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    quinta-feira, 17 de maio de 2012

    INTERVENÇÃO DE DOM ELIO SGRECCIA POR OCASIÃO DA RESOLUÇÃO DO PARLAMENTO EUROPEU SOBRE A "SAÚDE E OS DIREITOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS" (GENÉSICOS)


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    PONTIFÍCIA ACADEMIA PARA A VIDA

    INTERVENÇÃO DE DOM ELIO SGRECCIA
    POR OCASIÃO DA RESOLUÇÃO DO PARLAMENTO
    EUROPEU SOBRE A "SAÚDE E OS DIREITOS SEXUAIS
    E REPRODUTIVOS" (GENÉSICOS)




    A Resolução do Parlamento Europeu "sobre a saúde e os direitos sexuais e reprodutivos (genésicos)", aprovada no dia 3 de Julho de 2002 com 280 votos a favor, 240 contrários e 28 abstenções, foi imediatamente comentada pela imprensa com diferentes avaliações, algumas delas muito superficiais. Houve quem falasse de sala "dividiva em duas". De facto, se por uma diferença que não deve ser descurada de votos prevaleceu a opinião favorável ao texto parlamentar, regista-se uma consistente, e parece também aumentada, expressão de vozes contrárias, que devem ser vivamente encorajadas, para um adequado uso do texto nas políticas que dele derivarão.

    O texto provinha da "Comissão dos direitos da mulher e das iguais oportunidades", activa no âmbito da mesmo Parlamento. Esta proveniência conota em sentido reivindicativo e unilateral o próprio texto que, no debate final, recebeu apenas poucas e não muito significativas modificações.

    A primeira anotação que deve ser feita, diz respeito à natureza jurídica do texto aprovado. Já foi observado por alguns comentários da rádio e da imprensa que não se trata de um texto vinculativo para os Parlamentos Nacionais, o que todos sabem; contudo, consideramos que uma Resolução do Parlamento Europeu não é uma simples mensagem que exprime a convicção de um grupo, mas que representa um facto cultural e político sério; de facto, ele provém de um Parlamento eleito directamente pelos cidadãos europeus e exprime uma vontade directiva, mas certamente não vinculativo, nem esperamos irreformável, mas tem um peso orientador. Por isso, um tal documento, devido à fonte da qual provém, deve preocupar, especialmente quando se consideram os seus conteúdos.

    Os conteúdos não são apenas de carácter técnico nem sequer de ordem económico-financeira, nem políticos; são sobretudo, e diria predominantemete, de ordem moral, porque o Documento deseja favorecer, e pretende ver em acção, comportamentos que dizem respeito à ética pessoal, à família, à própria sobrevivência e ao direito à vida dos nascituros.

    Quando falamos de ética não queremos limitar o significado da moral católica ou religiosa que tem contudo o direito de ser respeitada numa democracia verdadeira mas falamos de ética natural, de ética tout court. Com a finalidade de uniformizar as leis nacionais, corre-se o risco de impor uma ética informada ao radicalismo político e ao nihilismo ético, defendidos pela maioria agora predominante. Mas julgava-se que o Estado ético já estivesse superado e o seu ressurgir deve preocupar os verdadeiros democratas de toda a Europa. Justamente, à pretensão de alguns Estados que mantêm nas próprias leis uma fidelidade aos valores ofendidos por esta Resolução, levantaram-se vozes de dúvida sobre a oportunidade de aderir definitivamente a uma Europa que ameaça impor a "sua" concepção moral da vida e das relações homem-mulher.

    Na realidade, e ninguém o pode ignorar, este texto não considera minimamente o direito à vida e exalta unilateralmente, aliás unicamente, o direito da mulher de abortar sem limites legislativos. Pelo que me recordo, nem sequer nas leis sobre o aborto aprovadas nos vários Estados, a posição de irrelevância do direito à vida do nascituro alcançou tal nihilismo.

    De facto, o direito da mulher de dar continuidade à gravidez, baseia-se unicamente na vontade da própria mulher. O texto da Resolução, no art. 12, "recomenda que para a finalidade de salvaguardar a saúde ou os direitos reprodutivos femininos, o aborto deva ser legal, seguro e acessível a todos". E o art. 13 acrescenta:  "convida os governos dos Estados membros e dos países candidatos a abster-se em qualquer caso de perseguir as mulheres que se submeteram a aborto ilegal".

    Por conseguinte, é pedida a despenalização total de qualquer ilegalidade em matéria de aborto:  isto significa que o aborto deve ser legal ou pelo menos despenalizado, seja qual for a idade gestativa na qual é efectuado, e seja qual for o motivo eugénico ou social pelo qual é realizado, clandestinamente ou não. E tudo isto com a exclusão total de qualquer direito do pai.
    Face a estas afirmações são irrelevantes  os  convites  dos  artigos  anteriores  que,  num  contexto  de  direito à vida  do  nascituro,  teriam  um  certo peso, como o art. 9, que recomenda:  "praticar uma política nos âmbitos da saúde e social que permita uma diminuição do recurso ao aborto", e alguns enunciados dos artigos 10 e 11 relativos à necessidade da informação e da consulta.
    Todas estas cautelas prévias não atenuam muito as drásticas afirmações dos artigos 12 e 13 que citámos. No que se refere à chamada "saúde reprodutiva e sexual" e à educação dos adolescentes, encontramo-nos igualmente perante algumas afirmações positivas acerca da necessidade de uma educação sexual, que deve ser proposta de maneira diferenciada (art. 16), de acordo com a idade e a diversa estrutura sexual das jovens e dos jovens, e acerca do carácter "holista e positivo, prestando atenção aos aspectos psico-sociais e biomédicos e baseando-se no respeito recíproco e no sentido comum de responsabilidade" (art. 17).

    Mas estas afirmações enquadram-se numa política directiva geral na qual os Governos se empenham em favorecer "uma informação global acerca das possibilidades efectivas e responsáveis de planificações familiares e garantindo igualdade de acesso a uma série de métodos contraceptivos de alta qualidade, e também a sistemas para promover a consciência da fertilidade" (art. 2). Não existe reserva alguma, nem médica nem moral, nem de idade, acerca do acesso a tais métodos, que são chamados de "alta qualidade". O art. 6 agrava o juízo sobre o fornecimento indiscriminado destes meios e métodos, o qual pede aos Governos que promovam a contracepção de emergência, fazendo com que estes remédios sejam vendidos sem prescrição médica e a preços acessíveis, a título de práxis standard no âmbito da assistência sanitária, sexual e reprodutiva". Sabemos que, se quisermos ser objectivos e sinceros, a chamada "contracepção de emergência" é por sua natureza abortiva, porque o seu mecanismo de acção requer que, entre outros efeitos, onde intervém a fecundação do óvulo, o embrião neo-concebido seja expulso devido à impossibilidade de se implantar na parede uterina.

    É paradoxal que esta pílula seja chamada "remédio", talvez pela necessidade que ela seja vendida nas farmácias.

    O art. 7 tem um tom provocatório, o qual invoca a igualdade homem-mulher em relação à necessidade de "promover a investigação científica no sector da concepção masculina", quando a participação do homem não é considerada quando se trata da decisão de abortar! É alarmante também o método de promoção da contracepção.

    A Directiva "convida os Governos a recorrer a vários métodos para atingir os jovens, por exemplo através da formação formal e informal, campanhas publicitárias, marketing social para o uso dos preservativos e projectos como linhas verdes telefónicas confidenciais..." (art. 18). É inevitável perguntar como se pode manter desta forma a gradualidade e o respeito das diversas sensibilidades, o carácter holista e positivo, etc., dos artigos 16 e 17!

    Compreende-se bem que alguns artigos foram redigidos para contentar certas organizações, e outros para destruir qualquer limite e apelo aos valores.

    Evitamos analizar as fórmulas "saúde reprodutiva" (que engloba o direito ao aborto) e direito "sexual e reprodutivo", que não fazem diferença de linguagem entre a procriação humana e a reprodução animal. Tudo isto na ausência de conceitos e palavras como o direito à vida do nascituro, a paternidade e a maternidade e o conceito de filho que é característico do indivíduo humano concebido.

    Sem dúvida, também não é necessário recordar quanto diz a Igreja na "Humanae vitae" a respeito da contracepção, que permanece uma ofensa à dignidade do matrimónio e dos cônjuges, nem nos detemos a recordar os numerosos documentos, entre os quais a Encíclica "Evangelium vitae", relativos ao aborto, que continua a ser um "crime" e nunca poderá ser promovido como "direito", e isto é válido não só para os crentes mas também para qualquer consciência iluminada pela recta razão. Parece que podemos concluir que este documento, no futuro, será citado como emblemático de uma tendência radicalista e amoral de determinados sectores de uma Europa que envelhece na sua estrutura demográfica e nos conteúdos de civilização.



    D. ELIO SGRECCIA
    Vice-Presidente da Pontifícia Academia para a Vida




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