
    sacramentos, o caminho do
    Decálogo, a oração. À volta
    deles se estruturou
    tradicionalmente a catequese
    da Igreja, como se pode ver
    no
    Catecismo da Igreja
    Católica, instrumento
    fundamental para aquele acto
    com que a Igreja comunica o
    conteúdo inteiro da fé, «
    tudo aquilo que ela é e tudo
    quanto acredita ».[39]


    A unidade
    e a integridade da fé

    47.
    A unidade da Igreja,
    no tempo e no espaço,
    está ligada com a
    unidade da fé: « Há um
    só Corpo e um só
    Espírito, (...) uma só
    fé » (Ef 4, 4-5).
    Hoje poderá parecer
    realizável a união dos
    homens com base num
    compromisso comum, na
    amizade, na partilha da
    mesma sorte com uma meta
    comum; mas sentimos
    muita dificuldade em
    conceber uma unidade na
    mesma verdade;
    parece-nos que uma união
    do género se oporia à
    liberdade do pensamento
    e à autonomia do
    sujeito. Pelo contrário,
    a experiência do amor
    diz-nos que é possível
    termos uma visão comum
    precisamente no amor:
    neste, aprendemos a ver
    a realidade com os olhos
    do outro e isto, longe
    de nos empobrecer,
    enriquece o nosso olhar.
    O amor verdadeiro, à
    medida do amor divino,
    exige a verdade e, no
    olhar comum da verdade
    que é Jesus Cristo,
    torna-se firme e
    profundo. Esta é também
    a alegria da fé: a
    unidade de visão num só
    corpo e num só espírito.
    Neste sentido, São Leão
    Magno podia afirmar: «
    Se a fé não é una, não é
    fé ».[40]

    Qual é o
    segredo desta unidade? A fé
    é una, em primeiro lugar,
    pela unidade de Deus
    conhecido e confessado.
    Todos os artigos de fé se
    referem a Ele, são caminhos
    para conhecer o seu ser e o
    seu agir; por isso, possuem
    uma unidade superior a tudo
    quanto possamos construir
    com o nosso pensamento,
    possuem a unidade que nos
    enriquece, porque se
    comunica a nós e nos torna
    um.
    Depois, a
    fé é una, porque se dirige
    ao único Senhor, à vida de
    Jesus, à história concreta
    que Ele partilha connosco.
    Santo Ireneu de Lião deixou
    isto claro, contrapondo-o
    aos hereges gnósticos. Estes
    sustentavam a existência de
    dois tipos de fé: uma fé
    rude, a fé dos simples,
    imperfeita, que se mantinha
    ao nível da carne de Cristo
    e da contemplação dos seus
    mistérios; e outro tipo de
    fé mais profunda e perfeita,
    a fé verdadeira reservada
    para um círculo restrito de
    iniciados, que se elevava
    com o intelecto para além da
    carne de Jesus rumo aos
    mistérios da divindade
    desconhecida. Contra esta
    pretensão, que ainda em
    nossos dias continua a ter o
    seu encanto e os seus
    seguidores, Santo Ireneu
    reafirma que a fé é uma
    só, porque passa
    sempre pelo ponto concreto
    da encarnação, sem nunca
    superar a carne e a história
    de Cristo, dado que Deus Se
    quis revelar plenamente
    nela. É por isso que não há
    diferença, na fé, entre «
    aquele que é capaz de falar
    dela mais tempo » e « aquele
    que fala pouco », entre
    aquele que é mais dotado e
    quem se mostra menos capaz:
    nem o primeiro pode ampliar
    a fé, nem o segundo
    diminuí-la.[41]

    Por
    último, a fé é una, porque é
    partilhada por toda a
    Igreja, que é um só corpo e
    um só Espírito: na comunhão
    do único sujeito que é a
    Igreja, recebemos um olhar
    comum. Confessando a mesma
    fé, apoiamo-nos sobre a
    mesma rocha, somos
    transformados pelo mesmo
    Espírito de amor, irradiamos uma
    única luz e temos um único
    olhar para penetrar na
    realidade. 48.
    Dado que a fé é uma
    só, deve-se confessar em
    toda a sua pureza e
    integridade.
    Precisamente porque
    todos os artigos da fé
    estão unitariamente
    ligados, negar um deles
    â€" mesmo dos que possam
    parecer menos
    importantes â€" equivale a
    danificar o todo. Cada
    época pode encontrar
    pontos da fé mais fáceis
    ou mais difíceis de
    aceitar; por isso, é
    importante vigiar para
    que se transmita todo o
    depósito da fé (cf. 1
    Tm 6, 20) e para que
    se insista oportunamente
    sobre todos os aspectos
    da confissão de fé. De
    facto, visto que a
    unidade da fé é a
    unidade da Igreja, tirar
    algo à fé é fazê-lo à
    verdade da comunhão. Os
    Padres descreveram a fé
    como um corpo, o corpo
    da verdade, com diversos
    membros, analogamente ao
    que se passa no corpo de
    Cristo com o seu
    prolongamento na
    Igreja.[42] A integridade
    da fé foi associada
    também com a imagem da
    Igreja virgem, com o seu
    amor esponsal fiel a
    Cristo: danificar a fé
    significa danificar a
    comunhão com o Senhor.[43]
    A unidade da fé é, por
    conseguinte, a de um
    organismo vivo, como bem
    evidenciou o Beato John
    Henry Newman, quando
    enumera, entre as notas
    características para
    distinguir a
    continuidade da doutrina
    no tempo, o seu poder de
    assimilar em si tudo o
    que encontra, nos diversos âmbitos em que
    se torna presente, nas
    diversas culturas que
    encontra,[44] tudo
    purificando e levando à sua
    melhor expressão. É assim
    que a fé se mostra
    universal, católica, porque
    a sua luz cresce para
    iluminar todo o universo,
    toda a história.
    49.
    Como serviço à
    unidade da fé e à sua
    transmissão íntegra, o
    Senhor deu à Igreja o
    dom da sucessão
    apostólica. Por seu
    intermédio, fica
    garantida a continuidade
    da memória da Igreja, e
    é possível beber, com
    certeza, na fonte pura
    donde surge a fé; assim
    a garantia da ligação
    com a origem é-nos dada
    por pessoas vivas, o que
    equivale à fé viva que a
    Igreja transmite. Esta
    fé viva assenta sobre a
    fidelidade das
    testemunhas que foram
    escolhidas pelo Senhor
    para tal tarefa; por
    isso, o magistério fala
    sempre em obediência à
    Palavra originária,
    sobre a qual se baseia a
    fé, e é fiável porque se
    entrega à Palavra que
    escuta, guarda e
    expõe.[45] No discurso de
    despedida aos anciãos de
    Éfeso, em Mileto,
    referido por São Lucas
    nos Actos dos Apóstolos,
    São Paulo atesta que
    cumpriu o encargo, que
    lhe foi confiado pelo
    Senhor, de lhes anunciar
    toda a vontade de Deus
    (cf. Act 20, 27);
    é graças ao magistério
    da Igreja que nos pode
    chegar, íntegra, esta
    vontade e, com ela, a
    alegria de a podermos
    cumprir plenamente.

     
    CAPÍTULO IV

    DEUS
    PREPARA

    PARA ELES UMA CIDADE

    (cf.
    Heb 11, 16)
     


    A fé e o
    bem comum

    50.
    Ao apresentar a
    história dos patriarcas
    e dos justos do Antigo
    Testamento, a Carta aos
    Hebreus põe em relevo um
    aspecto essencial da sua
    fé; esta não se
    apresenta apenas como um
    caminho, mas também como
    edificação, preparação
    de um lugar onde os
    homens possam habitar
    uns com os outros. O
    primeiro construtor é
    Noé, que, na arca,
    consegue salvar a sua
    família (cf. Heb
    11, 7). Depois aparece
    Abraão, de quem se diz
    que, pela fé, habitara
    em tendas, esperando a
    cidade de alicerces
    firmes (cf. Heb
    11, 9-10). Vemos assim
    surgir, relacionada com
    a fé, uma nova
    fiabilidade, uma nova
    solidez, que só Deus
    pode dar. Se o homem de
    fé assenta sobre o
    Deus-Amen, o Deus fiel
    (cf. Is 65, 16),
    tornando-se assim firme
    ele mesmo, podemos
    acrescentar que a
    firmeza da fé se refere
    também à cidade que Deus
    está a preparar para o
    homem. A fé revela quão
    firmes podem ser os
    vínculos entre os
    homens, quando Deus Se
    torna presente no meio
    deles. Não evoca apenas
    uma solidez interior,
    uma convicção firme do
    crente; a fé ilumina
    também as relações entre
    os homens, porque nasce
    do amor e segue a
    dinâmica do amor de
    Deus. O Deus fiável dá
    aos homens uma cidade
    fiável.

    51.
    Devido precisamente
    à sua ligação com o amor
    (cf. Gl 5, 6), a
    luz da fé coloca-se ao
    serviço concreto da
    justiça, do direito e da
    paz. A fé nasce do
    encontro com o amor
    gerador de Deus que
    mostra o sentido e a
    bondade da nossa vida;
    esta é iluminada na
    medida em que entra no
    dinamismo aberto por
    este amor, isto é,
    enquanto se torna
    caminho e exercício para
    a plenitude do amor. A
    luz da fé é capaz de
    valorizar a riqueza das
    relações humanas, a sua
    capacidade de
    perdurarem, serem
    fiáveis, enriquecerem a
    vida comum. A fé não
    afasta do mundo, nem é
    alheia ao esforço
    concreto dos nossos
    contemporâneos. Sem um
    amor fiável, nada
    poderia manter
    verdadeiramente unidos
    os homens: a unidade
    entre eles seria
    concebível apenas
    enquanto fundada sobre a
    utilidade, a conjugação
    dos interesses, o medo,
    mas não sobre a beleza
    de viverem juntos, nem
    sobre a alegria que a
    simples presença do
    outro pode gerar. A fé
    faz compreender a
    arquitectura das
    relações humanas, porque
    identifica o seu
    fundamento último e
    destino definitivo em
    Deus, no seu amor, e
    assim ilumina a arte da
    sua construção,
    tornando-se um serviço
    ao bem comum. Por isso,
    a fé é um bem para
    todos, um bem comum: a
    sua luz não ilumina
    apenas o âmbito da
    Igreja nem serve somente
    para construir uma
    cidade eterna no além,
    mas ajuda também a
    construir as nossas
    sociedades de modo que
    caminhem para um futuro
    de esperança. A Carta
    aos Hebreus oferece um
    exemplo disto mesmo, ao
    nomear entre os homens
    de fé Samuel e David, a quem a fé permitiu
    « exercerem a justiça » (11,
    33). A expressão refere-se
    aqui à sua justiça no
    governar, àquela sabedoria
    que traz a paz ao povo (cf.
    1 Sm 12, 3-5; 2 Sm
    8, 15). As mãos da fé
    levantam-se para o céu, mas
    fazem-no ao mesmo tempo que
    edificam, na caridade, uma
    cidade construída sobre
    relações que têm como
    alicerce o amor de Deus.


    A fé e a
    família

    52.
    No caminho de Abraão
    para a cidade futura, a
    Carta aos Hebreus alude
    à bênção que se
    transmite dos pais aos
    filhos (cf. 11, 20-21).
    O primeiro âmbito da
    cidade dos homens
    iluminado pela fé é a
    família; penso, antes de
    mais nada, na união
    estável do homem e da
    mulher no matrimónio.
    Tal união nasce do seu
    amor, sinal e presença
    do amor de Deus, nasce
    do reconhecimento e
    aceitação do bem que é a
    diferença sexual, em
    virtude da qual os
    cônjuges se podem unir
    numa só carne (cf. Gn
    2, 24) e são capazes
    de gerar uma nova vida,
    manifestação da bondade
    do Criador, da sua
    sabedoria e do seu
    desígnio de amor.
    Fundados sobre este
    amor, homem e mulher
    podem prometer-se amor
    mútuo com um gesto que
    compromete a vida
    inteira e que lembra
    muitos traços da fé:
    prometer um amor que
    dure para sempre é
    possível quando se
    descobre um desígnio
    maior que os próprios
    projectos, que nos
    sustenta e permite doar
    o futuro inteiro à
    pessoa amada. Depois, a
    fé pode ajudar a
    individuar em toda a sua
    profundidade e riqueza a

    geração dos filhos,
    porque faz reconhecer nela o
    amor criador que nos
    dá e nos entrega o mistério
    de uma nova pessoa; foi
    assim que Sara, pela sua fé,
    se tornou mãe, apoiando-se
    na fidelidade de Deus à sua
    promessa (cf. Heb 11,
    11).

    53. Em família, a fé
    acompanha todas as idades da
    vida, a começar pela
    infância: as crianças
    aprendem a confiar no amor
    de seus pais. Por isso, é
    importante que os pais
    cultivem práticas de fé
    comuns na família, que
    acompanhem o amadurecimento
    da fé dos filhos. Sobretudo
    os jovens, que atravessam
    uma idade da vida tão
    complexa, rica e importante
    para a fé, devem sentir a
    proximidade e a atenção da
    família e da comunidade
    eclesial no seu caminho de
    crescimento da fé. Todos
    vimos como, nas Jornadas
    Mundiais da Juventude, os
    jovens mostram a alegria da
    fé, o compromisso de viver
    uma fé cada vez mais sólida
    e generosa. Os jovens têm o
    desejo de uma vida grande; o
    encontro com Cristo, o
    deixar-se conquistar e guiar
    pelo seu amor alarga o
    horizonte da existência,
    dá-lhe uma esperança firme
    que não desilude. A fé não é
    um refúgio para gente sem
    coragem, mas a dilatação da
    vida: faz descobrir uma
    grande chamada â€" a vocação
    ao amor â€" e assegura que
    este amor é fiável, que vale
    a pena entregar-se a ele,
    porque o seu fundamento se
    encontra na fidelidade de
    Deus, que é mais forte do
    que toda a nossa
    fragilidade.


    Uma luz
    para a vida em sociedade

    54.
    Assimilada e
    aprofundada em família,
    a fé torna-se luz para
    iluminar todas as
    relações sociais. Como
    experiência da
    paternidade e da
    misericórdia de Deus,
    dilata-se depois em
    caminho fraterno. Na
    Idade Moderna,
    procurou-se construir a
    fraternidade universal
    entre os homens,
    baseando-se na sua
    igualdade; mas, pouco a
    pouco, fomos
    compreendendo que esta
    fraternidade, privada do
    referimento a um Pai
    comum como seu
    fundamento último, não
    consegue subsistir; por
    isso, é necessário
    voltar à verdadeira raiz
    da fraternidade. Desde o
    seu início, a história
    de fé foi uma história
    de fraternidade, embora
    não desprovida de
    conflitos. Deus chama
    Abraão para sair da sua
    terra, prometendo fazer
    dele uma única e grande
    nação, um grande povo,
    sobre o qual repousa a
    Bênção divina (cf. Gn
    12, 1-3). À medida
    que a história da
    salvação avança, o homem
    descobre que Deus quer
    fazer a todos participar
    como irmãos da única
    bênção, que encontra a
    sua plenitude em Jesus,
    para que todos se tornem
    um só. O amor
    inexaurível do Pai é-nos
    comunicado em Jesus,
    também através da
    presença do irmão. A fé
    ensina-nos a ver que, em
    cada homem, há uma
    bênção para mim, que a
    luz do rosto de Deus me
    ilumina através do rosto
    do irmão.

    Quantos
    benefícios trouxe o olhar da
    fé cristã à cidade dos
    homens para a sua vida em
    comum! Graças à fé,
    compreendemos a dignidade
    única de cada pessoa, que
    não era tão evidente no mundo
    antigo. No século II, o
    pagão Celso censurava os
    cristãos por algo que lhe
    parecia uma ilusão e um
    engano: pensar que Deus
    tivesse criado o mundo para
    o homem, colocando-o no
    vértice do universo inteiro.
    « Porquê pretender que [a
    verdura] cresça para os
    homens, em vez de crescer
    para os mais selvagens dos
    animais sem razão? »[46]
    « Se olhássemos a terra do
    alto do céu, que diferença
    se nos ofereceria entre as
    nossas actividades e as das
    formigas e das abelhas? »[47]
    No centro da fé bíblica, há
    o amor de Deus, o seu
    cuidado concreto por cada
    pessoa, o seu desejo de
    salvação que abraça toda a
    humanidade e a criação
    inteira e que atinge o
    clímax na encarnação, morte
    e ressurreição de Jesus
    Cristo. Quando se obscurece
    esta realidade, falta o
    critério para individuar o
    que torna preciosa e única a
    vida do homem; e este perde
    o seu lugar no universo,
    extravia-se na natureza,
    renunciando à própria
    responsabilidade moral, ou
    então pretende ser árbitro
    absoluto, arrogando-se um
    poder de manipulação sem
    limites. 55.
    Além disso a fé, ao
    revelar-nos o amor de
    Deus Criador, faz-nos
    olhar com maior respeito
    para a natureza,
    fazendo-nos reconhecer
    nela uma gramática
    escrita por Ele e uma
    habitação que nos foi
    confiada para ser
    cultivada e guardada;
    ajuda-nos a encontrar
    modelos de progresso,
    que não se baseiem
    apenas na utilidade e no
    lucro mas considerem a
    criação como dom, de que
    todos somos devedores;
    ensina-nos a individuar
    formas justas de governo,
    reconhecendo que a
    autoridade vem de Deus para
    estar ao serviço do bem
    comum. A fé afirma também a
    possibilidade do perdão, que
    muitas vezes requer tempo,
    canseira, paciência e
    empenho; um perdão possível
    quando se descobre que o bem
    é sempre mais originário e
    mais forte que o mal, que a
    palavra com que Deus afirma
    a nossa vida é mais profunda
    do que todas as nossas
    negações. Aliás, mesmo dum
    ponto de vista simplesmente
    antropológico, a unidade é
    superior ao conflito;
    devemos preocupar-nos também
    com o conflito, mas
    vivendo-o de tal modo que
    nos leve a resolvê-lo, a
    superá-lo, como elo duma
    cadeia, num avanço para a
    unidade.
    Quando a
    fé esmorece, há o risco de
    esmorecerem também os
    fundamentos do viver, como
    advertia o poeta Thomas
    Sterls Eliot: « Precisais
    porventura que se vos diga
    que até aqueles modestos
    sucessos / que vos permitem
    ser orgulhosos de uma
    sociedade educada /
    dificilmente sobreviveriam à
    fé, a que devem o seu
    significado? »[48] Se
    tiramos a fé em Deus das
    nossas cidades,
    enfraquecer-se-á a confiança
    entre nós, apenas o medo nos
    manterá unidos, e a
    estabilidade ficará
    ameaçada. Afirma a Carta aos
    Hebreus: « Deus não Se
    envergonha de ser chamado o "seu Deus", porque
    preparou para eles uma
    cidade » (Heb 11,
    16). A expressão « não se
    envergonha » tem conotado um
    reconhecimento público:
    pretende-se afirmar que
    Deus, com o seu agir
    concreto, confessa
    publicamente a sua presença
    entre nós, o seu desejo de
    tornar firmes as relações
    entre os homens. Porventura
    vamos ser nós a
    envergonhar-nos de chamar a
    Deus « o nosso Deus »?
    Seremos por acaso nós a
    recusar-nos a confessá-Lo
    como tal na nossa vida
    pública, a propor a grandeza
    da vida comum que Ele torna
    possível? A fé ilumina a
    vida social: possui uma luz
    criadora para cada momento
    novo da história, porque
    coloca todos os
    acontecimentos em relação
    com a origem e o destino de
    tudo no Pai que nos ama.


    Uma força
    consoladora no sofrimento



    56.
    São Paulo, falando
    aos cristãos de Corinto
    das suas tribulações e
    sofrimentos, coloca a
    sua fé em relação com a
    pregação do Evangelho.
    De facto, diz que nele
    se cumpre esta passagem
    da Escritura: «
    Acreditei e por isso
    falei » (2 Cor 4,
    13). O Apóstolo
    refere-se a uma frase do
    Salmo 116, onde o
    salmista exclama: « Eu
    tinha confiança, mesmo
    quando disse: "A minha
    aflição é muito grande!"
    » (v. 10). Falar da fé
    comporta frequentemente
    falar também de provas
    dolorosas, mas é
    precisamente nelas que
    São Paulo vê o anúncio
    mais convincente do
    Evangelho, porque é na
    fraqueza e no sofrimento
    que sobressai e se
    descobre o poder de Deus
    que supera a nossa fraqueza e o nosso
    sofrimento. O próprio
    Apóstolo se encontra numa
    situação de morte que
    redunda em vida para os
    cristãos (cf. 2 Cor
    4, 7-12). Na hora da prova,
    a fé ilumina-nos; e é
    precisamente no sofrimento e
    na fraqueza que se torna
    claro como « não nos
    pregamos a nós mesmos, mas a
    Cristo Jesus, o Senhor » (2
    Cor 4, 5). O capítulo 11
    da Carta aos Hebreus termina
    com a referência a quantos
    sofreram pela fé, entre os
    quais ocupa um lugar
    particular Moisés que tomou
    sobre si a humilhação de
    Cristo (cf. vv. 26.35-38). O
    cristão sabe que o
    sofrimento não pode ser
    eliminado, mas pode adquirir
    um sentido: pode tornar-se
    acto de amor, entrega nas
    mãos de Deus que não nos
    abandona e, deste modo, ser
    uma etapa de crescimento na
    fé e no amor. Contemplando a
    união de Cristo com o Pai,
    mesmo no momento de maior
    sofrimento na cruz (cf.
    Mc 15, 34), o cristão
    aprende a participar no
    olhar próprio de Jesus; até
    a morte fica iluminada,
    podendo ser vivida como a
    última chamada da fé, o
    último « Sai da tua terra »
    (cf. Gn 12, 1), o
    último « Vem! » pronunciado
    pelo Pai, a quem nos
    entregamos com a confiança
    de que Ele nos tornará
    firmes também na passagem
    definitiva.

    57. A luz da fé não nos
    faz esquecer os sofrimentos
    do mundo. Os que sofrem
    foram mediadores de luz para
    tantos homens e mulheres de
    fé; tal foi o leproso para
    São Francisco de Assis, ou
    os pobres para a Beata
    Teresa de Calcutá.
    Compreenderam o mistério que
    há neles; aproximando-se deles, certamente
    não cancelaram todos os seus
    sofrimentos, nem puderam
    explicar todo o mal. A fé
    não é luz que dissipa todas
    as nossas trevas, mas
    lâmpada que guia os nossos
    passos na noite, e isto
    basta para o caminho. Ao
    homem que sofre, Deus não dá
    um raciocínio que explique
    tudo, mas oferece a sua
    resposta sob a forma duma
    presença que o acompanha,
    duma história de bem que se
    une a cada história de
    sofrimento para nela abrir
    uma brecha de luz. Em
    Cristo, o próprio Deus quis
    partilhar connosco esta
    estrada e oferecer-nos o seu
    olhar para nela vermos a
    luz. Cristo é aquele que,
    tendo suportado a dor, Se
    tornou « autor e consumador
    da fé » (Heb 12, 2).

    O
    sofrimento recorda-nos que o
    serviço da fé ao bem comum é
    sempre serviço de esperança
    que nos faz olhar em frente,
    sabendo que só a partir de
    Deus, do futuro que vem de
    Jesus ressuscitado, é que a
    nossa sociedade pode
    encontrar alicerces sólidos
    e duradouros. Neste sentido,
    a fé está unida à esperança,
    porque, embora a nossa
    morada aqui na terra se vá
    destruindo, há uma habitação
    eterna que Deus já inaugurou
    em Cristo, no seu corpo (cf.
    2 Cor 4, 16 â€" 5, 5).
    Assim, o dinamismo de fé,
    esperança e caridade (cf.
    1 Ts 1, 3; 1 Cor
    13, 13) faz-nos abraçar as
    preocupações de todos os
    homens, no nosso caminho
    rumo àquela cidade, « cujo
    arquitecto e construtor é o
    próprio Deus » (Heb
    11, 10), porque « a
    esperança não engana » (Rm
    5, 5).
    Unida à fé e à caridade,
    a esperança projecta-nos
    para um futuro certo, que se
    coloca numa perspectiva
    diferente relativamente às
    propostas ilusórias dos
    ídolos do mundo, mas que dá
    novo impulso e nova força à
    vida de todos os dias. Não
    deixemos que nos roubem a
    esperança, nem permitamos
    que esta seja anulada por
    soluções e propostas
    imediatas que nos bloqueiam
    no caminho, que « fragmentam
    » o tempo transformando-o em
    espaço. O tempo é sempre
    superior ao espaço: o espaço
    cristaliza os processos, ao
    passo que o tempo projecta
    para o futuro e impele a
    caminhar na esperança.
     
    FELIZ
    DAQUELA QUE ACREDITOU

     (cf. Lc 1, 45)
    58.
    Na parábola do
    semeador, São Lucas
    refere estas palavras
    com que o Senhor explica
    o significado da « terra
    boa »: « São aqueles
    que, tendo ouvido a
    palavra com um coração
    bom e virtuoso,
    conservam-na e dão fruto
    com a sua perseverança »
    (Lc 8, 15). No
    contexto do Evangelho de
    Lucas, a menção do
    coração bom e virtuoso,
    em referência à Palavra
    ouvida e conservada,
    pode constituir um
    retrato implícito da fé
    da Virgem Maria; o
    próprio evangelista nos
    fala da memória de
    Maria, dizendo que
    conservava no coração
    tudo aquilo que ouvia e
    via, de modo que a
    Palavra produzisse fruto
    na sua vida. A Mãe do
    Senhor é ícone perfeito
    da fé, como dirá Santa
    Isabel: « Feliz de ti
    que acreditaste » (Lc
    1, 45).



    Em Maria,
    Filha de Sião, tem
    cumprimento a longa história
    de fé do Antigo Testamento,
    com a narração de tantas
    mulheres fiéis a começar por
    Sara; mulheres que eram,
    juntamente com os
    Patriarcas, o lugar onde a
    promessa de Deus se cumpria
    e a vida nova desabrochava.
    Na plenitude dos tempos, a
    Palavra de Deus dirigiu-se a
    Maria, e Ela acolheu-a com
    todo o seu ser, no seu
    coração, para que n’Ela
    tomasse carne e nascesse
    como luz para os homens. O
    mártir São Justino, na obra
    Diálogo com Trifão,
    tem uma expressão
    significativa ao dizer que
    Maria, quando aceitou a
    mensagem do Anjo, concebeu « fé e
    alegria ».[49] De
    facto, na Mãe de Jesus, a fé
    mostrou-se cheia de fruto e,
    quando a nossa vida
    espiritual dá fruto,
    enchemo-nos de alegria, que
    é o sinal mais claro da
    grandeza da fé. Na sua vida,
    Maria realizou a
    peregrinação da fé seguindo
    o seu Filho.[50] Assim, em
    Maria, o caminho de fé do
    Antigo Testamento foi
    assumido no seguimento de
    Jesus e deixa-se transformar
    por Ele, entrando no olhar
    próprio do Filho de Deus
    encarnado. 59.
    Podemos dizer que,
    na Bem-aventurada Virgem
    Maria, se cumpre aquilo
    em que insisti
    anteriormente, isto é,
    que o crente se envolve
    todo na sua confissão de
    fé. Pelo seu vínculo com
    Jesus, Maria está
    intimamente associada
    com aquilo que
    acreditamos. Na
    concepção virginal de
    Maria, temos um sinal
    claro da filiação divina
    de Cristo: a origem
    eterna de Cristo está no
    Pai â€" Ele é o Filho em
    sentido total e único â€"
    e por isso nasce, no
    tempo, sem intervenção
    do homem. Sendo Filho,
    Jesus pode trazer ao
    mundo um novo início e
    uma nova luz, a
    plenitude do amor fiel
    de Deus que Se entrega
    aos homens. Por outro
    lado, a verdadeira
    maternidade de Maria
    garantiu, ao Filho de
    Deus, uma verdadeira
    história humana, uma
    verdadeira carne na qual
    morrerá na cruz e
    ressuscitará dos mortos.
    Maria acompanhá-Lo-á até
    à cruz (cf. Jo
    19, 25), donde a sua
    maternidade se estenderá
    a todo o discípulo de
    seu Filho (cf. Jo
    19, 26-27). Estará
    presente também no Cenáculo,
    depois da ressurreição e
    ascensão de Jesus, para
    implorar com os Apóstolos o
    dom do Espírito (cf.
    Act 1, 14). O
    movimento de amor entre o
    Pai e o Filho no Espírito
    percorreu a nossa história;
    Cristo atrai-nos a Si para
    nos poder salvar (cf. Jo
    12, 32). No centro da
    fé, encontra-se a confissão
    de Jesus, Filho de Deus,
    nascido de mulher, que nos
    introduz, pelo dom do
    Espírito Santo, na filiação
    adoptiva (cf. Gl 4,
    4-6).
    60.
    A Maria, Mãe da
    Igreja e Mãe da nossa
    fé, nos dirigimos,
    rezando-Lhe:


    Ajudai, ó
    Mãe, a nossa fé.
    Abri o
    nosso ouvido à Palavra, para
    reconhecermos a voz de Deus
    e a sua chamada.
    Despertai
    em nós o desejo de seguir os
    seus passos, saindo da nossa
    terra e acolhendo a sua
    promessa.
    Ajudai-nos a deixar-nos
    tocar pelo seu amor, para
    podermos tocá-Lo com a fé.

    Ajudai-nos a confiar-nos
    plenamente a Ele, a
    crer no seu amor, sobretudo
    nos momentos de tribulação e
    cruz, quando a nossa fé é
    chamada a amadurecer.
    Semeai,
    na nossa fé, a alegria do
    Ressuscitado.
    Recordai-nos que quem crê
    nunca está sozinho.
    Ensinai-nos a ver com os
    olhos de Jesus, para que Ele
    seja luz no nosso caminho. E
    que esta luz da fé cresça
    sempre em nós até chegar aquele
    dia sem ocaso que é o
    próprio Cristo, vosso Filho,
    nosso Senhor.

    Dado em
    Roma, junto de São Pedro, no
    dia 29 de Junho, solenidade
    dos Apóstolos São Pedro e
    São Paulo, do ano 2013,
    primeiro de Pontificado.
     

    FRANCISCUS


     

    [1] 
    Dialogus cum
    Tryphone Iudaeo, 121, 2:
    PG 6, 758.
    [2]  Clemente de
    Alexandria, Protrepticus,
    IX: PG 8, 195.
    [3] « Brief an
    Elisabeth Nietzsche (11 de
    Junho de 1865) », in:
    Werke in drei Bänden
    (Munique 1954), 953-954.

    [4] Divina
    Comédia, Paraíso, XXIV,
    145-147.
    [5] Acta
    Sanctorum, Iunii, I, 21.

    [6]
    « Embora o Concílio não
    trate expressamente da fé,
    todavia fala dela em cada
    página, reconhece o seu
    carácter vital e
    sobrenatural, supõe-na
    íntegra e forte e constrói
    sobre ela os seus
    ensinamentos. Bastaria
    lembrar as declarações
    conciliares (...) para nos
    darmos conta da importância
    essencial que o Concílio,
    coerente com a tradição
    doutrinal da Igreja, atribui
    à fé, à verdadeira fé,
    aquela que tem Cristo como
    fonte e, como canal, o
    magistério da Igreja »
    [Paulo VI, Audiência
    Geral (8 de Março de
    1967): Insegnamenti V
    (1967), 705].

    [7] Cf., por
    exemplo, Conc. Ecum. Vat. I, Const. dogm. sobre a fé
    católica Dei Filius,
    III: DS 3008-3020;
    Conc. Ecum. Vat. II, Const.
    dogm. sobre a divina
    Revelação
    Dei Verbum,
    5;
    Catecismo da Igreja
    Católica, 153-165.


    [8]  Cf.
    Catechesis, V, 1: PG
    33, 505A.

    [9] 
    Enarratio in
    Psalmum, 32, II, s. I,
    9: PL 36, 284.


    [10] Martin Buber,
    Die Erzählungen der
    Chassidim (Zurique
    1949), 793.
    [11] Émile
    (Paris 1966), 387.
    [12]
    Lettrè à
    Christophe de Beaumont
    (Lausanne 1993), 110.


    [13] Cf. In
    evangelium Johannis
    tractatus, 45, 9: PL
    35, 1722- 1723.
    [14] Parte II, IV.
    [15] De
    continentia, 4, 11:
    PL 40, 356 (« ab eo qui
    fecit te noli deficere nec
    ad te »).

    [16] « Vom
    Wesen katholischer
    Weltanschauung (1923) », in:
    Unterscheidung des
    Christlichen. Gesammelte
    Studien 1923-1963 (Mainz
    1963), 24.

    [17]
    Confessiones,
    XI, 30, 40: PL 32,
    825.

    [18] Cf. ibid.:
    o. c., 825-826.

    [19]
    Cf. G. H. von Wright
    (coord.), Vermischte
    Bemerkungen / Culture and
    Value (Oxford 1991),
    32-33 e 61-64.

    [20] Cf. Homiliae
    in Evangelia, II, 27, 4:
    PL 76, 1207 (« amor
    ipse notitia est »).

    [21]  Cf.
    Expositio super Cantica
    Canticorum, XVIII, 88:
    CCL, Continuatio
    Mediaevalis, 87, 67.

    [22] 
    Ibid.,
    XIX, 90: o. c., 87,
    69.


    [23] « A Deus que
    revela é devida a
    "obediência da fé" (Rm
    16, 26; cf. Rm 1,
    5; 2 Cor 10, 5-6);
    pela fé, o homem entrega-se
    total e livremente a Deus,
    oferecendo a Deus revelador
    o obséquio pleno da
    inteligência e da vontade e
    prestando voluntário
    assentimento à sua
    revelação. Para prestar esta
    adesão da fé, são
    necessários a prévia e
    concomitante ajuda da graça
    divina e os
    interiores auxílios do
    Espírito Santo, o qual move
    e converte a Deus o coração,
    abre os olhos do
    entendimento, e dá a todos a
    suavidade em aceitar e crer
    a verdade. Para que a
    compreensão da revelação
    seja sempre mais profunda, o
    mesmo Espírito Santo
    aperfeiçoa sem cessar a fé
    mediante os seus dons » (Conc.
    Ecum. Vat. II, Const. dogm.
    sobre a divina Revelação
    Dei Verbum, 5).

    [24]
    Cf. Heinrich Schlier, «
    Meditationen über den
    Johanneischen Begriff der
    Wahrheit », in: Besinnung
    auf das Neue Testament.
    Exegetische Aufsätze und
    Vorträge 2 (Friburgo,
    Basel, Viena 1959), 272.

    [25] 
    Cf. Summa theologiae,
    III, q. 55, a. 2, ad 1.


    [26] Sermo
    229/L, 2: PLS 2, 576
    (« Tangere autem corde, hoc
    est credere »).

    [27] Cf. n.º 73:
    AAS (1999), 61-62.

    [28] 
    Cf. Confessiones,
    VIII, 12, 29: PL 32,
    762.

    [29] 
    De Trinitate, XV, 11,
    20: PL 42, 1071.

    [30] 
    Cf. De civitate Dei,
    XXII, 30, 5: PL 41,
    804.


    [31]
    Cf. Congr. para a Doutrina
    da Fé, Decl.
    Dominus
    Iesus (6 de Agosto de
    2000), 15: AAS 92
    (2000), 756.
    [32]
    Demonstratio apostolicae
    praedicationis, 24:
    SC 406, 117.

    [33] Cf. Boaventura,
    Breviloquium, Prol.:
    Opera Omnia, V (Quaracchi
    1891), 201; In I librum
    sententiarum, Proem., q.
    1, resp.: Opera Omnia,
    I (Quaracchi 1891), 7;
    Tomásde Aquino,

    Summa
    theologiae, I, q.
    1.

    [34] Cf. De
    Baptismo, 20, 5: CCL
    1, 295.
    [35]
    Const. dogm. sobre a divina
    Revelação
    Dei Verbum,
    8.
    [36] Cf. Conc. Ecum.
    Vat. II, Const. sobre a
    sagrada Liturgia
    Sacrosanctum Concilium,
    59.
    [37] Cf. Epistula
    Barnabae, 11, 5: SC
    172, 162.
    [38] Cf. De
    nuptiis et concupiscentia,
    I, 4, 5: PL 44, 413
    (« Habent quippe intentionem
    generandi regenerandos, ut
    qui ex eis saeculi filii
    nascuntur in Dei filios
    renascantur »).
    [39]
    Conc. Ecum. Vat. II, Const.
    dogm. sobre a divina
    Revelação
    Dei Verbum,
    8.
    [40]
    In nativitate Domini
    sermo, 4, 6: SC
    22, 110.
    [41]
    Cf. Ireneu, Adversus
    haereses, I, 10, 2:
    SC 264, 160.

    [42] Cf. ibid.,
    II, 27, 1: o. c.,
    294, 264.

    [43] Cf. Agostinho,
    De sancta virginitate,
    48, 48: PL 40, 424-
    425 (« Servatur et in fide
    inviolata quaedam castitas
    virginalis, qua Ecclesia uni
    viro virgo casta cooptatur
    »).

    [44] Cf. An Essay
    on the Development of
    Christian Doctrine (Uniform
    Edition: Longmans, Green and
    Company, Londres 1868-1881),
    185-189.

    [45]  Cf. Conc. Ecum.
    Vat. II, Const. dogm. sobre
    a divina Revelação
    Dei Verbum, 10.

    [46] Orígenes,
    Contra Celsum, IV, 75:
    SC 136, 372.

    [47]
    Ibid.,
    85: o. c., 136, 394.

    [48]
    « Choruses from The Rock
    », in: The Collected
    Poems and Plays
    1909-1950 (Nova Iorque
    1980), 106.

    [49] Cf. Dialogus
    cum Tryphone Iudaeo,
    100, 5: PG 6, 710.

    [50] Cf. Conc. Ecum. Vat.
    II, Const. dogm. sobre a Igreja
    Lumen gentium, 58.
     

     
















    © Copyright - Libreria
    Editrice Vaticana
    2.

    Nova aparição, hoje, de Bento XVI em público...a própria lu

    Enviado por: "Jordan Perdigao" jordanperdigao@yahoo.com.br   jordanperdigao

    Sex, 5 de Jul de 2013 12:43 pm

    3.

    Papa Francisco será indicado ao Nobel da Paz por judeus argentino

    Enviado por: "Vicente" luviga@gmail.com   vicentegargiulo

    Sex, 5 de Jul de 2013 6:39 pm




    http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/afp/2013/07/05/papa-francisco-sera-indicado-ao-nobel-da-paz-por-judeus-argentinos.htm

    Papa Francisco será indicado ao Nobel da Paz por judeus argentinos

    CIDADE DO VATICANO, 05 Jul 2013 (AFP) - O papa Francisco recebeu nesta
    sexta-feira no Vaticano um grupo de nove familiares das vítimas do
    atentado à Associação Mutual Israelita Argentina (Amia) de Buenos Aires,
    que pretende propor o nome do sumo pontífice para o Prêmio Nobel da Paz,
    anunciaram em entrevista coletiva.

    Segundo o grupo, o papa argentino é um grande promotor do diálogo
    interreligioso.

    Os visitantes disseram ter ficado muito emocionados com o encontro com
    Sua Santidade, que os recebeu com "muito afeto" em sua residência de
    Santa Marta. O encontro durou uma hora e meia.

    "Judeus e católicos precisam de respeito", disse Sergio Burstein, que
    está no grupo. "Nossa tarefa em busca da justiça e da verdade se baseia
    em quatro pilares: respeito, diálogo, justiça baseada na verdade e paz",
    acrescentou.

    Burstein contou que, quando o papa ouviu isso, disse a todos: "Vou lhes
    acompanhar nesse caminho".

    Quando era cardeal em Buenos Aires, Jorge Bergoglio esteve presente em
    várias das cerimônias realizadas todo dia 19 de julho, dia do atentado
    cometido há 19 anos contra a Amia, lembraram.

    Sobre a proposta do grupo para o Prêmio Nobel da Paz, Francisco disse
    que nunca aceita títulos "honoris causa", nem outras distinções, mas
    que, tratando-se dos familiares das vítimas do atentado à Amia, não
    podia se opor.

    Várias das mulheres que assistiram ao encontro, todas mães de jovens
    mortos no atentado, sensibilizaram-se com o fato de o líder de uma outra
    religião tê-las recebido de forma tão acolhedora.

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    Jesus, oculto na Hóstia, é tudo para mim




    “Se não fosse a Santa Comunhão, eu estaria caindo continuamente. A única coisa que me sustenta é a Santa Comunhão. Dela tiro forças, nela está o meu vigor. Tenho medo da vida, nos dias em que não recebo a Santa Comunhão. Tenho medo de mim mesma. Jesus, oculto na Hóstia, é tudo para mim. Do Sacrário tiro força, vigor, coragem e luz. Aí busco alívio nos momentos de aflição. Eu não saberia dar glória a Deus, se não tivesse a Eucaristia no meu coração.”



    (Diário de Santa Faustina, n. 1037)

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